O corredor bioceânico é um projeto de infraestrutura desenvolvido há quase oito anos pelos governos da Argentina, Brasil, Paraguai e Chile para ligar quatro portos localizados no Oceano Pacífico ao porto de Santos (SP).
A rodovia terá cerca de 2.200 quilômetros de extensão e um custo aproximado de US$ 10 bilhões para facilitar o transporte de gado e a exportação de produtos.
Mas a entusiasmada divulgação do projeto esconde danos graves ao meio ambiente e aos interesses dos direitos animais.
Em entrevista à jornalista da BBC News, Jane Chambers, Taguide Picanerai, um jovem líder da comunidade indígena Ayoreo, uma das primeiras a habitar o Chaco, a comunidade já está sofrendo os efeitos do desmatamento, porque milhares de árvores foram derrubadas em razão da pecuária.
Cerca de 20% da floresta do Gran Chaco, o equivalente à área do estado de Nova York, foi convertida em terras para pastagem de gado e produção agroindustrial desde 1985, segundo fotografias de satélite da NASA.
“A nova rodovia vai significar mais criação de gado, o que leva a uma grande perda de biodiversidade”, diz Picanerai, acrescentando que também está preocupado com a perda de território dos Ayoreo.
Ele explica que no passado os produtores se mudaram para os territórios ancestrais dos Ayoreo, impediram o acesso à água e restringiram o espaço de caça para as comunidades indígenas.
A vida dos Ayoreo mudou significativamente em apenas uma geração. Os pais de Picanerai viviam na floresta impenetrável, onde caçavam javalis e tartarugas.
A comunidade foi convencida por missionários americanos que vieram para o Paraguai na década de 1960 a abandonar a vida de caçadores, vestir roupas e se estabelecer com outras comunidades indígenas.
E grande parte de suas terras foi vendida a fazendeiros e pecuaristas, o que levou a batalhas legais de anos para recuperar parte dessas terras para que a comunidade pudesse se restabelecer.
“Esse território é vital para nós”, declarou Picanerai.
A ameaça ambiental
O presidente Abdo reconhece que a nova rodovia “aumentará a população no Chaco” e gerará “mais atividade comercial”. Mas ele acredita que, desde que as leis sejam cumpridas, o impacto será positivo.
Ele disse à BBC que já existiam regras rígidas para os proprietários de terras, incluindo uma cláusula que estipulava que “o máximo que as pessoas podem desmatar no Chaco é 50% de seu latifúndio, e menos se a biodiversidade da área for considerada mais delicada”.
Para o ambientalista Miguel Lovera, essas medidas não são suficientes.
“A construção de novas estradas leva a um maior desmatamento e derrubada de florestas em pequenos trechos, o que coloca uma enorme pressão sobre o frágil ecossistema”, disse Lovera, que dirige uma organização que luta pela proteção de grupos indígenas no Chaco.
Por outro lado, para Bianca Orqueda, jovem cantora e compositora do grupo indígena Nivaclé, a estrada tem alguns aspectos positivos.
Orqueda, que dirige uma escola de música infantil na periferia da cidade menonita de Filadelfia, divide seu tempo entre sua comunidade e a capital do Paraguai, Assunção.
E a rodovia a ajudará a encurtar os tempos de viagem.
Ela não está convencida de que seja possível que sua comunidade continue vivendo isolada, acrescentando que os Nivaclé precisam “progresir”, o que para alguns pode significar deixar o Chaco e seu modo de vida para trás.
“Eu digo às crianças que, se quiserem ser médicas, arquitetas, dentistas ou musicistas, terão que sair assim que terminarem a escola e irem para outra cidade.”
“Aqui na Filadélfia não há universidades, não há nada a menos que você queira ir para a agricultura”, disse Orqueda.
Para Picanerai, a conservação do Chaco é mais do que apenas o modo de vida de sua comunidade indígena.
“A rica biodiversidade do Chaco significa que é um problema global que deveria preocupar a todos”, comentou ele, acrescentando que está determinado a proteger sua terra dos recém-chegados que se mudarem para a região após o fim das obras da nova rodovia.
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