Há três anos, eu namorei brevemente uma professora que por acaso também era ativista em defesa dos direitos animais nas suas horas livres. A experiência me fez tomar uma decisão com a qual tenho convivido desde então: o veganismo.
No ano passado concluí que, como cientista, precisava finalmente estudar o efeito que essa decisão tem sobre mim para decidir se deveria manter o veganismo para o resto da vida ou desistir dele.
Ao realizar uma “autoexperiência”, cujos resultados foram publicados recentemente na revista científica Physiology and Behaviour, descobri que o veganismo trouxe benefícios para a minha cintura, não reduziu o prazer que obtinha ao comer e – ao contrário de algumas pesquisas anteriores que sugeriam que uma dieta vegana pode aumentar o risco de depressão – não teve nenhum efeito na minha saúde mental.
Durante a maior parte da minha vida adulta, me envolvi com dietas “peixetarianas” (combinação de vegetarianismo com peixes e frutos do mar) e vegetarianas, mas nunca aderi a elas totalmente.
No início de 2020, eu conheci uma professora vegana em um aplicativo de namoro. Mas não uma professora vegana qualquer. Uma professora que era apaixonadamente vegana por razões éticas e pela crença de que qualquer outro estilo de vida inflige sofrimento desnecessário aos animais.
No terceiro ou quarto encontro que tivemos, eu já tinha pesquisado sobre o assunto, e o veganismo me convenceu. Os animais criados para produção de lacticínios e/ou para serem abatidos para obtenção de carne vivem vidas miseráveis.
E com suplementos vitamínicos decentes, não há necessidade biológica de se comer carne, lacticínios ou peixe. Então decidi que era hora de tentar o veganismo.
As coisas acabaram não dando certo com a professora primária e nunca houve um sexto encontro. Mas meu compromisso com o veganismo perdurou. Então, um ou dois meses depois, veio a pandemia. Durante os confinamentos, aperfeiçoei meu repertório culinário vegano e saí daquele período como um cozinheiro vegano mais experiente e habilidoso.
Mas sair da pandemia revelou algo sobre o veganismo: que, muitas vezes, ele não é algo divertido.
Embora o número de pessoas que se identificam como veganas tenha aumentado nos últimos anos e alguns restaurantes tenham mudado os seus menus para acomodar essa necessidade, muitos não o fizeram.
Às vezes, é preciso um planejamento meticuloso, visão de futuro e um olhar atento para os símbolos “vg” nos cardápios de restaurantes online.
Às vezes eu também me perguntava se estava me privando de um grande prazer — o prazer da comida, pois certamente as refeições mais limitadas que se pode fazer como vegano têm algum custo?
Veganos são impopulares?
Algo que também notei, e que acaba por ser confirmado pela investigação acadêmica, é que muitas pessoas não gostam muito de nós, veganos.
Estudos indicam que as pessoas descritas como veganas são percebidas de forma mais negativa, como sendo menos simpáticas. Os participantes nos estudos relatam ser menos abertos à amizade com veganos do que com não-veganos, em média.
Com base na minha experiência, você também pode adicionar “estar aberto para namorar” a essa lista. Em diversos aplicativos de namoro, eu deixei de dar “match” com várias pessoas quando me declarei vegano.
Porém, há um final feliz para minha busca pelo amor, pois finalmente conheci minha atual noiva. Mas o preconceito antivegano quase causou um problema. No nosso primeiro encontro eu mencionei o veganismo e naquele momento ela disse que provavelmente não teria me conhecido se soubesse disso antes.
De onde vem o preconceito? Uma explicação é a mídia. Um estudo de notícias do Reino Unido descobriu que 73% das referências aos veganos foram escritas de forma negativa.
Outra explicação, talvez mais complicada, é a culpa. Foi levantada a hipótese de que as pessoas muitas vezes têm fortes atitudes negativas em relação aos veganos para proteger ou disfarçar a sua culpa subjacente de que eles também deveriam fazer mais para reduzir o sofrimento dos animais ou ajudar o ambiente.
Embora isso pareça claramente freudiano, alguns estudos forneceram evidências que apoiam essa ideia.
Questionando o veganismo
E assim, enquanto eu lutava para compreender a minha nova impopularidade, depois de um ano e meio tentando o veganismo, comecei a titubear no meu comprometimento.
