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MADEIRA SERRADA

Menos de 30% da madeira explorada na Amazônia é aproveitada por serrarias

Cada 100 m³ de árvores exploradas, apenas 24,6 m³ de fato se transformaram em produtos comercializáveis

19 de fevereiro de 2023
4 min. de leitura
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Estudo do INPA expõe baixíssimo rendimento da exploração madeireira na Amazônia Foto: Vicente Sampaio/Imaflora

Das grandes árvores que são retiradas da floresta Amazônica para exploração madeireira, menos de um terço de fato chega ao mercado como madeira serrada. Isso é o que mostra um estudo realizado por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), publicado esta semana na revista científica “Acta Amazônica”. Além de investimentos em tecnologia, o trabalho propõe mudanças no procedimento de controle do volume de madeira que sai da floresta tropical brasileira.

A Amazônia é uma das principais regiões que produz madeira tropical no mundo. Como forma de fazer o controle do que é retirado da floresta, órgãos ambientais utilizam ferramentas como o Coeficiente de Rendimento Volumétrico (CRV), que é a relação percentual entre o volume produzido de madeira serrada, a partir de um determinado volume de tora.

Pela legislação, o CRV é um valor fixo, gerado automaticamente pelo sistema do Documento de Origem Florestal (DOF), no momento em que o proprietário/empresa cadastra o volume extraído de toras. Este coeficiente varia de acordo com o subproduto da madeira a ser obtido – madeira serrada, laminada ou carvão, por exemplo.

O CRV para madeira serrada, o subproduto mais comum na Amazônia, é de 35%. Isto é, para cada 100 m³ de toras retiradas da floresta, o proprietário/empresa recebe créditos para a comercialização de 35 m³ de madeira serrada.

A pesquisa do INPA mostrou que o já baixo volume considerado pelos órgãos ambientais – 35% – para o rendimento na produção madeireira é ainda pior no chão da fábrica: a porcentagem encontrada pelos pesquisadores ao analisar uma serraria foi, em média, de 24,6%. Ou seja, para cada 100 m³ de árvores exploradas, apenas 24,6 m³ de fato se transformaram em produtos comercializáveis.

“O primeiro objetivo do nosso trabalho foi mostrar que a legislação brasileira fala em 35%, que já é um valor muito baixo, mas que a realidade da Amazônia é ainda pior”, explicou a ((o))eco a engenheira florestal Kauanna Domingues Andrade, pesquisadora do INPA e uma das autoras do estudo.

No caso da empresa analisada pelo INPA, os outros 75,4% da matéria prima explorada e não transformada em madeira serrada foi utilizada para geração de energia termoelétrica. Mas Kauanna salienta que essa não é a realidade da Amazônia como um todo.

“Em geral, esse excedente é descartado. Estamos pegando árvores muitas vezes milenares da Amazônia e tratando como lixo”, diz.

Kauanna e a equipe do INPA sugerem que uma forma de melhorar essa realidade seria aumentar os investimentos em tecnologia e maquinário para aumentar o aproveitamento da madeira. “Se a tecnologia da madeira não avançar, o número de resíduos vai continuar muito alto e não tem como existir sustentabilidade nesse processo”, diz.

Créditos virtuais

Outro problema identificado pelos pesquisadores do INPA foi o acúmulo de créditos virtuais por empresas que não atingem o rendimento de 35% estabelecido pelos órgãos ambientais. Isto é, ao emitir o DOF para os 100 m³ usados como exemplo, o sistema gerou automaticamente créditos para a comercialização de 35 m³ de madeira serrada. Mas como o rendimento foi menor – 24,6 m³, no caso analisado – a empresa em questão ficou com o “crédito” de 10,4 m³ no sistema.

Segundo Kauanna Andrade, quando os créditos se acumulam, os empresários enfrentam dificuldades para adquirir novas licenças de exploração. Isso quando estamos falando daqueles que se mantém na legalidade. Para os que trabalham de forma ilegal, os créditos virtuais são um prato cheio: eles podem ser usados para “lavar” madeira explorada ilegalmente.

“Existem até casos de hackers que invadem o sistema DOF e roubam esses créditos para entregar na mão de pessoas que não teriam autorização para vender essa madeira”, explica.

A solução sugerida pelos pesquisadores é que o coeficiente de rendimento volumétrico deixe de ser um valor padrão e seja calculado a partir do rendimento de cada indústria, de acordo com as realidades tecnológicas existentes localmente, diminuindo, assim, o número de créditos virtuais excedentes.

“O grande ponto do nosso trabalho foi, sim, chamar a atenção para os valores [de aproveitamento] que são horríveis, assustadores, mas dizer também que existe um método muito fácil se a empresa quiser calcular seu CRV e que é preciso investir em tecnologia, porque do jeito que está, não dá”, diz.

Na Amazônia, o rendimento varia de acordo com a espécie. O maquinário utilizado no desdobro, o tipo de produto final, a qualidade das toras, o tempo e locais de estocagem, no entanto, também são fatores determinantes para o rendimento dentro da indústria.

Ao derrubar o CRV padrão e apoiar o investimento em ciência e tecnologia para melhorar o rendimento das espécies, os órgãos ambientais estimulariam empresas a produzir de forma mais sustentável, defendem os pesquisadores. “Sem manejo florestal sustentável, adeus biodiversidade”, observa Adriano José Lima, que também é autor do artigo.

Fonte: Oeco

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