A natureza e a mulher, ambas mapeadas como objeto de domínio, aparecem interconectas nas ideias do ecofeminismo, enriquecendo e ampliando tanto a teoria feminista como o ecologismo.
Suas origens englobam a segunda onda feminista com o despertar da consciência ecológica, ao final dos anos 70. Na França, Françoise d’Eaubonne escreveu Feminismo ou Morte em 1974 e pouco depois, na Alemanha, Gabriele Kuby publicou O final da dominação patriarcal, marcando o patriarcado como uma ordem destruidora da natureza. Nos EUA, em 1978, surgem os trabalhos de Susan Griffin e Mary Daly.
Em constante agitação mobilizada por seus debates teóricos internos, o ecofeminismo tem, assim como o feminismo, diferentes vertentes. Uma de suas divisões internas tem a ver com o essencialismo, ao que tende parte do ecofeminismo, a partir da ideia da natureza como sujeito que está no mesmo centro de sua filosofia. Sem dúvida, a dominação da natureza e da mulher, analisadas historicamente sob a implantação de regras análogas e socialmente construídas com estruturas de formato similar, surge também sob a luz dos estudos ecofeministas com enfoque epistemológico. Evelyn Foz Keller e Carolyn Merchant – com suas críticas à tecnologia e à história da ciência e da tecnologia-, são importantes representantes do ecofeminismo não essencialista, assim como Ynestra King com seus trabalhos neo-anarquistas. Na Índia, Vandana Shiva marca o maior avance nas análises da dominação colonialista patriarcal do Ocidente.
A ecofeminista alemã Bárbara Holland-Cunz, acolhe a noção de das Zugleich, o simultâneo, para evitar tanto o essencialismo quanto o materialismo vulgar. Se por um lado somos natureza, o polo de não identidade nos remete às condições sociais. Assim, tenta superar as insuficiências de ambos os conceitos e transcender à tensão essencialismo/materialismo.
No banco dos réus, posa em todos os casos o modelo relacional baseado na dominação. Historicamente imposto na sociedade patriarcal como embasamento das relações socioeconômicas da sociedade moderna industrial, tem levado à crise ecológica em que se afunda todo o planeta. O fato de reconhecer conexões importantes entre a dominação de grupos humanos por motivos de raça, gênero, classe ou espécie por um lado, e da natureza pelo outro, não significa considerar os homens culpados de toda a destruição do meio ambiente, ou acreditar que as mulheres são parte de um determinado sistema opressor. Elas o são quando aspiram, em sua luta por igualdade, participar de um sistema de dominação que oprime sua vez aos outros, sejam animais humanos ou não humanos. As mulheres devem ver- disse Rosemary Rüether em New Woman/New Erth (Nova Mulher/Nova Terra)- que não pode existir liberdade para elas, nem solução para a crise ambiental, dentro de uma sociedade cujas relações socioeconômicas, assim como seus valores subjacentes, se baseiam em um modelo de dominação.
Avançando até as relações dos ecofeminismo com o ecologismo social, começa a se iluminar a relação entre exploração do trabalho e destruição da natureza. O socialismo acredita que o progresso e a riqueza conduzem à liberdade. O socialismo ecológico desconstrói este conceito com a contribuição da alternativa ecofeminista e a lembrança de sua raiz anarquista. Esta integração é uma visão incipiente, porém a aliança entre trabalhadores e ambientalistas poderia se desenvolver como a principal força histórica do século XXI.
Talvez nada possa comover mais as estruturas mentais e emocionais das mulheres que a compreensão da necessidade de serem as principais envolvidas na libertação dos mais oprimidos da Terra, as espécies animais não humanas, especialmente as usadas como bens de consumo, sob o marco regulatório legal das leis de “proteção animal”. O aporte da luta pelos direitos animais marca um selo qualificado no andaime ecofeminista. Um que permite, entre outras coisas, não pensar em termos como “não me trate como um cachorro” ou “não me trate como gado”, se não em algo como “que todos que sentimos sejamos tratados por igual”.