Fátima Chuecco/Redação ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais
“As janelas, vidraças, painéis de vidro e as gigantescas fachadas espelhadas em edifícios são praticamente invisíveis para as aves que evoluíram para enxergar as cores de uma forma completamente diferente da nossa”, diz o pesquisador e fundador do Instituto Passarinhar, Sandro Von Matter, que coordena o Programa de Monitoramento de Colisões de Aves em Janelas (PNMCAJ). O objetivo é mapear e quantificar a mortalidade de aves por impacto em janelas no Brasil, investigar o fenômeno e propor soluções para o problema à gestores públicos, empreendedores e cidadãos comuns.
Segundo Von Matter, somente nos Estados Unidos, cerca de 900 milhões de aves morrem anualmente vítimas de colisões em estruturas de vidro e no Brasil este número pode ser ainda maior: “Ao se deparar com painéis ou janelas de vidro transparente as aves são incapazes de detectar o obstáculo à sua frente. Já no caso de vidros espelhados, é impossível para elas distinguir a diferença entre o que é real e o que é uma imagem refletida”. Para ilustrar este fenômeno, o pesquisador postou em vídeo em seu blog onde uma ave busca a segurança das árvores sem perceber que se trata de um reflexo. Assista no site.
Segundo um estudo feito nos EUA, os arranha-céus não são os únicos responsáveis pela morte de milhões de aves. Cerca de 56% das colisões com morte ocorre em edifícios baixos (de 4 a 11 andares de altura), 44% em residências (com 1 a 3 andares de altura) e menos de 1% em prédios com mais de 12 andares de altura. “No Brasil, são escassos estudos abordando o tema, mas qual seria o impacto sobre as populações de aves causado por colisões em janelas no país? Com base nas diferenças entre o clima e a diversidade de espécies dos dois países, é possível presumir a resposta. Qual seria a estimativa para um país como o nosso, com predominância de clima tropical e nada menos que 1919 espécies de aves, de acordo com a última análise do Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos? ”, comenta.
Von Matter diz que “possivelmente, já enfrentamos uma epidemia silenciosa de colisões de aves em janelas”. E é também possível supor que seriam, pelo menos, o dobro das colisões que ocorrem nos EUA dado o número maior de espécies que vivem em áreas urbanas brasileiras.
“Digo epidemia silenciosa porque muitas destas mortes passam despercebidas. É raro um bando de aves se chocar contra uma janela, ao mesmo tempo. O que geralmente ocorre são colisões individuais ao longo do ano. Dezenas de aves que morrem em decorrência desse tipo de colisão não são sequer encontradas porque acabam sendo devoradas por gatos, ratos ou descartadas pelo serviço público de limpeza. Em outros casos, as aves atordoadas deixam o local seriamente feridas, com lesões como hemorragia cerebral ou rompimento de órgãos internos, voando mais alguns metros e morrendo nas proximidades”, explica.
Uma análise de impacto ambiental coordenada pelo pesquisador Dr. Miguel Marini, da Universidade de Brasília (UnB) demonstrou que, ao longo de um ano, mais de cem aves de vinte espécies diferentes colidiram e vieram a óbito nas fachadas espelhadas do prédio da Procuradoria-Geral da República, em Brasília – conforme cita o pesquisador em seu blog. “No local, foram registradas mortes de pombas, beija-flores, andorinhas, uma coruja, um gavião e uma gralha, além de espécies migratórias e, algumas que só existem no Cerrado como o papagaio-galego (Alipiopsitta xanthops), extinto em São Paulo e considerado espécie ameaçada em Minas Gerais”, diz.
Von Matter assinala que é urgente e imprescindível que diretores de empresas, gestores públicos, síndicos e associações de moradores – além dos responsáveis por empreendimentos imobiliários e profissionais como engenheiros, arquitetos e paisagistas – incorporem, em seus projetos ou planos municipais, ações para prevenir ou minimizar a morte de aves por colisão.
Participe!
O pesquisador solicita que as pessoas contribuam com o Programa de Monitoramento de Colisões de Aves em Janelas relatando casos que tenham ocorrido em suas casas ou ambientes de trabalho. A participação da população é essencial para que seja possível minimizar ou por um fim a esse problema. Basta preencher um formulário e deixar um depoimento no site.
Como evitar as colisões?
É possível incorporar alguns elementos às janelas de residências e painéis de edifícios diminuindo o risco de colisão. A aplicação de fitas, filmes, tinta ou decalques do lado exterior, além da instalação de redes na frente dos vidros são algumas das soluções, já que criam barreiras visuais que permitem que as aves sejam capazes de detectar a presença de um obstáculo. Fixar ou desenhar silhuetas de aves em janelas, como as de gaviões, raramente, evitam colisões. Essas são algumas orientações de Von Matter.
“Sabemos, também que a maioria das aves é capaz de enxergar a cor ultravioleta (UV). Isso significa que podemos tornar as janelas visíveis para as aves mantendo-as ainda transparentes para os nossos olhos, já que nós não evoluímos para enxergar a luz UV. Assim, curiosamente uma das soluções pode ser pintar ou adesivar as janelas, mas com produtos que reflitam a luz UV”, diz o pesquisador.
“No entanto, nem todos as aves enxergam UV. O estudo `A vision physiological estimation of ultraviolet window marking visibility to birds`, realizado pelos pesquisadores Olle Hastad e Anders Odeen em 2014, demonstrou que gansos, patos, pombos, aves de rapina e até corvos percebem o ultravioleta apenas sob determinadas condições de luz, o que torna ineficaz o uso de tintas UV para evitar a colisão de algumas espécies, destas famílias”, complementa.
Além dessas soluções existem, segundo o pesquisador, dezenas de outras disponíveis no mercado como adesivos perfurados que tornam janelas opacas do lado de fora, mas transparentes do lado de dentro e vidros especiais com estruturas visíveis apenas para as aves. “Mas, embora a regra geral seja tornar os vidros visíveis e menos reflexivos, é extremamente recomendado – em especial para grandes projetos – que, antes de se optar pelo uso de qualquer tecnologia, um especialista da área seja consultado”.
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