Saengduean Lek Chailert tinha cinco anos quando viu um elefante pela primeira vez. Estava acorrentado, passando pesadamente pela sua casa na zona rural da Tailândia a caminho de ajudar madeireiros a arrastar árvores da floresta. Naquela época, ela via os mamíferos gigantes como todos os outros, como animais que serviam aos humanos. Mas isso mudou no dia em que ouviu um grito na floresta.
Chailert tinha 16 anos quando ouviu o som terrível. Correu entre as árvores até encontrar a fonte: um elefante macho se debatendo na lama enquanto tentava, sem sucesso, arrastar um tronco de um buraco. Cada tentativa fracassada era seguida de punição dos madeireiros e do mahout (o tratador do elefante).
Um atirava com uma fisga no animal, outro o esfaqueava com uma faca, e um terceiro enfiava um espeto na perna do elefante. A cada golpe, o animal soltava um grito de dor.
“O elefante olhou para mim, e eu senti o medo e a raiva. Me senti impotente e confusa. Meu coração doía muito”, diz Chailert. “Tentei de tudo para fazer os gritos pararem, mas estava atrapalhando o trabalho deles, então tive que ir embora. Fiquei perguntando: ‘por quê, por quê, por quê?'”
“Quando voltei para a aldeia, ainda conseguia ouvir o elefante durante o jantar naquela noite”, ela conta.
O incidente mudou para sempre o rumo da vida de Chailert. Ela vinha de uma família pobre — não havia eletricidade nem escola em sua aldeia —, mas jurou fazer algo pelos animais que amava.
Antes da proibição do desmatamento em florestas naturais na Tailândia em 1989, os elefantes eram peças-chave da indústria. No início do século XX, estimava-se que houvesse 100 mil elefantes no país. Milhares morreram de exaustão ou ficaram com ferimentos graves por arrastar árvores enormes da floresta até as estradas, onde seriam transportadas como madeira.
Após a proibição, muitos elefantes passaram a ser usados pela indústria do turismo, que crescia rapidamente no país, para apresentações e passeios.
Trabalhando em uma agência de turismo aos 20 e poucos anos, Chailert assistiu à mudança com horror. “Havia muitos mochileiros na época. Donos de acampamentos competiam entre si pelos turistas”, diz.
“Eles treinavam os elefantes para dançar, andar de moto, jogar dardos ou bambolê, caminhar na corda bamba ou tocar gaita. Isso trouxe mais sofrimento aos elefantes.”
Chailert tentou algumas vezes até realizar seu sonho de encontrar uma forma de cuidar dos elefantes tailandeses. Em 1996, vendeu tudo o que tinha e pegou dinheiro emprestado para criar um santuário de elefantes. Pagou US$ 30 mil por quatro hectares (10 acres) de terra para abrigar nove elefantes.
Ela insistia que não haveria passeios ou apresentações com elefantes. Sua família investiu dinheiro para ajudar, mas, após desentendimentos sobre a administração do parque, ela deixou o projeto, levando os elefantes consigo.
Então, Chailert teve sorte. A National Geographic estava filmando um documentário com a estrela de Hollywood Meg Ryan sobre os elefantes selvagens da Tailândia — estimados em 4.000 a 4.400 até 2023 —, e Chailert e seus elefantes recém-libertados apareceram nele.
Nos EUA, um casal do Texas, Bert e Christine Von Roemer, assistiu ao programa e entrou em contato com Chailert, doando dinheiro suficiente para comprar um terreno de 20 hectares no distrito de Mae Taeng, no norte da Tailândia, perto de Chiang Mai. Em 2003, nasceu o Elephant Nature Park.
Hoje, cerca de 120 elefantes resgatados vivem no parque, que se expandiu para mais de 1.000 hectares e abriga uma pequena fração dos aproximadamente 3.900 elefantes domesticados no país. O trabalho do santuário tem um enorme acompanhamento nas redes sociais, no Instagram e no Facebook.
Os elefantes chegam de toda a Tailândia. Chailert, agora com 64 anos, às vezes viaja por mais de 50 horas com os animais após o resgate.
“Alguns chegam com graves problemas psicológicos. Alguns ficam parados como zumbis; outros são agressivos, balançando a cabeça para frente e para trás. Quando chegam, não permitimos que nossa equipe use ferramentas ou faça qualquer coisa que possa fazê-los se sentir ameaçados.”
“Somos gentis. Temos que dar nosso amor para que confiem em nós. Temos que ser pacientes”, diz.
Os recém-chegados quase sempre ficam em quarentena e são lentamente introduzidos ao grupo. Com o tempo, são aceitos. Quando suas orelhas começam a bater e suas caudas a girar, os elefantes estão felizes, diz Chailert.
“A prioridade é que cada elefante tenha uma família”, ela afirma, mostrando em uma tela o grupo se alimentando na floresta.
Hoje, o projeto de conservação é financiado por visitantes e voluntários que pagam para trabalhar nele. Mas, apesar do sucesso do santuário, Chailert teme pelo futuro dos elefantes asiáticos, que ela acredita estar diminuindo na Tailândia — embora dados oficiais mostrem um aumento constante na população.
“Em toda a Ásia, muitas pessoas estão começando a odiar elefantes. O conflito entre humanos e animais selvagens é um grande problema. Muitos morreram baleados ou envenenados”, diz.
“Muitos perderam seus habitats e fontes de água, então precisam ir a campos de golfe e plantações de arroz — lugares que não lhes pertencem. Assim, as pessoas ficam furiosas e transformam o elefante em um monstro. O futuro dependerá da política governamental para resolver isso”, ela conclui.
Traduzido de The Guardian.