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'Ninguém está a salvo': o que meteorologistas gostariam que você soubesse

11 de setembro de 2024
Luiza Vidal
5 min. de leitura
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Foto: Richard Bouhet/AFP

Se antes o aquecimento global parecia uma preocupação distante, hoje, o fenômeno já é uma realidade. Basta pensar nas nove ondas de calor registradas no Brasil em 2023, além das temperaturas elevadas neste inverno. O problema é mundial.

Para quem estuda o assunto e acompanha os fenômenos dia a dia, não há dúvidas de que as mudanças (ou emergências) climáticas devem causar eventos cada vez mais intensos e frequentes no país e no mundo.

O UOL falou com três meteorologistas sobre o assunto e, abaixo, eles contam o que gostariam que as pessoas soubessem —além da previsão do tempo.

Aquecimento global é realidade

“Antigamente, a gente pensava: ‘Nossa, meus filhos ou netos vão lidar com as mudanças climáticas'”, diz a meteorologista do Climatempo Marcely Sondermann, do Rio de Janeiro. “Mas a gente já está vivendo isso. O aquecimento global acelerou mais rapidamente do que a gente previa.”

A especialista explica que o principal motivo dessa aceleração são as ações humanas, como o aumento das queimadas e da queima de combustíveis fósseis, que emitem os gases do efeito estufa —o CO2, por exemplo.

Sondermann diz que a emissão do gás está “muito maior do que tínhamos anteriormente” e, além disso, ocorre de forma mais rápida.

“Esses gases do efeito estufa retêm o calor, levando ao aumento das temperaturas médias globais e a uma série de impactos climáticos adversos”, diz a especialista.

Eventos mais frequentes e mais intensos

No efeito dominó, o impacto é grande: recordes globais de temperatura e eventos extremos cada vez mais comuns, segundo os especialistas.

A tendência é presenciar secas e tempestades mais severas, além de mais ondas de calor —e o frio também pode ficar mais intenso em outras regiões do Brasil, como o Sul. O que antes era algo isolado passa a ser mais comum.

Só no ano passado, o Brasil teve nove ondas de calor. O país somou 65 dias de muito calor em 2023, o equivalente a quase um quinto do ano (18%), de acordo com dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia). Isso se deu, principalmente, devido ao fenômeno El Niño, que causa impacto na temperatura global.

“Há mudanças doidas e intensas que estão mais frequentes, ano após ano. E isso ocorre por causa do aquecimento global e as mudanças climáticas.” – Marcely Sondermann, meteorologista

Eventos estão ‘absolutamente extremos’

A quantidade de chuva está diminuindo ao longo dos anos, em todo o Brasil, de acordo com o meteorologista e coordenador de operação do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), Marcelo Seluchi.

“A chuva não está bem distribuída, ou seja, temos períodos mais curtos das estações chuvosas, com secas mais prolongadas, mas com episódios extremos mais frequentes do que antes.” – Marcelo Seluchi, meteorologista.

Seluchi diz que a chuva irregular e a seca prolongada já eram previstas pela comunidade científica há cerca de 20, 30 anos —que é o tempo de carreira do meteorologista.

Grandes desastres na história ocorreram nos últimos anos, como é o caso do Rio Grande do Sul, neste ano, e São Sebastião (SP) em 2023 e Angra dos Reis (RJ) em 2022.

“Não é que antes não aconteciam desastres, isso sempre teve, mas nunca com essa frequência de agora. Até 2020, mais ou menos, estávamos relativamente ‘tranquilos’ porque tivemos mais secas do que chuvas. Mas desde então o que estamos vendo são eventos absolutamente extremos.” – Marcelo Seluchi, meteorologista

‘Ninguém está a salvo’

Para Seluchi, a ideia é evitar que a situação das mudanças climáticas saia do controle. “Temos de evitar que o quadro fique pior do que está.”

Ele acredita que os países não tenham interesse em reverter a situação devido a questões econômicas.

“Houve tentativa do acordo de Paris [tratado global em dezembro de 2015]. O mundo todo tentou várias vezes, mas ficou muito claro que os países não estão dispostos a abrir mão dos progressos financeiros em prol do meio ambiente.” – Marcelo Seluchi, meteorologista

O especialista reforça que “ninguém está a salvo”. “Os eventos recentes mostram isso. Pode acontecer em qualquer lugar hoje em dia.” O nível de impacto, no entanto, tende a ser maior entre as pessoas mais vulneráveis.

É preciso colocar o pé no freio

Especialistas acreditam que é possível adotar pequenas mudanças que podem fazer diferença.

Sondermann fala em “frear” as mudanças, com transição energética e medidas mais sustentáveis no país, incluindo principalmente as grandes empresas e os governos.

“Individualmente, podemos reduzir o consumo de energia, utilizar meios de transporte mais sustentáveis, seguir uma alimentação também mais sustentável, evitando desperdícios. Além disso, devemos apoiar medidas de empresas que estão conscientes das mudanças climáticas.” – Marcely Sondermann, meteorologista

Andrea Ramos, meteorologista do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) concorda com Sondermann: “Pequenos hábitos fazem diferença.”

“Acredito que exista, sim, esperança. Se cada pessoa seguir apoiando medidas sustentáveis já é uma gotinha a mais no oceano.” – Andrea Ramos, meteorologista

Meteorologia é coisa séria

Os meteorologistas ouvidos também explicam como chegaram a essa profissão. Ramos, do Inmet, conta que, para se formar meteorologista, são necessários, pelo menos, quatro anos de estudo na universidade — é possível fazer especializações na sequência. “Tem muita física, matemática e química. Há outros assuntos relacionados, como a aeronáutica também.”

A profissão analisa, principalmente, os fenômenos que ocorrem na atmosfera —e há desafios. “A questão das temperaturas, umidade, é sempre difícil prever porque a atmosfera é dinâmica. Os modelos estatísticos, apesar de cada vez melhores, ainda deixam uma lacuna.”

A especialista dá um exemplo clássico: quando estamos em um lugar em que, logo ao lado, está chovendo. “Até para os modelos é difícil captar as chuvas isoladas”, fala Ramos. “Mesmo com esse fator complicado, tentamos simular e prever os fenômenos da melhor forma possível.”

Fonte: ECOA

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