Milhões de pessoas nas ruas, centenas de jovens nas praças, faixas, gritos, estudantes, donas de casa, trabalhadores, artistas, veganos. Um verdadeiro caldeirão de brasileiros indignados dando corpo a um processo de revolução no país.
A revogação das passagens na cidade de São Paulo, a derrubada da emenda constitucional 37 (PEC37) e uma futura reforma política através de plebiscito popular foram os frutos de toda esta movimentação. Este é o saldo até agora sobre as manifestações que tomaram todo o Brasil.
Pessoas foram às ruas manifestar-se contra a tarifa de transporte público, contra a corrupção, PEC 37, contra a cura gay, contra Marcos Feliciano, Investimentos abusivos da Copa, Educação, Saúde e uma série de outros motivos de indignação. As classes movimentadas e os grupos envolvidos foram muitos, mas afinal, o que o Movimento de Libertação Animal pode aprender com tudo isso?
Vamos estabelecer o livro de Singer em 1970 (Animal Liberation) como o início organizado pela libertação animal. Antes disso já existia muitas teorias, mas depois deste que a luta tomou corpo e o inicio organizado pela libertação animal foi formado. Portanto, nós do movimento contemporâneo de Direitos Animais já estamos batalhando neste sentido há quase 40 anos e as vitórias não são grandes, sejamos francos.
Avançamos sim, hoje o veganismo é muito mais difundido que na década de 70, 80 e 90 juntos. A não violência para não humanos é assunto mais presente, as pessoas já conhecem o significado da palavra veganismo e especismo, um grande passo. A culinária avançou, surgiram muitos e muitos métodos alternativos para a pesquisa científica, o mercado ganhou produtos novos, o nível de informação correndo sobre nossa luta aumentou significativamente. Hoje há mais sites, mais blogs, mais mídias, televisão, mais boca a boca rolando do que nunca. Sim, demos alguns passos, mas estamos falando de vitórias e não de avanços e, confessemos, os animais ainda continuam em sua situação de escravidão apesar dos passos para frente. Infelizmente.
Embora a porcentagem de vegetarianos e veganos tenha crescido no mundo, os animais ainda são mortos de forma indiscriminada todos os dias.
As manifestações atuais que se iniciaram contrárias ao aumento da passagem no transporte público de São Paulo e depois foi incorporada por dezenas de manifestantes contrários a alguns outros problemas nacionais e, de certa forma, retirou de seus organizadores iniciais (Movimento passa livre) as rédeas das manifestações podem nos ensinar e mostrar algo de produtivo. A MUDANÇA ESTÁ NAS RUAS! A MUDANÇA OCORREU PORQUE A MUDANÇA FOI PARA ÀS RUAS.
O que vimos e o que estamos vendo foi uma forte pressão popular que funcionou, hoje São Paulo volta a praticar o valor de R$3,00 reais nas passagens de ônibus/metrô e a abertura de um precedente histórico, nunca o/a presidente da nação procurou os movimentos sociais para negociações, foram sempre os movimentos sociais que procuravam o presidente, marchavam à Brasília atrás de suas reivindicações. Desta vez, a presidenta é que convidou os movimentos sociais para uma trégua.
Mas afinal, por que? Por que funcionou? Porque o movimento popular conseguiu a revogação das passagens e porque a reforma política poderá sair do papel?
O que devemos observar e observar bem é que a população obteve vitória porque foram as ruas, ou, como muitos cartazes presentes nas manifestações diziam: “Saímos do facebook!”.
A mudança aconteceu de forma direta, então houve AÇÃO DIRETA! Muitas vezes pacífica, muitas vezes com o uso da força (resistência popular perante aos ataques da polícia). O preço baixou porque houve confronto, foi inevitável, a vitória surgiu porque aconteceu uma mudança na zona de conforto do estado e também da sociedade. Quando a segurança foge do controle do estado a sociedade se amedronta, o comércio pressiona o estado e se o estado não consegue resolver, o movimento conseguiu atingir onde dói.
Nós estamos cansados de discutir esse assunto entre nós abolicionistas, a validade de manifestações diretas dentro do nosso movimento.
Quando particularmente defendo a necessidade de ações diretas dentro do movimento de libertação animal muitos teóricos deste mesmo movimento me chamam de radical. Quero lembrar que não estou falando nenhum um pouco das ações da Frente de Libertação Animal (ALF), estou falando de ações que são diretas! Estou falando de um movimento de pessoas que estão nas ruas e estão procurando atingir onde dói.
Estamos ouvindo muito a mídia marginalizar o que ela chama de “Vandalismo” nas atuais manifestações nacionais, é certo que existe aqueles que aproveitam a bagunça para saquear, mas são ultra minoria e de certa forma o Estado e sociedade capitalista (Que detêm o chicote da exploração animal não humana, pois é o capitalismo que vende o não humano como matéria prima) se amedronta realmente quando o bolso é tocado. A parcela burguesa se sente atacada com esta situação e o tal gigante da população se torna incontrolável. Foi o que aconteceu.
É uma estrutura, se você não agir na base, a base não vêm abaixo.
