O Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) emitiu uma série de recomendações contrárias à instalação de um projeto de criação e matança de jumentos no município de Amargosa, no recôncavo baiano. A medida, impulsionada pela intensa mobilização de ONGs de proteção animal, representa um freio significativo a uma indústria que está quase causando a extinção do jumento nordestino.
A ação do MP-BA visa especificamente impedir os planos de uma empresa chinesa de estabelecer uma base de “melhoramento genético” no estado, que, na prática, serviria para abastecer o comércio de peles para a produção de ejiao, uma gelatina da medicina tradicional chinesa, sem comprovação científica de eficácia, extraída através do cozimento da pele desses animais.
Segundo o MP, a iniciativa poderia piorar o extermínio dos animais, sem controles institucionais, ambientais ou sanitários adequados. Especialistas alertam que esse modelo ameaça a sobrevivência do jumento nordestino, cuja população já caiu 94% em duas décadas.
“Até o final desta década os jumentos nordestinos vão desaparecer. Junto com o seu desaparecimento vai também a seleção natural de características genéticas únicas, desenvolvidas em um ambiente muito relevante aos desafios climáticos que assolam a humanidade. Ou seja, estamos descartando algo que pouco conhecemos”, diz Adroaldo Zanella, professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP (Universidade de São Paulo).
A bióloga Patrícia Tatemoto, porta-voz da The Donkey Sanctuary no Brasil, acrescenta que a fisiologia dos jumentos impede uma produção intensiva, tornando o negócio essencialmente extrativista. “A gestação dura de 11 a 12 meses, e até que o animal esteja pronto para o abate pode levar até três anos. Por isso, em todos os países onde essa atividade ocorre, ela é de natureza extrativista, gerando ônus sanitário, reputacional e ético”, afirma a especialista.
O alerta do MP-BA é muito importante diante da fragilidade da espécie. A decisão representa um marco de resistência frente ao interesse econômico internacional e reafirma a necessidade de proteger os animais e preservar o patrimônio genético, cultural e ambiental do semiárido brasileiro.