Os mais de 100 cães que sobreviveram à fome e aos maus-tratos em um abrigo em Borodyanka, ao norte de Kiev, foram impedidos de entrar na Polônia para receber cuidados veterinários por não terem um responsável legal. Os animais suportaram o trauma de ver mais de 300 cães presos em recintos pelo exército russo agonizarem até a morte e comerem uns aos outros. Ativistas que realizaram a operação de resgate ficaram felizes ao encontrar mais de 100 cachorros ainda vivos, mas debilitados, no entanto, agora enfrentam burocracias para salvar a vida dos animais.
A ativista Kate Parker, representante da organização Naturewatch, denunciou o caso no Twitter. “Esses cães estão famintos, traumatizados e agora presos em uma zona de guerra”, lamentou. Ela alerta ainda que não há lugar na Ucrânia para acolher os cães, pois todos os abrigos estão superlotados, sofrem com a falta de suprimentos, estão sem energia elétrica, água e muitos foram atingidos por bombas. A ativista espera que o caso ganhe repercussão para estimular a compaixão das autoridades e abrigos poloneses para receber os cachorros.
Entenda
Mais de 300 cachorros foram encontrados mortos aprisionados nos recintos de um abrigo em Borodyanka, ao norte de Kiev. O local foi tomado por tropas russas há cerca de quatro semanas e todos os ativistas e voluntários que cuidavam dos animais foram expulsos e ameaçados. Os cães morreram em razão da fome e falta de cuidados. Ucranianos só conseguiram retomar a cidade no começo de abril, mas já era tarde demais para os cãozinhos, que agonizaram sozinhos até a morte.
Profundamente tristes, os voluntários do abrigo usaram carrinhos de mão para retirar os cadáveres dos cães e oferecer um enterro digno aos animais. O local abrigava cerca de 500 cães e ainda há animais vivos com a saúde muito fragilizada. Muitos cachorros estão com sinais de mutilação, o que indica que os animais tentaram comer uns aos outros para sobreviver. Imagens registradas no abrigo, mostram ativistas em prantos enquanto olham os cães sem vida.
A equipe do abrigo acredita que as tropas russas trancaram os cães de propósito para que eles morressem, pois se os soltassem, eles teriam a chance de pelo menos tentar sobreviver pelas ruas. “Estes são os animais de Borodyanka e as consequências da guerra. As consequências da completa indiferença e negligência. Os animais ficaram três a quatro semanas sem comida ou água”, disse um represetante do abrigo, que considera o episódio um crime de guerra.
Representes do abrigo de Borodyanka foram criticados por abandonar os animais, mas afirmam que não encontraram uma forma de retirá-los da cidade após a invasão russa. Além de aprisionarem os cães e deixá-los à própria sorte, os soldados russos também estão sendo acusados de atirar em animais em situação de rua em Kiev e até mesmo de comê-los, por estarem sem suprimentos. O Ministério do Interior ucraniano afirma que investigará o caso.
Sofrimento animal
Ucranianos que ainda estão no país relatam que as tropas russas estão matando cães, gatos, coelhos e outros animais para se alimentar porque supostamente estão sem suprimentos. As denúncias não param de crescer e ativistas não sabem o que fazer, pois com a superlotação dos abrigos e o aumento do abandono de animais, que fora deixados para trás por seus tutores que fugiram da Ucrânia, não há como resgatar e acolher todos que estão em situação de vulnerabilidade extrema.
Esses não são os primeiros relatos de crueldade contra animais pelas tropas russas. Bois, vacas e outros animais abandonados em fazenda foram mutilados ainda vivos. Cavalos foram queimados vivos em um celeiro. Abrigos de animais e zoológicos se tornaram alvos de mísseis e bombas e dezenas de animais morreram e outras centenas ficaram feridos. Enquanto crimes de guerra são cometidos contra esses seres indefesos, ONGs lutam para salvar e proteger animais.
Traumas e sofrimento
A ativista ucraniana Orest Zalypskyy gerencia o “Home for Rescued Animals”, em Lviv. Ela atua há muitos anos resgatando animais domésticos ou domesticados, como cães, gatos e coelhos, mas com a invasão russa, o abrigo também se tornou lar de animais que eram explorados para consumo, como porcos e bodes, e até mesmo para espécies silvestres, como corujas e um lobo, encontrado ferido vagando em uma zona de risco.
Ela conta que apesar de muitas fotografias mostrarem tutores fugindo em meio à neve por caminhos tortuosos na companhia dos seus animais, há um grande volume de pessoas abandonando seus cães, gatos e outros animais em abrigos, mesmo sabendo que esses locais podem ser alvos de bombardeios. A ativista alerta que além da falta de suprimentos e da superlotação, os animais estão apresentando sinais claros de sofrimento emocional.
Além da dor do abandono, os animais sofrem com o estresse, o medo e muitos traumas. Muitos estão se recusando a comer, estão introspectivos e têm medo de seres humanos. Há cães que uivam e choram a maior parte do dia. Zalypskyy calcula que cerca de 1.500 animais foram abandonados no abrigo nos últimos 30 dias. Muitos voluntários do “Home for Rescued Animals” estão visitando estações de trem e metrô para resgatar animais deixados para trás.
Animais idosos, que viveram toda a vida ao lado dos seus tutores, estão profundamente deprimidos e apáticos. Outros estão agressivos e não deixam ninguém se aproximar. Agora, a ativista se concentra em encontrar acomodações adequadas para os animais. Cerca de 200 cães foram adotados pelos moradores de Lviv. Muitos animais estão sendo levados por voluntários para a Alemanha, Letônia, Lituânia e Polônia.