Estudantes lendo sob a sombra de uma árvore enquanto são observados por emas, tartarugas e guaxinins. Ou, ainda, professores preparando aulas ao som do canto de pássaros raros. Tudo em pleno campus universitário. As cenas podem parecer estranhas ao olhar de um visitante, mas alunos e funcionários da Universidade de Fortaleza (Unifor) já estão habituados.
É que a instituição foi registrada, em 2008, como uma das Áreas de Soltura de Animais Silvestres (Asas) credenciadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), no Ceará. São, ao todo, 72 hectares de área (que contam até com uma lagoa), onde o Ibama costuma soltar animais, em sua maioria, apreendidos em feiras e criadouros clandestinos.
De acordo com Júlio César de Freitas, gestor da Divisão de Serviços Gerais da Unifor, o local conta, atualmente, com 123 animais. Os que mais chamam atenção são as três emas, que circulam livremente pelo Campus. Todas as espécies são cadastradas, e a contagem é feita periodicamente. “Os animais estão perfeitamente adaptados aqui. Alguns até já se reproduziram”, revelou Júlio César, que conhece a rotina de cada bicho.
O oposto também acontece, ou seja, a Unifor fornece animais para que o Ibama realize a soltura em outras áreas. Ele contou que um casal de carcarás que mora no Campus teve filhotes, que, ainda pequenos, foram levados por funcionários do órgão. “Foi mais por uma questão de segurança, já que, aqui, há uma grande circulação de pessoas”, explicou Júlio César. “A população destes animais precisa ser controlada num ambiente como este”.
Os alunos também já estão habituados com a presença dos animais. Muitas vezes, nem percebem a companhia inusitada. A estudante do curso de Engenharia Elétrica Tatiane Chagas disse apoiar a iniciativa e nunca ter tido qualquer problema com os animais. “Pelo contrário, acho até bom. Distrai a gente, ajuda a relaxar. É também uma forma de termos algum contato com a natureza, já que o cotidiano corrido nos distancia destas coisas”, declarou.
Tatiane destacou também a importância do gesto para a preservação do meio ambiente. “Espaço aqui não falta. Se é possível conciliar e conviver, não vejo motivo para não fazer. Melhor do que manter os animais em cativeiro”.
O desafio, contou Júlio César, é combater a captura desses animais dentro da Asas. Já foram encontradas gaiolas instaladas por pessoas que moram na vizinhança. Nas inspeções, elas são retiradas e destruídas.
Alimentação
Os animais são estimulados a buscar seu próprio alimento. Por isso, diversas árvores frutíferas foram plantadas por todo o Campus. A safra de cada uma varia de acordo com a época, o que garante comida o ano inteiro. As emas contribuem ainda para o controle de uma possível infestação por roedores. “A presença dos animais é essencial neste sentido”, disse o gestor da Divisão de Serviços Gerais da Universidade de Fortaleza.
A Unifor também possui um projeto de cultivo de plantas ornamentais, árvores nativas e flores, como orquídeas. Elas são utilizadas no paisagismo da própria universidade e também cedidas aos alunos. Entre as mudas que saem do canteiro, estão baobás, cajueiros, mangueiras, goiabeiras e pitangueiras.
Conforme Júlio César, uma catalogação de todas as espécies que compõem a flora do Campus já está em curso. Trata-se de um projeto piloto, iniciado no ano passado, que já foi executado no entorno do prédio que abriga a reitoria e encontrou, ali, 35 tipos de árvores.
Liberdade
“Os animais já estão adaptados. Alguns chegam até a se reproduzir dentro dos limites do campus”
Júlio César Magalhães
Gestor da Div. de Serv. Gerais da Unifor
Ibama
O Estado conta com 10 áreas de soltura
Passaram pelo Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) do Ibama, no Ceará, em 2009, 4.562 animais (a maioria era aves), dos quais 3.064 estavam em condições e foram libertados em regiões de soltura credenciadas. No total, o Estado conta com 10 áreas desse tipo, na Capital e Interior.
A quantidade, de acordo com a analista ambiental do Cetas do Ibama, Carla Sombra, é suficiente para a demanda atual, mas reconhece que “quanto mais áreas forem registradas, melhor”. Ela explica que, com mais Áreas de Soltura de Animais Silvestres (Asas), fica menos difícil escolher a que tem bioma com características mais adequadas ao tipo de animal que se pretende devolver ao meio ambiente.
A soltura é prevista pela Lei 9.605/98 e ratificada pelo Decreto 3.179/99. No entanto, o ato deve ser vinculado a programas específicos de manejo das espécies previstos na instrução normativa 179/2008.
Desde a aprovação da lei, o órgão vem estimulando a disponibilização de áreas privadas para a transformação em Asas. Depois que um interessado procura a sede do Ibama, técnicos realizam uma inspeção. É quando são avaliadas as condições do terreno, sua diversidade e proximidade com centros urbanos. “Evitamos criar uma área de soltura perto de onde haja moradias”, destacou.
O objetivo é coibir a ação de caçadores. Por isso, afirmou Carla, o Ibama investe em campanhas de conscientização, principalmente entre as crianças, nas proximidades das áreas de soltura. Outra medida preventiva é não divulgar a localização de algumas dessas Asas.
A maior parte dos animais que passa pelo Ibama é fruto de apreensões, mas há também os que chegam por meio de resgates ou doações espontâneas. Nesses casos, o tutor não está sujeito a nenhuma pena por crime ambiental.
Para mais informações
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (85) 3272.1600 ramal 272
Fonte: Diário do Nordeste