Mais ou menos na mesma época, me deparei com um artigo científico discutindo a possibilidade de o veganismo ser prejudicial à saúde mental. Seria verdade?
Isso me fez começar a ler o máximo de literatura científica que pude encontrar. E descobri que a ligação entre veganismo e saúde mental é mais complicada do que parece.
Por exemplo, alguns estudos descobriram que a depressão é mais comum entre veganos do que entre não-veganos. Mas isso pode acontecer porque as pessoas com depressão são mais propensas a experimentar o veganismo para melhorar a sua saúde mental.
Curiosamente, um pequeno número de estudos sugeriu que os veganos têm menos probabilidade de ter excesso de peso ou obesidade e, portanto, o veganismo pode ser benéfico para o peso corporal.
Mas, novamente, talvez seja apenas o caso de o tipo de pessoa que é magra ter maior probabilidade de se sentir atraída pelo veganismo.
No entanto, não consegui encontrar qualquer evidência científica sobre se os veganos obtêm menos prazer com a sua dieta do que os não-veganos que comem lacticínios, carne e peixe.
Então, no final de 2021, decidi que iria descobrir que efeito o veganismo provavelmente teria na minha saúde mental, no meu peso corporal e no prazer que obtinha ao comer. Eu não tinha financiamento científico para conduzir um grande ensaio clínico randomizado – mas tive tempo e disposição para conduzir um estudo sobre mim mesmo.
Autoexperimentação
O autoestudo ou “autoexperimentação” tem uma rica história na ciência que remonta a centenas de anos. Tomemos o escorbuto como exemplo. A primeira pista de que a deficiência de vitamina C era a causa do escorbuto veio dos marinheiros, o que levou à descoberta de que as frutas cítricas poderiam curá-lo.
No entanto, foi só quando John Crandon fez experiências consigo mesmo, em 1939, que foram fornecidas evidências convincentes de que a deficiência de vitamina C era a causa do escorbuto.
Crandon, da Harvard Medical School, retirou a vitamina C da sua dieta durante 19 semanas e, nesse momento, a sua saúde se deteriorou de forma preocupante.
Conforme planejado, ele recebeu uma grande dose de vitamina C e teve uma recuperação milagrosa. É uma evidência bastante convincente de que o escorbuto é de fato causado por uma deficiência de vitamina C.
Mas o padrão mais alto para experimentos científicos é o ensaio clínico randomizado. Se realizássemos um estudo assim sobre os efeitos do veganismo, os participantes seriam randomizados para um “tratamento” (adotar o veganismo) ou “controle” (não adotar o veganismo).
No entanto, na minha opinião, essa abordagem não funciona muito bem para o veganismo, uma vez que o veganismo é mais uma escolha de estilo de vida autodirigida, em oposição a um “tratamento” único que podemos dar às pessoas.
Escolher o veganismo é uma escolha muito pessoal, determinada por uma série de fatores, como saúde, preocupações ambientais e ética animal. Muitos veganos têm um forte sentido de identidade vegana, e o seu veganismo não aconteceu por acaso (como aconteceria num ensaio de controle aleatório).
Portanto, simplesmente exigir que as pessoas “se tornem veganas” dificilmente captará o que acontecerá quando elas adotarem o veganismo por vontade própria.
Estudos já colocaram pessoas em planos de dieta predominantemente veganos e descobriram que elas podem perder peso da mesma forma que fazem com planos de dieta não-veganos. Mas isso não resume o que é adotar naturalmente um estilo de vida vegano versus não-vegano, sem restrições ou objetivos específicos de mudar a saúde ou perder peso.
Além disso, embora a popularidade do veganismo tenha crescido, ainda se estima que apenas duas a três em cada cem pessoas no Reino Unido se identificam como veganas.
Por isso, seria difícil encontrar pessoas suficientes para participarem de um ensaio de controle randomizado desse tipo. Por outro lado, eu consegui encontrar uma pessoa que concordou com uma experiência sobre os efeitos do veganismo: eu mesmo.
Meu experimento
Em janeiro de 2022 comecei o ano, como muitos outros, participando do Veganuary. Diariamente registrei o que fiz naquele dia e, principalmente, o quanto gostei da comida que comi.
Toda semana minha noiva me pesava e media a circunferência da cintura. Para que eu não pudesse ser influenciado por nenhuma mudança acontecendo no meu peso corporal, eu fechava os olhos e era guiado para a balança (talvez ela tivesse razão em não querer namorar veganos).
