Pequenos mamíferos de origem nativa podem sobreviver em ambientes alterados pelo ser humano se houver um mínimo de cobertura florestal remanescente na região.
Essa constatação parte da tese de doutorado da professora e pesquisadora Fabiana Umetsu, pelo Instituto de Biociências (IB) da USP.
O trabalho levantou a quantidade de marsupiais e roedores e a variedade destes em áreas com agricultura que mantinham algum resquício de Mata Atlântica.
Fabiana mostra a importância de os estudiosos também considerarem os ambientes alterados na análise de espécies nativas.
– Mesmo nessas regiões se encontram espécies florestais (ou nativas) se nelas houver resquícios de floresta –, observa a professora.
Ela destaca que as espécies nativas dependem da floresta no entorno de fazendas e em outros ambientes alterados para sobreviver. Além disso, a floresta facilita sua colonização na região.
Isso se aplica até para formas de agricultura diferenciada:
– Mesmo que uma área tenha agricultura orgânica, se não tiver cobertura florestal na região, dificilmente haverá espécies nativas. Assim, seria melhor combinar estes dois fatores –, comenta Fabiana.
Agricultura orgânica é o termo usado para a produção de alimentos e outros produtos vegetais que não fazem uso de produtos químicos sintéticos, como fertilizantes e pesticidas.
Fabiana verificou a distribuição de três grupos de espécies de roedores e marsupiais em duas regiões do Estado de São Paulo com ocupação agrícola, cada uma com 10 mil hectares de área: uma nos municípios de Tapiraí e Piedade, e outra nos municípios de Ribeirão Grande e Capão Bonito. No total, ela encontrou 21 espécies.
As regiões foram estrategicamente escolhidas, de acordo com a cobertura florestal de cada uma. Enquanto a primeira (Tapiraí e Piedade) tem 49% de cobertura florestal, a segunda (Ribeirão Grande e Capão Bonito) tem somente 11%.
Essa diferença foi essencial para o estudo distinguir a distribuição de um dos três grupos selecionados. Estes foram divididos previamente entre os mamíferos “restritos aos biomas florestais”, os “generalistas” e os “invasores”.
O primeiro grupo representa as espécies nativas somente da Mata Atlântica; o segundo contém as espécies que ocupam tanto a Mata Atlântica quanto outros biomas; já os “invasores” são espécies originais de outros biomas com vegetação mais aberta, como o Cerrado ou os Pampas. Este grupo inclui também animais como camundongos e ratos-de-esgoto.
O primeiro grupo foi beneficiado na região com maior quantidade de floresta, onde a professora encontrou maior número de animais e de variedade de espécies do grupo. Os cultivos agrícolas estudados foram dominados por mamíferos generalistas e invasores, que são mais abundantes em ambientes alterados.
Apesar do domínio nos ambientes alterados, o grupo dos generalistas não foi beneficiado com o aumento de áreas abertas.
– As espécies generalistas acabam se beneficiando, na verdade, das áreas de transição entre florestas e ambiente alterado. Talvez elas encontrem mais recursos nesses locais, mas ainda não há uma explicação precisa –, diz Fabiana.
O grupo dos invasores, por sua vez, teve maior variedade de espécies e maior quantidade de uma espécie nos locais circundados por mais áreas abertas, na análise em escala mais local. A pesquisadora acredita que essas espécies, em relação às outras, se adaptam ainda melhor aos ambientes abertos, como, por exemplo, resistindo mais a lugares ensolarados.
Um detalhe importante que a pesquisadora destaca é o efeito que regiões com maior cobertura florestal têm ao atrair mais espécies que são restritas a biomas florestais.
– Interessante observar que dentro das espécies invasoras, algumas podem ser transmissoras de doenças. Como o número delas era maior com o incremento na quantidade de áreas abertas na escala local, provavelmente as áreas com menor cobertura florestal aumentam as chances de transmissão dessas doenças.
Fonte: Correio do Brasil