Redação ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais
O massacre contra os animais explorados para consumo em fazendas é, provavelmente, um dos piores crimes da história da humanidade. Todo o caminho do progresso humano está manchado com o sangue de animais mortos. Quando os primeiros seres humanos chegaram à Austrália, há cerca de 45.000 anos, levaram rapidamente à extinção 90% dos animais, provando que o Homo Sapiens ainda seria responsável por muitos desastres ecológicos.
É surpreendente pensar que a humanidade extinguiu 50% de todos os mamíferos terrestres antes mesmo de plantar o primeiro campo de trigo, forjar o primeiro metal ou escrever o primeiro texto. O passo seguinte que marcou a relação abusiva entre animais humanos e não-humanos foi a “revolução da agricultura”: o processo que transformou coletores e caçadores nômades em fazendeiros fixados em uma propriedade. Foi quando os humanos passaram a domesticar animais, começando com cerca de vinte espécies de aves e mamíferos até o cenário de hoje, em que 90% dos animais grandes já foram domesticados (entendendo por “grandes” os animais com no mínimo alguns quilos).
As galinhas, por exemplo, eram uma espécie rara de ave do sul da Ásia há dez mil anos. Hoje, bilhões de galinhas estão espalhadas por todo o planeta, tornando-se o animal doméstico mais numeroso do mundo. O mesmo aconteceu com vacas e porcos, às custas de novas formas cruéis de sofrimento que só a escala industrial poderia causar aos animais.
O que torna a existência dos animais domesticados particularmente cruel não é apenas o destino no matadouro, mas a forma precária com que passam suas vidas. Dois fatores foram decisivos para moldar a indústria agropecuária: de um lado, humanos querem carne, leite, ovos, couro; do outro, precisam garantir a sobrevivência a longo prazo e a reprodução dos animais explorados. Teoricamente, essa necessidade deveria poupar os animais do sofrimento extremo. Se um fazendeiro quer ordenhar uma vaca e não oferece condições dignas de vida ao animal, ele perde em produção. Mas, infelizmente, seres humanos conseguem praticar atos de crueldade de outras maneiras, ainda que precisem “cuidar” dos animais. A raiz do problema é que os animais de fazenda herdaram as demandas físicas, emocionais e sociais de seus antepassados, que são completamente ignoradas pela indústria. Eles confinam animais em gaiolas minúsculas, mutilam seus chifres e caudas, separam mães de seus filhotes e criam monstruosidades pelo melhoramento genético. O sofrimento é imensurável, ainda que os animais vivam muito e em grande número.
A lição básica da psicologia evolucionista é de que os animais possuem interesses e necessidades próprias que os afetam subjetivamente, ainda que não precisem lutar para sobreviver e reproduzir em um ambiente artificial. Tragicamente, a agropecuária deu aos humanos o poder de assegurar a sobrevivência dos animais e ignorar todas as suas necessidades. Como consequência, animais domesticados são os mais “bem-sucedidos” em termos de números e expectativa de vida no mundo, mas também os mais miseráveis que já existiram.
A situação só piorou nos últimos séculos, quando a agricultura tradicional deu lugar à agropecuária industrial. Em vilas medievais, galinhas corriam soltas e tinham uma vida relativamente livre, com a tecnologia tornou-se possível amontoar 1.000 galinhas em jaulas e mantê-las vivas a base de antibióticos enquanto são exploradas até suas últimas forças. Vacinas,medicações, hormônios, pesticidas, ar-condicionado e sistemas automáticos de alimentação permitiram o abuso máximo dos animais, produzindo carne, leite e ovos em uma escala jamais vista.
O destino dos animais na indústria do consumo se tornou uma das questões éticas mais urgentes do nosso tempo. Nos dias de hoje, a maioria dos animais de grande porte vivem em fazendas industriais. Imaginamos que nosso planeta é habitado por leões, elefantes, baleias e pinguins, mas isso só é verdade no National Geographic, nos filmes da Disney e em contos de fadas. No mundo real, temos 40 mil leões em contraste com 1 bilhão de porcos domesticados; 500 mil elefantes contra 1,5 bilhões de vacas; 50 milhões de pinguins contra 20 bilhões de galinhas.
Em 2009, havia 1,6 bilhões de pássaros selvagens na Europa, contando todas as espécies. No mesmo ano, a indústria da carne e dos ovos criou 1,9 bilhões de galinhas. Juntos, todos os animais domésticos do mundo somam 700 milhões de toneladas, comparado à 300 milhões de toneladas de humanos e menos de 100 milhões de toneladas de animais selvagens.
É por isso que a situação dos animais de fazenda é um assunto prioritário. Estamos falando da maioria das criaturas da Terra: dezenas de bilhões de seres sencientes, cada um com um mundo complexo de sensações e emoções, mas que nascem e são mortos em uma linha de produção gigantesca. Há 40 anos, o filósofo Peter Singer publicou sua famosa obra “Libertação Animal”, que contribuiu muito para abrir a mente das pessoas. Singer afirmou que a agropecuária industrial é responsável por mais dor e sofrimento do que todas as guerras juntas.
O estudo científico dos animais teve um papel de destaque nessa grande tragédia. A comunidade científica tem usado seu conhecimento sobre os animais para manipular suas vidas de forma mais eficiente em função dos interesses da indústria, ainda que o mesmo conhecimento tenha provado que animais são seres sencientes, com dinâmicas sociais próprias e nuances psicológicas sofisticadas. Eles podem não ser inteligentes como nós, mas certamente conhecem a dor, o medo e a solidão.
Já passou da hora de utilizarmos as descobertas científicas da forma certa, porque conforme cresce o poder humano, maior se torna nossa habilidade de beneficiar ou prejudicar os animais não-humanos. Por 4 bilhões de anos, a Terra foi governada pela seleção natural, agora é cada vez mais um produto da inteligência humana. Biotecnologia, nanotecnologia e inteligência artificial permitirão em breve que os humanos reconfigurem radicalmente todas as formas de vida, o que poderá redefinir o sentido do próprio ser. Quando pensamos em construir esse novo mundo, precisamos considerar os direitos de todos os seres sencientes, não apenas dos animais humanos.