Também respondi a questionários sobre sintomas de depressão e ansiedade todas as semanas.
Durante o mês de janeiro, levei minha vida vegana normal, mas fui particularmente rigoroso ao verificar se a comida e a bebida eram veganas.
Minha dieta se parecia com muitas outras dietas veganas — curry de grão de bico, refogado de tofu, macarrão de lentilha. Eu ainda estava comendo fora de casa e até passei um fim de semana em viagem.
A viagem foi ótima, com exceção de um café da manhã vegano de hotel bem-intencionado, mas muito estranho, com macarrão frito que tolerei enquanto observava os outros desfrutando de um café da manhã inglês completo e não-vegano. A vida seguiu adiante e estava agradável.
Em fevereiro deixei de ser vegano e repeti as mesmas medidas diárias e semanais. Durante o período não-vegano, fiz um esforço concentrado para comer refeições que não fossem veganas.
Troquei o leite de aveia pelo leite normal. Comia queijo, carne e peixe em vez da minha dieta habitual de tofu, feijão e leguminosas.
Uma pequena proporção das refeições que fiz ainda acabou sendo vegana por acaso (cerca de 15%), em comparação com 100% das minhas refeições sendo veganas no período de estudo vegano.
Meu paladar não mudou da noite para o dia — eu ainda gostava de comida indiana, chinesa e italiana. Mas a variedade de opções disponíveis cresceu como resultado da interrupção do veganismo naquele mês.
Assim como havia acontecido em janeiro, ainda comi fora e tive outra viagem de fim de semana, desta vez para a Espanha. Foi ótimo, com exceção de uma experiência culinária que não gostaria de repetir — callos a la madrileña. Este é um guisado popular em Madri que inclui chouriço e algumas tripas de aspecto e cheiro muito infelizes.
A primeira fase do experimento estava concluída. Durante os dois meses da primeira fase do estudo, eu medi rigorosamente quantas vezes bebi álcool, comi fora e fiz exercícios (caso por algum motivo eu tivesse tido um mês pouco saudável), mas felizmente essas coisas não diferiram muito entre os dois meses.
Após a primeira fase do experimento, tive um período no qual retornei ao meu estilo de vida vegano normal e relaxado, parando de anotar minhas medidas diárias e semanais. No entanto, continuei me pesando — e optei por fazer isso eu mesmo, para dar um descanso à minha noiva.
Então, em agosto, comecei a fase dois e inverti a ordem dos períodos veganos e não-veganos. A fase dois começou com dois meses de não-veganismo.
Eu não media nada diariamente, pois estava preocupado que isso pudesse me tornar mais consciente do meu comportamento e potencialmente me fazer agir de forma mais saudável do que seria de outra forma. A ideia de que registrar o próprio comportamento pode influenciar o comportamento subsequente está bem estabelecida na psicologia e é chamada de automonitoramento.
O automonitoramento é uma ferramenta usada para ajudar a gerenciar a saúde mental, perder peso e aumentar a adesão ao uso de medicamentos.
Durante esse período, minha noiva me pesou e me mediu todas as semanas. Eu registrei minha saúde mental como havia feito na primeira fase do experimento. Depois de dois meses de veganismo, voltei a mais dois meses de não-veganismo a partir de outubro. Dezembro chegou e eu finalmente terminei minha autoexperiência.
Os resultados
Como cientista com formação em psicologia, estou acostumado a analisar dados qualitativos e quantitativos.
Os dados qualitativos referem-se a experiências pessoais em um estudo. Ao planejar o estudo, pensei que poderia ter uma experiência forte ou um “momento definitivo” que me comprometesse com o veganismo para o resto da vida ou me fizesse abandoná-lo.
Isso não aconteceu. Mas notei algumas coisas.
Primeiro, como não-vegano, alguns amigos e familiares estavam mais interessados em sair comigo quando havia comida envolvida e expressaram desapontamento durante os períodos veganos do estudo.
Ao alternar entre períodos de estudo não-veganos e veganos, também percebi como o veganismo estava agindo como um alerta para a alimentação desnecessária.
Por exemplo, quando fiquei ligeiramente tentado por um lanche, uma guloseima de cafeteria ou uma sobremesa como não-vegano, eles estavam disponíveis em abundância e cedi à tentação de comer.
