Zonas de refúgio e de reprodução de uma imensidade de espécies de peixes, crustáceos, bivalves, poliquetas (vermes) e equinodermes (estrelas, ouriços do mar), cobertas por uma rica e nutritiva vegetação marinha, estão espalhadas por toda a costa portuguesa, em especial no sul do país.
Mas junto da serra da Arrábida, quando o estuário do Sado acaba e começa o mar aberto, a pesca intensiva com o uso de grandes redes, a utilização de artes destrutivas dos fundos marinhos como o arrasto com ganchorras (gaiolas com pentes para apanhar bivalves) e a ancoragem desordenada de barcos arrancaram os prados marinhos, alteraram a natureza dos sedimentos e expulsaram a fauna que aí prosperava, destruindo comunidades que cresciam nas rochas e recifes ao largo do Portinho da Arrábida e de outras praias da região. Uma região que se quer candidatar a Património Mundial da UNESCO.
Nesta faixa costeira de 38 km de extensão que constitui o Parque Marinho Professor Luiz Saldanha – entre a Praia da Figueirinha, na saída do estuário do Sado, e a Praia da Foz, a norte do cabo Espichel – se desenvolve há dois anos e meio um projeto pioneiro em Portugal: a plantação de prados marinhos para atrair de novo as espécies castigadas pelo excessivo esforço de pesca, numa zona considerada pelos biólogos como um hot spot de biodiversidade. O projeto chama-se Biomares e já permitiu a plantação de 50 novos prados, onde espécies em declínio, ameaçadas ou em perigo estão regressando, como o cação-liso, o cação-perna-de-moça, a raia-branca, o tamboril ou o pregado.
No último relatório do Centro de Ciências do Mar (Universidade do Algarve), que coordena o Biomares, constata-se que a monitorização feita pelo projeto no Parque Luiz Saldanha veio acrescentar 220 novas espécies “à já longa lista de registos dentro do parque marinho”, e eleva para 1.320 o número de espécies registadas no local.
Alexandra Cunha, coordenadora do Biomares e pesquisadora da Universidade do Algarve, explicou durante o intervalo da Conferência Internacional sobre Conservação Costeira, realizada no Estoril, que as conclusões deste relatório “mostram que existe uma tendência positiva, mas precisamos de dados mais consolidados, porque as pradarias marinhas demoram muito tempo para crescer – 10 anos em média -, o que significa que os quatro anos do Biomares (2007-2010) são insuficientes para sabermos com rigor qual o impacto do projeto na recuperação da biodiversidade marinha da Arrábida”.
Aliás, “estudos feitos em áreas marinhas protegidas em todo o mundo indicam que só ao final de 10 anos é que os ecossistemas se equilibram depois de serem afetados pelo excesso de atividade pesqueira”. Por isso mesmo os responsáveis pelo Biomares – que envolve 70 pessoas, 30 das quais cientistas, e foi financiado pelo Programa LIFE da Comissão Europeia – estão negociando com os parceiros a continuação do projeto para depois de 2010. Os parceiros são, além do Centro de Ciências do Mar (CCMAR), a cimenteira Secil (co-financiadora do projeto), o Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB), o Instituto Nacional de Recursos Biológicos/Ipimar, o Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), o Conselho Superior de Investigações Científicas (Universidade das Ilhas Baleares, Espanha) e a conhecida agência federal norte-americana National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA).
“Estamos preparando uma nova candidatura ao programa europeu LIFE”, revela Alexandra Cunha, “e em 2010 vamos reforçar as 50 pradarias já plantadas, que se encontram em zonas mais abrigadas, e criar 10 novas pradarias em zonas menos abrigadas”. O objetivo continua a ser a recuperação da biodiversidade, um conceito que pode ser definido como a variedade e a variabilidade existentes entre os organismos vivos e os processos ecológicos nos quais estas ocorrem. E além de zonas de refúgio e de reprodução dos peixes, as pradarias promovem a qualidade da água do mar, porque funcionam como filtros biológicos naturais.
Entretanto, um dos objetivos principais do Biomares é reconciliar as atividades turísticas e econômicas com a conservação da Natureza. Por isso já foram espalhadas pela superfície do mar, no Parque Luiz Saldanha, cerca de 100 ‘Bóias Amigas do Ambiente’. As âncoras dos barcos de recreio e os cabos que as seguram varriam o fundo do mar e destruíam habitats, mas com estas bóias presas ao fundo por cabos totalmente esticados, os barcos amarram-se a elas quando precisam estacionar, dispensando as âncoras. É um sistema usado em todo o mundo, em especial nas zonas de corais.
Fonte: Expresso