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DESTRUIÇÃO AMBIENTAL

Mais de 97% do desmatamento no Brasil nos últimos anos é resultado de pressão do agronegócio, aponta estudo

Quatro dos cinco estados mais desmatados em 2024 estão em área de fronteira agrícola

30 de maio de 2025
Carolina Bataier
5 min. de leitura
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Foto: Adriano Gambarini/WWF Brasil

Nos últimos seis anos, as atividades agropecuárias foram responsáveis por mais de 97% do desmatamento no Brasil. Os dados foram extraídos da plataforma MapBiomas, por meio da iniciativa MapBiomas Alerta, que identifica e qualifica pontos de supressão florestal em todo o país. O levantamento indica queda da devastação em todos os biomas brasileiros em 2024.

A fronteira agrícola do Matopiba, que abrange o Tocantins e parte do Maranhão, do Piauí e da Bahia, concentrou 75% do desmatamento do Cerrado e cerca de 42% de toda a perda de vegetação nativa no país no ano passado. Esses números, no entanto, representam uma queda de 40% em relação a 2023.

“O Matopiba pega essa região mais do Cerrado e Caatinga, que é onde está sendo feita, principalmente no Cerrado, essa nova expansão da frente agropecuária”, explica Marcos Rosa, professor da pós-graduação da geografia da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador técnico do MapBiomas.

De 2019 a 2024, o Brasil perdeu uma área de mata nativa equivalente ao tamanho da Coreia do Sul: foram mais de 9 milhões de hectares. Desses, mais de 6 milhões, ou dois terços do total, ficam na Amazônia Legal.

As ações de fiscalização, reforçadas nos últimos anos, apresentaram resultados favoráveis para a floresta tropical. O levantamento do MapBiomas revela a migração dos pontos de desmatamento, da região amazônica para o Cerrado, com concentração na faixa da fronteira agrícola.

Alertas de desmatamento, em vermelho, migraram e passaram a se concentrar no Matopiba. Foto: MapBiomas

“Essa região do Matopiba concentra mais desmatamento do que todo bioma Amazônia”, ressalta Roberta Rocha, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e coordenadora técnica da equipe Cerrado do MapBiomas.

Em 2023, a derrubada da floresta na Amazônia já estava em queda, enquanto no Cerrado a área devastada aumentou em 67%. Agora, mesmo com queda, a região que abriga a fronteira agrícola do Matopiba ainda lidera o ranking de desmatamento, não só na categoria bioma, mas também entre os estados.

Mesmo com redução de 34,3% na área desmatada, o Maranhão lidera, pelo segundo ano consecutivo, a lista das unidades federativas mais desmatados. Mais de 36% de toda a área é ocupada por atividades agropecuárias. Em 2003, as plantações de soja ocupavam cerca de 268 mil hectares. Em 2023, esse monocultivo já domina uma área de mais de 1 milhão de hectares no estado.

Em segundo lugar está o Pará, outro estado onde as plantações de soja avançam e tomam o lugar da floresta. Somado às atividades agropecuárias, o garimpo é um vetor de desmatamento nesse estado, onde está Itaituba, município com a maior área de garimpo do Brasil. Tocantins, Piauí e Bahia aparecem na sequência dos estados líderes de desmatamento em 2024.

As áreas de atividades agropecuárias ocupam cerca de 35% de todo o território do Matopiba. São mais de 15 milhões de hectares de pastagens e quase 5 milhões de hectares de soja, principal atividade agrícola da região.

É possível produzir no campo sem desmatar

O Cerrado concentra 52% de toda a derrubada de mata nativa registrada no Brasil em 2024. A ampla permissão para desmatamento nesse bioma está entre os principais fatores para a devastação.

De acordo com o que estabelece o Código Florestal, os donos de propriedades rurais no Cerrado precisam manter apenas 20% de reserva florestal. Na Amazônia, a reserva legal em propriedades rurais deve ocupar 80% da área total do imóvel.

De acordo com Rosa, o desmatamento em áreas privadas no Brasil ficou concentrado em 0,9% dos imóveis identificadas pelo Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro público, obrigatório e autodeclaratório de propriedades rurais.

“O que a gente está dizendo é 99% dos imóveis registrados no CAR não tiveram o desmatamento em 2024. Mesmo assim, teve aumento da produção agropecuária”, diz. Para ele, esses dados são indicativos de que é possível produzir no campo sem desmatar.

“A gente tem esse setor agropecuário mais moderno que percebeu que o desmatamento afeta a chuva, vai afetar a qualidade do solo, então, que é ruim desmatar”, afirma.

Considerando a meta de zerar o desmatamento até o ano de 2030, estabelecida no âmbito do Acordo de Paris, Rosa avalia que só será possível se o setor do agronegócio tiver representantes alinhados ao segmento que ele define como “mais moderno”.

“Porque esse é um dos problemas. O diálogo é mais difícil porque a gente ainda está com representantes do agro que estão pedindo anistia para os desmatadores, estão pedindo redução das leis de proteção. Mas é possível, sim, a gente continuar com uma meta e perseguir essa meta”, diz.

Embora os números de desmatamento ainda sejam preocupantes, os dados de 2024 trazem algum otimismo: pela primeira vez em seis anos, o Brasil registrou queda no desmatamento em todos os biomas.

Maior desmatamento foi na Caatinga

Pela primeira vez desde o início do monitoramento do MapBiomas, o maior foco único de desmatamento foi registrado no bioma Caatinga. Em três meses, foram derrubados mais de 13 mil hectares em um único móvel rural, no estado do Piauí.

Trata-se de um desmatamento autorizado e destinado à atividade agropecuária, como explica Diego Costa, pesquisador do MapBiomas Caatinga.

“A atividade em si, a gente não consegue identificar. Mas o vetor de pressão apontado pelos analistas foi de que é um uso de agropecuário”, diz. A área fica em uma região de fronteira com o Matopiba.

A proporção da devastação naquele ponto, que representa mais de 13 mil campos de futebol, chama a atenção do pesquisador por fugir do padrão de desmatamento no bioma.

“Na Caatinga (…) os nossos desmatamentos são majoritariamente pequenos. O tamanho médio do alerta de desmatamento no bioma tem aproximadamente 9,8 hectares”. Ele também representa o maior alerta já publicado pela iniciativa MapBiomas Alerta nesses seis anos de projeto.

Fonte: Brasil de Fato

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