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RESGATE AMBIENTAL

O desafio de restaurar florestas queimadas na Amazônia

Soluções emergenciais envolvem capacitações, medidas de prevenção, fortalecimento de brigadas de incêndio e o monitoramento das ações ilegais, além da proteção das comunidades tradicionais e de alerta sobre os impactos na saúde da população

6 de novembro de 2022
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Focos de incêndio ao longo da vicinal Paraná, via de acesso à Terra Indígena Bau, do povo Kayapó Novo Progresso, no começo de setembro          Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real

As florestas da Amazônia na atualidade encontram condições perfeitas para a ocorrência de incêndios: a extração ilegal de madeira, o avanço do desmatamento e as mudanças climáticas ajudam a tornar a ocorrência de queimadas mais frequentes.

Uma vez derrubada a floresta, o material combustível disposto em solo, como folhas e galhos, pode ser facilmente desidratado e incendiado.

A propagação do fogo ocorre a partir da borda da floresta e, dependendo da gravidade e recorrência, o fogo pode causar a destruição de metade das árvores de grande porte e a maioria das árvores pequenas.

Degradação pelas chamas

O fogo como um fator de degradação da floresta amazônica tem implicações importantes, a depender das escalas crescentes de queimadas no bioma. Por exemplo, a degradação florestal provocada por queimadas e extração de madeira aumentou 359% na região em 2022, e somente em setembro, 96% da área degradada ocorreu no Mato Grosso (74%) e no Pará (22%). Como a floresta amazônica não é adaptada a incêndios, uma floresta queimada pode até continuar de pé, mas perde a sua capacidade de prover serviços ecossistêmicos e estará mais suscetível a novos incêndios. A médio prazo, a Amazônia perde sua capacidade de bioma resiliente.

Vários contextos associados à expansão do fogo envolvem populações tradicionais e as florestas, como o caso das Reservas Extrativistas (RESEX) que já são atingidas por megaincêndios. Na região do Rio Tapajós, 2,5 bilhões de árvores e cipós morreram em seca e incêndios de 2015, dando origem a milhares de hectares de florestas degradadas. Neste mesmo período, na Reserva Tapajós Arapiuns, o fogo destruiu cerca de 1.600 há e causou danos ao patrimônio, à subsistência e ao modo de vida das populações tradicionais e indígenas beneficiárias deste território.

Soluções emergenciais envolvem capacitações, medidas de prevenção, fortalecimento de brigadas de incêndio e o monitoramento das ações ilegais, além da proteção das comunidades tradicionais e de alerta sobre os impactos na saúde da população. Mas essa situação traz outra preocupação: é possível restaurar as florestas que foram queimadas?

Compreender a dinâmica do ecossistema pós-incêndio ajuda a prever a capacidade de regeneração de uma área queimada e elaborar estratégias de restauração. É neste contexto que iniciativas de pesquisa estão sendo desenvolvidas na RESEX Tapajós Arapiuns, pelo Museu Paraense Emílio Goeldi e Instituto Iniciativa Amazônica (INIAMA) e apoiadas pelo ICMBio, CNPq e ICS, com estudos sobre a regeneração natural pós fogo, os efeitos socioambientais dos incêndios florestais e de modelos de restauração, integrando a ciência da ecologia da restauração com o conhecimento tradicional.

Para serem eficazes, as iniciativas que envolvem comunidades, devem envolvê-las desde o início promovendo a sua liderança, assim como os seus conhecimentos e prioridades. Neste sentido, usamos a abordagem de restauração biocultural, baseada na compreensão do processo de regeneração natural e do contexto socioecológico da RESEX.

A partir da discussão de um Plano de Recuperação, houve um pacto de ação coletiva e a concepção de um modelo de restauração fundamentado no manejo da regeneração natural + enriquecimento florestal, com estabelecimento de Unidades Experimentais Demonstrativas (UEDs) de restauração florestal de 25 hectares, em duas aldeias da etnia Tupinambá (Muratuba e Jauarituba). As ações envolveram a formação e a capacitação de grupos de restauradores, a implantação das UEDs, o manejo da regeneração natural e o plantio de mudas de espécies de valor sociocultural e econômico, os tratos culturais e o monitoramento.

O grande desafio desse modelo de restauração é controlar espécies indesejáveis altamente inflamáveis, manter regenerantes e adultos de espécies nativas dominantes nas florestas e enriquecer com espécies de interesse das comunidades, que garantam a diversidade taxonômica e funcional das florestas. Os resultados são promissores, considerando o potencial de regeneração natural, baixa mortalidade e crescimento satisfatório das plantas introduzidas. Vislumbra-se a restauração dos serviços socioambientais prestados pelas florestas, com geração de renda e desenvolvimento local.

Para dar escala à restauração, as condições ecológicas, de mercado, políticas, sociais e institucionais, que criam um contexto de restauração favorável, devem estar disponíveis e o papel do ICMBio é primordial para isso. Recentemente, este órgão estabeleceu, as bases para fomentar programas de coletas de sementes em UCs visando a restauração de paisagens e ecossistemas ou de recuperação populacional de espécies ameaçadas, por meio da Instrução Normativa Nº 6/GABIN/ICMBIO, de 3 de maio de 2022, a qual define, ainda, as comunidades tradicionais e suas instituições representativas como proponentes prioritários para iniciativas e projetos voltados à comercialização de sementes e mudas. Além desta regulamentação, estratégias que preveêm o monitoramento participativo da biodiversidade (Programa MONITORA), aliado a continuada capacitação em boas práticas para o manejo integrado do fogo, a longo prazo permitem prevenir a ocorrência de desastres ambientais e avaliar as condições de estabilidade de importantes indicadores biológicos, como o status de conservação de mamíferos e aves por exemplo.

Temos a convicção que o desenvolvimento de um processo de construção coletiva e de troca de conhecimentos e saberes como o que está sendo conduzido na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, através da integração e inclusão social, tem o potencial de transformar florestas degradadas pelo fogo em florestas sociais de uso múltiplo, empoderar as organizações comunitárias e ampliar o seu protagonismo em projetos socioambientais na Amazônia.

Fonte: Oeco

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