Os dados da organização Frente Nacional de Defesa dos Jumentos (@frentedefesajumentos) saltam aos olhos ao reportar que cerca de 90 mil jumentos são mortos e exportados no país por ano. A finalidade principal deste tipo de crueldade animal é para a extração da pele que contém uma substância gelatinosa chamada ejiao.
Ainda segundo a organização, o Brasil, em 2016, começou a fazer parte da rota do comércio chinês, principal país responsável pela compra e produção do ejiao. A substância, segundo a indústria chinesa, pode ter propriedades medicinais para tratamento contra insônia, impotência sexual, entre outros.
Segundo pesquisadores da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (USP), uma consequência desse comércio em cima da vida animal é a possível extinção da espécie dos jumentos.
O levantamento de dados desses pesquisadores indicam que o abate dos jumentos no país aumentou drasticamente para 800% entre os anos de 2015 e 2019.
Adroaldo Zanella, pesquisador da faculdade, relata que o rebanho de jumentos, atualmente, estima-se em torno de 400 mil animais. Ainda segundo ele, em 2018, foram registrados 26 mil mortos, em 2019, 62 mil e em 2020 o número saltou para 98,8 mil.
O abate de jumentos é permitido no Brasil por meio do decreto 9013/2017, além disso, dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) também revelam que espanhóis, italianos e portugueses exportam esses animais cuja finalidade é o consumo de sua carne.
Números que saltam aos olhos
Yuri Fernandes de Lima, advogado em defesa animal e jurista que está a frente da proteção dos jumentos no Brasil, reforça que essa prática de exportação e matança desenfreadas viola a Constituição Federal devido ao fato dos jumentos serem considerados parte do patrimônio histórico-cultural em decorrência da sua biografia na história nordestina.
Além dessa violação ao patrimônio histórico-cultural, há outro crime envolvendo os jumentos, que são os maus-tratos que os animais são submetidos na hora da morte, contrariando assim, o artigo 225 da Carta Magna, implicando em práticas coniventes com o extermínio da espécie.
Segundo o artigo 225, “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
E que no primeiro parágrafo, “Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”.
Segundo informações do portal Vegazeta, cabe acrescentar que os jumentos destinados para consumo são forçadamente capturados nas estradas – que viviam em estado de abandono ou negligência por seus “tutores” – e que são vendidos de forma clandestina para fazendas temporárias – sem condições para abrigar os animais.
Isso gera outro dano ao meio ambiente e à biossegurança, pois a matança irregular dos jumentos provoca disseminação de zoonoses, como a mormo, doença que se instaura nos jumentos e que pode ser transmitida aos humanos.
Apontamentos do pesquisador da USP, Adroaldo Zanella, revela que a maior parte das mortes ocorrem na Bahia e Ceará, e que, segundo a entidade internacional The Donkey Sanctuary, cada jumento é comercializado por um valor que gira em torno de 30 reais.
A ONG Donkey Sanctuary também estima que o mercado internacional compra a pele do jumento em torno de 4 mil dólares e que neste ano de 2021, devido a crescente do comércio ilegal, 77 mil jumentos poderão ser mortos.
Segundo os pesquisadores e entidades, o comércio dos jumentos gera lucro apenas para os grupos empresariais – como os chineses – sem retorno benéfico algum para o Brasil, sobretudo por considerar que a exportação, comercialização e abate desses animais são práticas realizadas de forma ilegal.
De acordo com Patricia Tatemoto, bióloga que representa a The Donkey Sancturary, os grupos que visam o couro do animal para extração do ejiao vieram para o Brasil e outros países da América devido ao trabalho extinto realizado na África, no qual promoviam a morte de outros animais.
Os “extrativistas” do ejiao acabaram sendo banidos de 19 países do continente africano buscando alternativas nas américas para promover e explorar os jumentos nos moldes praticados na África.
Luta pela vida dos jumentos
Devido a esse trágico cenário envolvendo os jumentos, há uma pressão popular da sociedade civil, entidades de proteção animal e colaboradores para levantar um debate necessário junto à Assembleia Legislativa da Bahia (Alba), por meio de audiência pública chamada “Abate dos Jumentos x Saúde Pública“.
A audiência pública foi realizada no dia 17 de novembro deste mês pela Comissão do Meio Ambiente, Seca e Recursos Hídricos em parecia com a Frente Parlamentar em Defesa da Saúde e Instituto de Pesquisas Afins na Bahia.
Para o advogado animalista Yuri, essa pauta e a audiência pública são de extrema importância para disseminar o conhecimento sobre a situação dos jumentos e sua possível extinção.
Espera-se que com esse movimento de luta em defesa dos animais e a exposição dos maus-tratos contra os jumentos, a situação possa ser resolvida com o apoio dos deputados.
Segundo Yuri, há um projeto de lei 22.952/2018 – que tramita na Assembleia Legislativa da Bahia, visando a proibição da morte de jumentos. “Esperamos que haja uma força-tarefa para que agilizem a tramitação deste projeto”, destaca Yuri. Além disso, o advogado ressalta que com base na audiência pública, o governador do estado, Rui Costa (PT) “possa resolver acabar com a situação”, finaliza.
Ainda segundo o portal Vegazeta, a audiência contou com o apoio de parlamentares, de representantes do Centro de Apoio Operacional à Promotorias de Justiça do Meio Ambiente e Urbanismo (Ceama), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), da Agência de Defesa da Agropecuária da Bahia (Adab), do médico especialista em infectologia, Dr. José Roberto Pinho de Andrade Lima, da zootecnista e professora adjunta da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Dra. Chiara Albano, da ONG The Donkey Sanctuary, representada pela bióloga Patricia Tatemoto, da entidade Frente Nacional de Defesa dos Jumentos, representada pela advogada Gislaine Brandão e de juristas como o advogado Yuri Fernandes de Lima.