Uma equipe de oceanógrafos de seis continentes fez um pedido urgente para a criação de sistema global de medição de oxigênio dos oceanos, buscando analisar melhor áreas onde quase nada mais sobrevive, as chamadas zonas mortas.
O aquecimento dos oceanos causado, principalmente, pela queima de combustíveis fósseis, está agravando a situação, dizem os especialistas. Haverá sérias consequências para comunidades litorâneas e para os ecossistemas de todo o mundo.
Cinquenta e sete cientistas de 45 instituições e 22 países deixaram clara a necessidade urgente de existir um sistema de monitoramento global para o oxigênio oceânico. Eles disseram que ajudará na proteção de ecossistemas vitais, como os recifes de corais e berçários de animais marinhos.
As zonas mortas, com pouco ou nenhum oxigênio dissolvido na água, podem permanecer dias, e até meses, em situação de hipóxia, que é mortal para peixes, plantas, crustáceos e outros seres vivos. Quando acontecem próximas à costa, a causa geralmente é o excesso de nutrientes nos estuários e o aquecimento acima da média da água.
Existem centenas de zonas mortas costeiras ao redor do mundo, mas cada vez mais aparecem evidências de hipóxia no oceano aberto. A professora Karin Limburg, da Universidade Estadual de Nova York (State University of New York), é uma das cientistas que solicitou o monitoramento global do oxigênio nos oceanos, que será conduzido pelas Nações Unidas.
“Há uma necessidade imediata de documentar e prever episódios de hipóxia e hotspots de baixa concentração de oxigênio, para tomarmos medidas que protejam importantes cardumes de peixes, berçários de animais marinhos e a aquacultura”, disse Limburg.
“Se não conseguirmos entender estes eventos, ficaremos no escuro quanto aos seus impactos ecológicos-econômicos.”
A professora Jodie Rummer, da Universidade James Cook (James Cook University), é a co-autora de um artigo, que apareceu domingo (21/11) no jornal Fronteiras da Ciência Marinha (Frontiers in Marine Science), argumentando a favor do sistema de monitoramento.
“Tudo na água necessita de oxigênio. A maior parte da vida nos oceanos não tolera a hipóxia”, afirma Rummer.
“Estes problemas estão ficando mais graves, porque nós não estamos resolvendo o excesso de nutrientes e o aquecimento contínuo das águas oceânicas. Ainda não conhecemos as implicações de longo prazo desta situação que afeta a aquacultura e a pesca, essenciais à alimentação humana.”
Rummer está coordenando um novo projeto, junto à Unesco, que estuda os efeitos de baixos níveis de oxigênio em tubarões. Há nova evidência, ela acrescentou, de que corais em zonas tropicais estão em risco devido à falta de oxigênio.
Já existe uma gama de equipamentos medindo o oxigênio dissolvido nos oceanos, incluindo submarinos autônomos, boias e sensores. Porém, é preciso mais e os dados não ficam disponíveis a todos, e não são padronizados, dizem os cientistas, o que torna análises globais e pesquisas complicadas neste momento, quando o problema está ficando urgente.
A professora Marilaure Grégoire da Belgium’s Liège University, e principal autora do artigo, disse: “No momento, a qualidade e a disponibilidade dos dados referentes aos níveis de oxigênio oceânicos não permitem estimativas do declínio no longo prazo.”
Uma das mais conhecidas zonas mortas é uma vasta área que se forma todo verão no Golfo do México, e alonga-se até o delta do rio Mississipi. A maior já formada, em 2017, tinha 23.000 km2.
Os nutrientes nas águas costeiras alimentam as bactérias, que consomem oxigênio e fazem os níveis da água baixarem. Águas quentes aceleram o metabolismo dos seres vivos, aumentando suas necessidades respiratórias. Por final, quando a temperatura da água aumenta, a quantidade de oxigênio dissolvido cai.
A Austrália passou por diversos eventos de hipóxia, ativados por excesso de nutrientes e poluição vindos de solos degradados, estradas e fazendas contíguas a estuários.
Os nutrientes extras levam a uma explosão de crescimento bacteriano nas águas, roubando o oxigênio disponível. Em alguns casos, água com oxigênio fica próxima à superfície, e impede que a água do fundo suba e se misture, criando zonas mortas em profundidades maiores.
Quase todos os seres vivos nos oceanos, lagos e rios necessitam do oxigênio, diz o professor Perran Cook, da Universidade Monash (Monash University), em Melbourne.
“O que controla o oxigênio é a temperatura,” afirma Cook, que não participou da autoria do artigo, mas concorda plenamente com a urgente necessidade de um sistema de monitoramento global.
Ele acrescenta: “Há uma preocupação bem fundamentada sobre o decréscimo do oxigênio nas águas oceânicas, e os efeitos negativos para a vida dos peixes e dos ecossistemas.”
“Da mesma maneira que estamos investindo no monitoramento do aquecimento global, é importante que documentamos que as águas também estão sofrendo uma brusca mudança graças às ações humanas.”
Um estudo descobriu que águas de estuários ao longo de 1.100km da costa de Nova Gales do Sul aqueceu mais de 2oC, entre 2007 e 2019. Áreas ao norte de Nova Gales do Sul e ao sudoeste de Victoria, na Austrália, presenciaram eventos de hipóxia, mas as causas nem sempre coincidiam.
O ecologista aquático, Dr. James Tweedley, da Universidade de Murdoch (Murdoch University), em Perth, estudou os efeitos dos baixos níveis de oxigênio nos estuários, incluindo um evento de hipóxia de três meses, em 2010, iniciado após uma tempestade em Swan Canning.
Ele disse que eventos de hipóxia em estuários podem ter efeitos graves, pois acontecem em berçários para animais como camarões e peixes, e suas larvas encontram dificuldade de escapar quando os níveis de oxigênio caem.
“Agora temos a tecnologia que consegue gravar e analisar o que está acontecendo nos oceanos”, pontua.
“Se tivermos um sistema global, ganharemos muito, porque será fundamental na modelagem da mudança climática e mudança global. Precisamos compreender o que está ocorrendo em uma escala global.”