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TECNOLOGIA

Meio Ambiente: a tokenização e o blockchain a serviço do planeta

Segundo pesquisadores do meio ambiente acreditam que as emissões cairão por mudanças tecnológicas, mas não em velocidade que precisamos

7 de junho de 2022
Luís Adaime
5 min. de leitura
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Foto: Getty Images/imaginima

A humanidade está enfrentando o seu maior desafio existencial: as mudanças climáticas. Desde que surgimos no planeta, nunca o risco de sermos extintos (e em pouquíssimo tempo) foi tão alto. Estamos emitindo mais que o dobro de gases de efeito estufa que em 2008. Se continuarmos neste ritmo, cientistas afirmam que a média da temperatura global deve aumentar de 2,5 a 3 graus até 2070 (daqui a cinquenta anos). Parece pouco, mas seria catastrófico: um aumento desta magnitude implica que: (a) todas áreas atualmente litorâneas, como Rio de Janeiro e Nova Iorque, estariam debaixo d’água; (b) a zona tropical do mundo, que inclui o Brasil, África e sudeste asiático, ficaria inabitável por fazer 65 graus à sombra; e (c) a produção de comida do mundo cairia 50% ou mais, matando de fome a metade mais pobre da população global, ou 5 bilhões de pessoas.

Há uma escola de pensamento, da qual a Moss faz parte, que acredita que as emissões cairão por mudanças tecnológicas, mas infelizmente não na velocidade que precisamos. Neste caso, temos que complementar o mercado e agregar agilidade por meio de créditos de carbono, que são certificados digitais que comprovam que uma empresa ou projeto ambiental sequestrou ou evitou a emissão de uma tonelada de carbono.

Como as emissões de carbono são uma externalidade negativa da economia baseada em combustíveis fósseis (um “efeito colateral” não previsto), ela não é precificada a não ser por meio de créditos de carbono. Uma petroleira emite milhões de toneladas de carbono ao ano, mas, a não ser que esta empresa esteja no mercado de carbono, ela não paga por essa poluição. Quem paga somos todos nós: o custo da pior qualidade do ar e das mudanças climáticas é diluído entre os quase 8 bilhões de pessoas na Terra.

O mercado de carbono expandiu bastante nos últimos 3 anos. Isso em razão das mudanças climáticas terem ficado mais óbvias para o mundo e o fato dos “millennials” – pessoas nascidas depois de 1980 – terem substituído os baby boomers como o grupo demográfico mais importante do mundo. Ambas situações passaram a exigir que empresas nas quais investem e produtos que consomem compensem suas emissões de carbono.

Acreditamos que há um processo em curso de altíssima disrupção via uso de tecnologia para acelerar o desenvolvimento do mercado de carbono. O processo de certificação, auditoria e monitoramento de áreas e projetos de carbono ainda é quase que inteiramente feito à mão, de maneira artesanal, por empresas de consultoria ambiental. O setor mudou pouquíssimo seus processos desde a criação do mercado de carbono há vinte anos. Pela falta de avanço tecnológico, o setor se tornou um gargalo para a expansão da certificação de carbono globalmente, e tem levado a aumentos expressivos do preço dos créditos.

Acredito que essa indústria seja das últimas a ainda sofrerem disrupção tecnológica. E não é uma indústria pequena: o mercado de carbono representou US$ 1,2 bilhão em 2021, e a McKinsey espera que se multiplique por 15 a 100 vezes até 2030. O setor de serviços ambientais, como consultorias, auditorias, ecoturismo etc, representa bilhões de dólares anuais. Esperamos que seu crescimento exponencial se dê somente quando serviços feitos manualmente hoje se automatizem e passemos a usar blockchain e web 3.0 para sua maior segurança e auditoria mais eficiente da geração e uso de dados.

Neste segmento, empresas de tecnologia verde (as chamadas “climate techs”) já estão trazendo mais eficiência por meio da digitalização de processos historicamente checados manualmente. Um exemplo é o uso de imagens de satélites e algoritmos de análise de densidade de vegetação em vez de inventários florestais, os quais ainda são levantados por engenheiros florestais indo a campo e medindo troncos com fita métrica e aferindo a densidade por amostragem.

Fala-se muito da “transparência” e “segurança” trazidas pelo uso de blockchain a vários setores, como créditos de carbono, mas o que exatamente significa isso na prática? Historicamente, o setor de créditos de carbono sofreu abalos de sua credibilidade por fraudes cometidas. Como o crédito de carbono é um certificado digital, intangível, alguns projetos vendiam o mesmo ativo várias vezes. Ou vendiam créditos do Brasil dizendo que eram da Indonésia. Ou vendiam créditos de 2012 dizendo que eram de 2015. Ou “cancelavam” os créditos após a compensação, e não registravam isso nos registros globais de crédito. Ou vendiam dez créditos que deveriam ser “cancelados” ou aposentados, e cancelavam somente um. Tudo isso levou o setor a, infelizmente, ter uma má fama.

Ainda hoje em dia, em sites de empresas de compensação que não usam blockchain, a credibilidade da compensação não é alta e o processo facilmente fraudavel. O usuário calcula sua pegada de carbono, compra seus créditos, é cobrado o valor em seu cartão de crédito e recebe um arquivo pdf ou confirmação da transação por email.

Mas o que garante – fora a reputação da empresa que vendeu os créditos e a compensação – que aquele crédito foi realmente vendido, e não somente cobraram e não fizeram nada? Ou que aposentaram aquele crédito? Que aposentaram o crédito do projeto vendido, da safra vendida? Ou ainda que a transação foi efetivamente inserida no registro global de crédito para que não haja “dupla contagem”?

O uso de blockchain resolve todas essas dúvidas acima. Uma vez efetivada a transação, ela fica disponível para sempre, de maneira infraudavel, em sites de redes cripto, de maneira pública e de fácil acesso. Transações em blockchain também evitam a “dupla contagem” ou “double spending”: uma transação registrada em blockchain não permite que haja outro registro da mesma transação. Também permitem que dados sejam auditados em tempo real com os registros globais de crédito, para que não haja fraude.

Se conseguirmos trazer disrupção tecnológica e mais eficiência ao setor ambiental global, e conseguirmos fazer com que a solução de compensação de produtos e serviços não seja feita a mão como atualmente, mas por meio de APIs e softwares (SAAS) e com dados digitalizados e registrados em blockchain, as chances de conseguirmos evitar um cenário climático desastroso aumentarão drasticamente. Está (ainda) em nossas mãos trabalharmos juntos para que o planeta siga sendo habitável para as futuras gerações.

*Luis Adaime é fundador e CEO da Moss, climatech criada em 2020. A startup de tecnologia para serviços ambientais atua por meio de conhecimento e tecnologia em blockchain para realizar a compensação de emissão de gases de efeito estufa. Para isso, criou o MCO2, o primeiro token lastreado em crédito de carbono.

Fonte: Exame

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