As mudanças climáticas são um fenômeno de escala global, mas que afeta de maneiras e proporções muito diferentes cada região do mundo. Enquanto há locais que enfrentarão resfriamentos severos, outros enfrentarão aumentos significativos de temperatura; ao passo que regiões terão que lidar com aumento das chuvas, outras serão desafiadas pela seca. Isso se deve ao fato de que o aquecimento médio da temperatura do planeta leva a uma desregulação do sistema climático, tal como conhecemos hoje, que causa distúrbios muito diversos na dinâmica do clima em escala regional e local.
Outra diferença importante sobre como as consequências das mudanças climáticas são percebidas em cada lugar do mundo está relacionada à estrutura que cada país tem para enfrentar os efeitos adversos que serão observados em seus territórios. Países em desenvolvimento, que passaram por longos períodos de exploração colonial, como os africanos e os latino-americanos, terão muito mais dificuldade para se adaptarem à nova realidade climática que lhes será imposta do que os países ricos. Essa situação é conhecida como injustiça climática: os países que enfrentarão impactos mais severos são exatamente aqueles que menos emitiram gases de efeito estufa ao longo da história – e, por isso, contribuíram pouco ou nada para a situação de caos climático que já está em curso.
Justiça climática é tema de novo anuário de sustentabilidade do Um Só Planeta
Desde que a Convenção das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas foi criada, em 1992, países ricos viram a alteração global do clima como um problema que demoraria para lhes afetar severamente e, ao mesmo tempo, como uma oportunidade de investir e vender novas tecnologias que seriam menos impactantes ao clima.
Mas agora as mudanças climáticas não são mais um problema do futuro, nem exclusivo de países pobres.
A seca extrema que tem afetado Estados Unidos, China e Europa fizeram com que o nível da água de rios e lagos diminuísse tanto que áreas que costumavam ficar permanentemente submersas apareceram, revelando “pedras da fome” na Alemanha, navios afundados durante a Segunda Guerra Mundial no rio Danúbio, na Sérvia, e bombas do mesmo período que estavam submersas no Rio Pó, na Itália.
Nos Estados Unidos, pegadas de dinossauros puderam ser vistas no fundo de lagos no Estado do Texas, enquanto a China registrou a seca de 66 rios, alguns dos quais revelaram estátuas construídas a mais de 600 anos atrás e que atualmente também estavam embaixo d’água. Ao mesmo tempo, Portugal, Espanha e França passam por temporada com recordes de incêndios florestais, decorrentes do clima extremamente quente e seco.
Os exemplos trazidos acima são simbólicos e representam a situação crítica que já afeta as principais economias do mundo. A crise de seca, que em muitos desse locais não encontra precedentes registrados na história, impacta na produção agrícola e na geração de energia elétrica, o que leva chineses, americanos e europeus a expandirem a procura por alimentos no mercado internacional, causando aumento do preço e escassez ainda maior na disponibilidade global desses produtos, e também o uso de fontes fósseis de energia.
A crise climática deixou de ser um problema que afeta apenas aos pobres, embora estes sejam, ainda, muito mais vulneráveis. Ao lado dos conflitos bélicos, a mudança do clima já está entre os principais fatores de instabilidade econômica no planeta. A situação é agravada pela guerra travada na Ucrânia, que levou países europeus a retomarem o uso de carvão para a produção de energia, o que representa enorme retrocesso nos esforços de transição energética para fontes limpas.
Em novembro, líderes de todos os países se reunirão no Egito para debater a crise climática, na COP27, e buscar avanços por compromissos mais decisivos, com base no Acordo de Paris. Agora, os países ricos não têm mais o que esperar, uma vez que o caos chegou aos seus quintais. Estados Unidos, China e Europa devem urgentemente deixar de tratar a crise climática como “oportunidade de negócio” e enfrentá-la como ela de fato é: uma crise humanitária que nos fará perceber os tempos críticos da COVID-19 como uma mera crisezinha.
Fonte: Um só planeta