Dois filhotinhos de onça-pintada ficaram órfãos e estão vivendo um drama por causa de um crime bastante comum na Amazônia: a caça de animais silvestres. Eles foram separados da mãe ainda muito pequenos e foram parar em uma aldeia indígena no interior do Pará, onde acabaram desenvolvendo raquitismo – deficiência por falta de cálcio o que prejudica o crescimento.
Sem conseguir andar, eles se rastejavam pelo chão. Caçar como uma onça comum, então, ainda vai ser um grande problema para os irmãozinhos lidarem até a vida adulta.
A situação chegou ao setor de inteligência de órgãos ambientais, que foram acionados para levar os dois bichinhos do cativeiro na aldeia até um ambiente de reabilitação de animais: o Centro de Triagem e Reabilitação de Animais Selvagens (Cetras) em Belém.
Depois da reabilitação com ajuda de agentes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e de profissionais da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), agora eles estão em um zoológico de Parauapebas, no sudeste do Pará, onde já voltaram a correr, brincar e onde vão ser treinados a caçar.
Filhotes corriam risco de morte
O analista ambiental e chefe da Divisão Técnico-Ambiental do Ibama no Pará, Luiz Paulo Albarelli, explica que esse tipo de caça, com finalidade dos animais silvestres serem tratados como animais domésticos, ainda é comum no país como um todo.
No caso dos “irmãos onça”, ele explica que os dois adoeceram enquanto eram mantidos em cativeiro, evoluindo para problemas ósseos e de desenvolvimento por conta da alimentação que recebiam durante os três meses que passaram na aldeia indígena. Lá, eles comiam carne bovina e tomavam leite inadequado.
“Os dois estavam com um quadro de raquitismo nutricional e corriam risco sério de morte. A origem, portanto, dos animais foi ilegal, já que eles dependem da caça e não poderiam ser mantidos em cativeiro”.
O agente do Ibama disse que ainda não se sabe do paradeiro da mãe – se ela foi capturada ou morta por caçadores. Os filhotes foram separados dela com aproximadamente três meses de idade. “Nessa idade, o animal ainda está amamentando. A onça-pintada é uma espécie que sobrevive da caça, por isso ela não pode ser mantida em cativeiro, e os filhotes devem acompanhar a mãe até mais de um ano de idade, quando estão na fase de aprender a caçar para sobreviver”.
Reabilitação
Um dos veterinários que cuidou dos dois filhotes, Matheus Paiva disse que foram trinta dias de habilitação no Cetras, em Belém, antes dos dois serem levados para o zoológico.
“Nós podemos realizar o tratamento clínico para o quadro deles, porque chegaram sem conseguir se levantar e caminhar, então o tratamento clínico foi acompanhado de suplementação alimentar”.
A coordenadora do Cetras, professora Ana Silvia Ribeiro, da Ufra, reforçou que o trabalho foi feito em parceria com o Ibama, que assumiu o caso e deu toda assistência com suporte para manutenção dos animais. Uma das medidas para a reabilitação foi evitar que os animais tivessem obstáculos para escalar, o que poderia gerar novas fraturas, e a alimentação que era toda triturada para facilitar a digestão.
“Tivemos vários cuidados especiais, principalmente em relação à oferta da alimentação, não poderíamos dar presas vivas ou presas que necessitassem de mastigação. O alimento era todo triturado para evitar a fraturas dentárias”.
Ribeiro afirma que vários exames foram realizados para confirmar as fraturas, fissuras, desmineralização ósseas. Diante da situação, a professora destaca a importância de campanhas contra o tráfico de animais silvestres.
Rumo à volta para a natureza
O analista do Ibama Albarelli disse que os dois estão vivendo no Zoológico de Carajás, que faz parte do Programa Nacional de Conservação da Onça-pintada, além de estar dentro de uma unidade de conservação arborizada.
“No zoológico, os animais recebem cuidado de médico veterinário, de biólogos, dentro desse programa nacional, a ideia é que eles sejam reabilitados e futuramente retornem à natureza, mas é um um passo longo”.
Albarelli diz que os dois ainda tem muito a passar antes de voltar à natureza. Até lá eles serão treinados para caçar, já que não tiveram contato com a mãe.
“É um tratamento dia após dia, com objetivo final que eles voltem à natureza um dia”.
Fonte: G1