Eu como vegano sou a favor da não violência, se não quero o mau para o não humano também não quero o mau para o humano naturalmente. Não tenho intenção nenhuma de colocar o movimento de libertação animal nas ruas para quebrar vidraças de humanos que exploram animais na avenida Paulista, apesar desta violência nem se comparar à aquela praticada aos animais que estou tentando defender. Não estou falando de destruição de propriedade privada e de bens construidos com o especismo por estas pessoas, não, eu não tenho essa intenção, mas, se podemos aprender algo com as atuais manifestações é que se o cenário não tivesse caminhado para o confronto total, se o tal gigante da sociedade não tivesse “acordado” e se o estado não estivesse preocupado em perder o controle deste gigante, o mesmo não iria revogar a passagem e a poder privado não iria os apoiar (Essas duas classe decidem juntas, não se esqueçam).
A este ponto podemos fazer uma reflexão importante, um exercício das possibilidades. Pensamos juntos:
1 – Por que revogaram a passagem? Por que as manifestações funcionaram e por que voltaram a trás?
2 – Se a Av. Paulista (e as outras ruas do país) não tivesse sido palco de confrontos diretos das reivindicações, o preço das passagens iria baixar?
3 – Conseguiríamos estas mesmas vitórias de forma pacífica, apenas com congressos e encontros, sem ação direta?
4 – Se a situação não chegasse ao ponto de preocupar o poder público quanto a segurança nacional, esta possível reforma política através de um plebiscito iria acontecer?
É bonito ler Animal liberation, Jaulas Vazias e todos os textos traduzidos do Francione no Brasil, é sim, não só bonito como essencial, mas vai resolver o problema dos não humanos e somente desta forma (educação vegana) sendo muito otimista em no mínimo 500 anos.
Precisaria chegar caravelas abolicionistas novamente no nosso país no hoje e vivermos mais 500 anos de história para que a sociedade se educasse naturalmente através e apenas da educação e deixasse de explorar animais. É triste mas chegamos a este ponto. A sociedade se acomodou explorando animais e não vão mudar rapidamente sozinhos.
As ações diretas atuais pelos problemas do Brasil nos trazem a seguinte reflexão: “Eles foram as ruas e conseguiram, voltaram pra casa com o preço de R$3,00”.
E foram hoje, foram no agora.
Podemos continuar discutindo dentro do movimento de libertação animal a eficácia da Ação Direta versos a educação vegana, podemos continuar marginalizando os grupos brasileiros que as praticam e podemos continuar lendo a vasta teoria abolicionista. Que é maravilhosa. Mas um movimento bem perto da gente foi às ruas e venceu, enfrentou gás de pimenta, levou bomba de borracha na cara mas voltou pra casa como vencedores. Tirando a minoria que usava a situação para saquear e deturpar a proposta, o movimento se organizou de forma pacífica e popular, mas direta!
Acredito existir uma grande confusão no movimento abolicionista brasileiro sobre essas duas colocações.
AÇÃO DIRETA não significa violência. Agir diretamente não significa invadir laboratórios e nem montar praças de choque com a polícia. As pessoas confundem métodos de ação direta nas manifestações com as ações da Frente de Libertação Animal. Agir diretamente significa colocar a cara a bater e ir para o fronte, para o lugar onde as mudanças ocorrem, para o lugar onde dói.
Eu como vegano não deixo de pensar que poderíamos ser nós, que quando será que os animalistas farão o mesmo? Quando teremos um movimento organizado similar ao do MPL? Quando seremos uma massa desta magnitude e quando iremos às ruas desta forma para levantar faixas à favor dos animais não humanos e contra o especismo? Não deixo de pensar que toda essa movimentação poderia ser da nossa parte e poderia ser pelos animais. Em vez de voltar para casa com a revogação da tarifa poderíamos estar voltando com a proibição do uso de animais em experimentações científicas no território nacional e, até mesmo, por que não um dia, a proibição do comércio de carne animal no Brasil.
Enquanto isso os grupos que praticam ação direta (Pacífica mas direta) são taxados como os “Queima filme” do movimento animalista, eu mesmo já ouvi muitas vezes esses argumentos nos corredores e nas rodas de discussão pelos diversos congressos Brasil à fora que participo. Os “Veganos zens” sempre me intitulavam como o queimador de filme do seu movimento.
Não estou incitando um levante vegano e nem um futuro confronto contra o estado entre abolicionistas e força nacional de segurança, estou colocando que enquanto teorizamos de mais (e eu uso “de mais” porque reconheço a necessidade da teoria também!) a libertação destes animais mais de 500 milhões de outros morrem todo dia. Não há tempo! Não temos tempo para esperar o processo de educação ser executado naturalmente pelo tempo. Uma vida salva por dia é mais importante que 5 livros lidos no mês. Precisamos colocar a mão na massa.
Se eu pudesse criar uma analogia da frase inicial encontrada nas manifestações contra o transporte público “Saímos do facebook!” e tentasse trazer para o movimento de libertação animal, eu diria: “Saímos dos livros e viemos para rua!”
Se existe algo que podemos aprender com as atuais manifestações que tomaram o país é que A MUDANÇA ESTÁ NAS RUAS!
É necessário retirar os opressores de sua zona de conforto.
É preciso atingir onde dói.