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Mamífero que bota ovos da Nova Guiné intriga os cientistas

10 de junho de 2009
5 min. de leitura
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Ao se testar no limite mais extremo da tolerância humana, você poderia considerar uma ultra-maratona, ou uma travessia do Atlântico numa canoa, ou ser indicado à Suprema Corte dos Estados Unidos.

Você poderia ainda tentar estudar a equidna de focinho longo, um dos mamíferos mais antigos, raros, tímidos, de aparência mais tola da terra, e mesmo assim, um dos mais iluminados.

Muse Opiang trabalhava como responsável de um campo de pesquisas quando foi dominado por uma paixão pela equidna de focinho longo, ou Zaglossus bartoni, animal encontrado somente nas florestas tropicais da Nova Guiné e espalhado pelas ilhas adjacentes. Ele as havia visto uma ou duas vezes, em cativeiro ou em fotos – criaturas rechonchudas, do tamanho de um terrier, com traços tão misturados de ave, toupeira, porco, tartaruga e escova de limpar botas que, se não fossem reais, ninguém pensaria em inventá-las no Photoshop.

Ele sabia que o efeito mosaico não era simplesmente uma piada visual: um dos três tipos sobreviventes do grupo de mamíferos que põem ovos, chamados de monotremados, as equidnas são, por um lado, uma verdadeira ligação viva entre répteis e pássaros, e por outro, mamíferos de placenta mais familiares, como nós.

Opiang também sabia que, embora membros dos dois outros gêneros monotremados, o ornitorrinco e a equidna de focinho curto, sejam estudados há anos – no último mês de maio, todo o código genético do ornitorrinco foi publicado com grande festa –, a vida da equidna de focinho longo permaneceu obscura e desconhecida.

“Não sabíamos nada sobre o animal”, disse ele numa entrevista por telefone. “Cientistas haviam escrito que ele seria impossível de estudar”, continuou, acrescentando com uma risada, “Levei isso como um desafio”.

Numa recente edição da publicação “The Journal of Mammalogy”, Opiang oferece o primeiro vislumbre da história natural e ecológica de um animal noturno imaculadamente privado com um cérebro surpreendentemente desenvolvido. Embora o relato de Opiang mostre que os céticos estavam tecnicamente errados, os cansativos detalhes de seus métodos de campo sugerem que, como regra do dia a dia, a definição “impossível de estudar” classifica muito bem o Zaglossus.

“Muse tem uma perseverança impressionante”, disse Debra Wright, conselheira da tese de Opiang. “Não creio que qualquer outra pessoa da terra poderia ter feito o que ele fez”.

Missão impossível

Os estudos e pesquisas de Opiang foram inicialmente patrocinados pela Wildlife Conservation Society, do Zoológico do Bronx, mas Opiang, que pronuncia seu primeiro nome “mussei” e hoje trabalha em seu doutorado através da Universidade da Tasmânia, desde então fundou sua própria organização, o Instituto de Pesquisa Biológica Papua Nova Guiné.

Reprodutivamente, os monotremados são como um aparelho de vídeo-cassete e DVD, a personificação de uma tecnologia em transição. Eles põem ovos duros, assim como os répteis, mas alimentam seus filhotes com leite – através de glândulas espalhadas pelo peito, ao invés de mamilos –, algumas vezes tão enriquecido com ferro que parece cor-de-rosa.

A determinação do sexo nos monotremados também tem sua atração. Na maioria dos mamíferos, um único grupo de cromossomos XX significa uma menina, e um grupo XY especifica um menino. Por razões que permanecem misteriosas, monotremados possuem grupos múltiplos de cromossomos sexuais, quatro ou mais pares manifestados de XXs e XYs, ou algo diferente no geral: alguns desses cromossomos extras parecem suspeitosamente do tipo dos pássaros. Outra característica aviária é a cloaca, o orifício único por onde uma equidna ou ornitorrinco defeca, faz sexo e põe ovos, e pelo qual o grupo recebe seu nome. Através do mesmo orifício, um equidna macho retira um pênis de quatro cabeças.

Como quer que o façam, os monotremados conduzem seus assuntos impressionantemente bem. Eles não apenas são o mais antigo grupo mamífero sobrevivente, mas também vivem 50 anos ou mais. A Dra. Peggy Rismiller, da Universidade de Adelaide, estuda a equidna de focinho curto, ou tamanduá espinhento, desde 1988. “Uma das fêmeas que estivemos rastreando, via rádio, desde 1988, tem pelo menos 45 anos, e ainda se reproduz”, disse.

A pesquisadora também apontou que equidnas de focinho curto são os mamíferos de distribuição mais ampla da Austrália, adaptando-se à vida em desertos, ao longo da costa, em florestas tropicais, acima da linha da neve, sempre se alimentando de qualquer invertebrado que consigam desenterrar. Mesmo no verão, elas mantêm sua temperatura interna em torno de 31 graus centígrados. Numa noite de inverno podem cair em torpor, com o termostato corporal podendo chegar a quatro graus – uma habilidade criogênica de grande interesse tanto a cirurgiões quanto a entusiastas espaciais.

As equidnas se mantêm frescas e calmas, com certeza. “Elas são um dos mamíferos mais pacíficos”, disse Rismiller. “Ninguém as incomoda; elas não incomodam ninguém. Poderíamos aprender muito com elas”. Naquela plana cabeça vive um cérebro poderoso. Entre humanos, o neocórtex, que nos permite pensar e lembrar, corresponde a 30% do cérebro; nas equidnas, a proporção é de 50%.

Se ao menos elas pudessem nos ensinar. As equidnas de focinho curto aturam os humanos, ainda que relutantemente, mas conforme Opiang aprendeu, a espécie de focinho longo da Nova Guiné foge de qualquer sinal de habitação humana – talvez porque, tendo o dobro do tamanho da equidna de focinho curto, ela seja apreciada como carne por caçadores locais e seus cachorros. “Elas não são atraídas para iscas”, disse ele. “Você não consegue capturá-las com armadilhas para classificação”.

Para chegar a elas, é preciso caminhar por muitos quilômetros adentro das terras altas, através de perigosas escarpas e terrenos escorregadios, onde chove cerca de 275 polegadas por ano. “É um dos locais mais úmidos da terra”, explicou Wright.

A chuva também apaga sinais de equidnas caçando ou se escondendo. Opiang consumiu meses de pesquisa antes de encontrar sua primeira equidna. Então, descobriu que se seguisse os rastros de buracos recentes à noite – os buracos feitos pelas equidnas com seus focinhos enquanto procuram minhocas –, poderia encontrar uma toca onde um desses animais estaria escondido. Ele aprendeu a pegá-las por debaixo do estômago, onde não há espinhos. “Se você as segurar contra seu corpo, elas ficam amigáveis e não lutam”, disse.

Ao longo de cinco anos, ele conseguiu capturar, medir e, na maior parte das vezes, prender transmissores de rádio, em 22 espécimes. Entre suas intrigantes descobertas iniciais: ao contrário da maioria dos mamíferos, as fêmeas são maiores que os machos, e o focinho tubular, sem pêlos ou dentes, através do qual elas lançam suas compridas línguas, também é mais longo.

Mais uma vez, a equidna coloca diversão em todos os domínios.

Fonte: Natalie Angier Do ‘New York Times’ /G1

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