A captura de tartarugas marinhas está ameaçando a sobrevivência da espécie. O alerta vem de um estudo realizado entre 1990 e 2008 pela organização não governamental Conservação Internacional (CI), em parceria com universidades norte-americanas. O relatório, divulgado recentemente e intitulado “Padrões globais da pesca acidental de tartarugas marinhas”, mostra que o problema é causado por atividades pesqueiras que utilizam equipamentos como espinhéis, redes e anzóis, que acabam aprisionando outros animais que não são o alvo principal dos barcos.
“O resultado da pesquisa aponta que aproximadamente 85 mil tartarugas marinhas foram capturadas nos últimos 20 anos”, diz Bryan Wallace, autor do estudo. “Com maior frequência, espécies como tubarões, albatrozes e golfinhos, além das tartarugas marinhas, são capturadas”, completa. Esses animais acabam morrendo por ferimentos graves causados pelos anzóis ou por afogamento. “As redes de arrasto e espinhéis, por exemplo, impedem que uma tartaruga vá à superfície para respirar, resultando na sua morte.”
O relatório revelou que a região norte do Mar Adriático, no Mediterrâneo, lidera o ranking das localidades com maior taxa de pesca com redes, enquanto, no Uruguai, está o maior índice de problemas devido ao uso das redes de arrasto. Entretanto, quando as taxas de captura e o volume de pesca (independentemente do tipo de armadilha usada) são comparados, quatro regiões do globo surgem como áreas críticas: o Mediterrâneo, o leste do Pacífico, o sudoeste e o noroeste do Atlântico.
No Mediterrâneo, onde mais de 20 países realizam pescas de espécies como o atum-azul e o peixe-espada, a falta de controle gerou uma das maiores concentrações de pesca com espinhel e redes de arrasto do mundo. Da mesma forma, no leste do Pacífico — que vai da Baixa Califórnia até a Patagônia chilena — a atividade pesqueira causou um colapso na população de algumas variedades de tartarugas marinhas, que têm na região importantes pontos de desova e procriação. A situação no sudoeste e no noroeste do Atlântico também preocupa bastante. As duas áreas abrigam as maiores populações de tartarugas-de-couro do mundo.
O estudo da Conservação Internacional aponta ainda que existem vastas regiões de oceano sobre as quais há poucas informações. Ou seja, o prejuízo ambiental pode ser maior do que o constatado até agora. “Estamos apenas começando a descobrir a realidade da pesca de tartarugas marinhas”, afirma Wallace. A análise da pesquisa revelou também importantes lacunas de dados em regiões onde existem áreas de pesca em pequena escala, especialmente na Ásia, no leste do Oceano Índico e no sudeste da Ásia. “Essas regiões e áreas de pesca são prioridade para um maior monitoramento e esforço de divulgação de informações para que possamos preencher algumas lacunas”, explica o autor do relatório.
Costa brasileira
No Brasil, o problema se concentra no litoral entre Sergipe e Bahia, onde há mais pontos de desova das tartarugas. Guy Marcovaldi, oceanógrafo do Projeto Tamar, explica que a ameaça é fruto principalmente da pesca de lagosta. “A prática nessa região do litoral utiliza redes de arrasto profundas. Elas são altamente perigosas para as tartarugas, que estão na área em busca de alimento e desovando nas praias.”
Diminuir essa mortalidade é o esforço empregado há 20 anos pelo Tamar. O primeiro passo foi preservar áreas de desova. Com isso, o número de animais que nascem e sobrevivem pode igualar essa mortalidade. Porém, não é regra, já que as taxas de animais capturados não são corretas. “Esse é um problema mundial. O número de animais mortos por meio da atividade pesqueira pode passar de milhões, em vez dos milhares colocados no relatório da CI”, avalia Gilberto Sales, analista ambiental e coordenador do Programa Interação Tartarugas Marinhas e Pesca, do Tamar.
Como forma de combater a mortalidade da espécie, o estudo internacional sugere o estabelecimento de regiões de proteção marinha similares às criadas no leste do Pacífico tropical — como a Bird’s Head, na Indonésia, e a Sulu Sulawesi, nas Filipinas e na Indonésia — e na região dos Abrolhos, no Brasil. Outras ações são de esforços focados no monitoramento e na mitigação das atividades de pesca. “Não há uma solução mágica, mas sim ações a longo prazo, que devem ser de esforço global. É preciso primeiro conhecer o fenômeno. Depois, conhecer como são as práticas pesqueiras, como elas são operadas e em quais regiões exatamente ocorrem”, analisa Sales.
Fonte: Correio Braziliense