A expressão “eco-ansiedade” foi apresentada ao mundo em 2017 pela American Psychology Association (APA — a associação de psicologia do EUA), descrita como: “medo crônico de sofrer um cataclismo ambiental que ocorre ao observar o impacto, aparentemente irrevogável das mudanças climáticas, gerando uma preocupação associada ao futuro de si mesmo e das próximas gerações”.
Apenas em outubro de 2021 que ela entrou oficialmente para o dicionário de Oxford como um “desconforto ou preocupação sobre o dano atual e futuro causado no meio ambiente pela atividade humana e a mudança climática”. Desde então, o termo tem aparecido com mais e mais com frequência, principalmente entre jovens.
Mas você sabe como identificar essa sensação tão nova? Ecoa conversou com especialistas e jovens que já sentiram na pele os efeitos da ansiedade climática.
O que é eco-ansiedade?
Para Maria Luiza Gastal, Psicanalista da Sociedade de Psicanálise de Brasília e membro do Comitê de Clima da International Psychoanalytical Society (Sociedade Internacional Psicanalítica), a ansiedade climática é uma expressão clínica do medo crescente dos desastres e cataclismas ambientais.
“A eco-ansiedade é um medo que surge a partir da nossa observação sobre os impactos das mudanças do clima. Vemos que os pacientes temem cada vez mais sobre o futuro, pelas gerações que virão e de como será o mundo. É uma ansiedade que se traduz, sobretudo, em perguntas sobre o que elas próprias podem fazer para evitar e prevenir tais desastres”, explica a profissional.
Já existe algum tratamento específico para lidar com essa sensação?
A psicanalista esclarece que por não se tratar de uma patologia específica, ainda não existe um tratamento personalizado, mas como todo sofrimento ela é sempre acolhida pela psicanálise.
“Primeiro fazemos a escuta analítica, e claro, a psicanálise mobiliza toda a sua estrutura conceitual para ajudar o sujeito a investigar essa sensação e a lidar com ela. Como todas as ansiedades, elas estimulam também os mecanismos primitivos de defesa, como por exemplo a denegação, que reconhece o problema, mas finge que não existe. Buscamos entender esses mecanismos inconscientes que se entrelaçam e amarram o mundo externo ao interno do sujeito”, finaliza.
Quem mais sofre com a eco-ansiedade?
De acordo com a Lancet Planetary Health, em uma pesquisa encomendada com aproximadamente 10.000 jovens de diferentes países, entre 16 e 25 anos, cerca de 75% deles disseram que enxergam o futuro como assustador. Além disso, o estudo mostrou que a maior concentração dos casos mais graves de ansiedade estão em ambientes onde há maior índice de eventos extremos relacionados aos problemas socioambientais.
Para o ambientalista e ativista climático do Fridays For Future Brasil, Dalcio Costa Rocha, 18, esse medo começou a partir de uma campanha contra um leilão da Agência Nacional do Petróleo e Gás.
“Sentia que todas as ações eram ineficazes e comecei a ter uma sensação muito intensa de que precisava fazer algo, mas não conseguia. Neste dia, uma lágrima escorreu e eu soube que estava com eco-ansiedade, a partir disso busquei ajuda para me tratar com um dos psicanalistas que acompanha o grupo onde faço parte”, relata.
Um outro exemplo aconteceu com Luiza Barenco Costa, 18, estudante universitária, que sentiu as sensações de uma crise de eco-ansiedade. Ela contou que não conseguia relaxar, que estava sempre pensando no assunto ao ponto de isso começar a atrapalhar a sua vida e o seu dia a dia.
“Tive a minha primeira crise durante uma conversa informal entre amigos. Estávamos conversando sobre as realidades de cada um e percebi que todos os meus companheiros de ativismo estavam passando por alguma consequência da crise climática e que não teria como ajudar a todos com campanhas ou algo assim”, ilustra a jovem.
O sentimento é parecido para Dalcio, que o descreve como agonizante e, de alguma forma, motivador para tentar mudar o planeta. “Não consigo ficar um momento sequer sem pensar em realizar ou fazer alguma coisa sobre [problemas ambientais], a sensação é de uma angústia enorme no peito, algo que não cabe no corpo, que obriga você a fazer a mudança para um mundo melhor”.
A pandemia pode ter acelerado essas crises de ansiedade?
Não há dúvidas de que a pandemia nos fez enxergar que vivemos diante de um limite, mas ela também nos colocou frente a frente com a nossa fragilidade perante a uma catástrofe ambiental, comenta Maria Luiza.
“O que parecia um problema distante, que se relacionava apenas aos povos da floresta, caboclos e indígenas, atingiu em cheio o nosso mundo tecnológico-urbano, que se supunha imune aos perigos das mudanças climáticas. A nossa arrogância foi seriamente atingida pela pandemia e ela nos obrigou a reconhecer a nossa fragilidade”, diz.
Mudanças climáticas são graves o suficiente?
Um dos maiores veículos de notícias do mundo, o “The Guardian”, escolheu usar editorialmente o termo “emergência climática”, ao se referir sobre as “mudanças climáticas”. De acordo com o jornal britânico, o uso da palavra ‘emergência’ reforça que já estamos vivendo crises oriundas dos eventos extremos.
Recentemente o filme “Não Olhe Para Cima”, disponível na Netflix, colocou em pauta esse questionamento. Estaríamos negando que algo está errado em nosso planeta? O longa não trata exatamente sobre o aquecimento global, mas o tema pode ser observado nas entrelinhas da história.
A emergência climática não está somente na ficção, ela é real e está cada dia mais evidente, impactando a vida das populações, sobretudo as que estão em situação de vulnerabilidade, que são as principais afetadas pelos efeitos do clima se não contermos o aquecimento do planeta a 1,5°C.
Fonte: Ecoa | UOL