Mas, como vegano, essas tentações eram muitas vezes removidas devido à completa falta de opções veganas disponíveis ou a uma oferta escassa e desagradável.
Há muito que sabemos que as dietas veganas tendem a ter menos gordura saturada, mas eu não suspeitava que isso pudesse ser em parte devido ao veganismo impedir o consumo de alimentos em geral.
Os dados quantitativos foram realmente claros. Meu peso corporal respondeu consistentemente em resposta aos períodos de estudo vegano versus não-vegano — meu peso foi menor quando estava vegano e maior durante o não-veganismo.
Durante dois meses do estudo, após dois meses de não-veganismo, ganhei 1,6 kg. Ao mudar para o veganismo nos dois meses seguintes, perdi 1,2 kg. Olhei para o exercício e para o quanto me movia como potenciais explicações para essas diferenças, mas os dados sugeriram em grande parte que as diferenças de peso eram causadas pelo que eu comia.
As descobertas também revelaram que essas diferenças no peso corporal não aconteciam às custas do prazer que eu obtinha ao comer.
Meu prazer diário com a comida era quase idêntico durante os dias veganos e não-veganos. O mesmo aconteceu em relação à minha saúde mental. Meu registro semanal de sintomas de depressão e ansiedade foi quase idêntico durante os dois períodos de estudo.
O que tudo isso significa?
Os autoexperimentos vêm com muitas ressalvas. Os resultados são todos de um único participante e isso obviamente faz você se perguntar se os dados podem ser generalizados.
Às vezes sim, e às vezes não. Os resultados da autoexperiência de Crandon sobre vitamina C e escorbuto claramente podiam ser generalizados.
Meus resultados sugerem que o veganismo pode ter uma influência causal no meu peso corporal. Outra ressalva e limitação do meu estudo é que ele foi curto. Portanto, usei meus resultados para calcular o que aconteceria com meu peso corporal se o experimento durasse mais tempo.
Previ dois cenários para o que aconteceria durante um ano inteiro. Um cenário onde após o estudo permaneci vegano e um cenário onde desisti do veganismo.
O exercício de modelagem revelou que no cenário de abandono do veganismo eu pesaria 6,4kg a mais ao final de 12 meses do que se permanecesse no veganismo.
Essa é uma diferença muito grande. As minhas descobertas sugerem, portanto, que, além dos benefícios ambientais, o veganismo também pode ajudar as pessoas a manter um peso saudável.
No entanto, como sou uma pessoa bastante preocupada com a saúde e cozinho regularmente, pode ser que um vegano menos preocupado com a saúde, que sobrevive principalmente com hambúrgueres processados, batatas fritas e lanches, experimente menos benefícios veganos para o peso corporal do que eu.
Fiquei positivamente surpreso ao ver que meu prazer derivado da comida não diferiu entre os dias de estudo veganos e não-veganos.
As preocupações sobre o quanto uma pessoa gostaria de uma dieta vegana são uma barreira provável para dar uma chance ao veganismo e, com base nos dados do meu estudo, essas preocupações podem não parecer verdadeiras.
Tenho ponderado se o veganismo é capaz de afetar a saúde mental e se o meu estudo conseguiria detectar tal efeito, por ser tão curto. Mas meu palpite é que uma dieta vegana provavelmente não afeta a saúde mental.
Quando leio estudos que mostram que os veganos tendem a ser mais propensos a serem X ou Y em comparação com os não-veganos, eu agora sou muito cético.
X ou Y podem estar relacionados com qualquer coisa, seja isso saúde física ou mental. Veganos e não-veganos diferem em muitos aspectos e essas diferenças não são necessariamente causais.
Tome o sexo como exemplo. Os veganos são muito mais propensos a serem mulheres do que homens. Concluímos então que o veganismo aumenta a probabilidade de você ser mulher? Claro que não.
E o que eu decidi sobre o veganismo de longo prazo? Enquanto escrevo isso, nove meses após o término do experimento, ainda sou um vegano comprometido.
Para mim, os prováveis benefícios para a minha saúde, para o ambiente e para a redução do sofrimento animal superam os pequenos inconvenientes associados ao fato de ser vegano.
* Professor de Psicologia da Universidade de Liverpool, no Reino Unido.
Fonte: BBC