‘Se os animais tivessem uma religião, o homem seria o diabo’, o dito popular parece um tanto quanto forte para quem lê de forma solta, mas é só dar uma voltinha pelo CRAS (Centro de Reabilitação de Animais Silvestres) para concluir que cada palavra faz sentido. Por lá estão em recuperação animais silvestres que sofreram os mais diversos maus-tratos. Alguns morrem, mas após tratamento adequado para cada caso retornam à natureza.
Entre as histórias escabrosas que chegam diariamente está a do macaco-prego-de-papo-amarelo resgatado pela PMA (Polícia Militar Ambiental) no fim do ano em Amambai. Após denúncia anônima, os policiais encontraram o animal preso por corda amarrada no pescoço para que não fugisse da residência.
Quando não estava desse jeito, ficava preso em gaiola de metal de mais ou menos um metro quadrado e devido a isso acabou magro, com pelo e coloração opacas e muito sujo. Para mantê-lo vivo era oferecida comida humana, sendo que até churrasco chegou a fazer parte do cardápio. O ideal para a espécie é se alimentar de frutas, ovos e carne crua.
O sargento que atendeu a ocorrência, Aparecido dos Santos, contou que o homem que mantinha o macaquinho em tal situação confirmou que o abrigava desde quando era pequeno e, portanto, além de perdê-lo, foi multado em R$ 500 e autuado pelo crime cometido.
Manso devido ao convívio com humanos, o pequeno está em recuperação no Cras e convive com mais dois de sua espécie. “Mas ele chegou aqui magro, estressado e com medo. Com lesões típicas de um animal silvestre domesticado em cativeiro. Tinha marcas de cordas nas patas também”, contou o biólogo Allyson Favero, 39 anos, e que faz parte da equipe do centro há três.
Além dele, outro biólogo, quatro veterinários, cinco tratadores e um zootecnista cuidam dos bichinhos. Outro caso que chamou atenção quando chegou ao local foi o de dois papagaios. Ambos foram apreendidos em cativeiro, têm as asas cortadas para não voar e foram ensinados a falar o nome Rafael, única pista sobre quem fez tamanha maldade com eles.
Por causa do histórico, as aves são agressivas e não podem conviver com outros animais. Nem mesmo da própria espécie. “Mesmo assim tudo que a gente puder fazer para reabilitá-los, nós faremos”, disse Allyson.
Na lista também está um jabuti que, de tão domesticado, chegou condicionado ao Cras. Comportamento atípico para a espécie, ele se aproxima com facilidade de humanos. “Ele deveria se esconder dentro do casco”, observa o biólogo. Mas nenhum dos casos citados marcou mais o biólogo do que um tamanduá que chegou com ferimentos causados por pauladas e facão.
“Tinha cortes no braço e marcas de pauladas. Foi muito marcante, demorou quase um mês e ele morreu. Chegou do interior e foi uma violência gratuita”, recorda-se. A coordenadora do Cras, Aline Duarte, explica que, quando chegam, os animais passam por atendimento veterinário e depois ficam em quarentena para observação.
“Depois seguem para um recinto maior, as aves para desenvolverem a musculatura para voo, e também para perder as características que aprenderam com os humanos, como o caso dos papagaios que falam”.
Já outros, como macacos, por exemplo, precisam formar bandos para serem soltos. Todo o processo vai depender do desenvolvimento individual de cada animal, pode demorar meses ou anos. “Hoje temos em torno de 50 animais que entraram nessa situação (de maus-tratos), temos uma boa taxa de reabilitação para esses casos. A maioria poderá retornar à natureza”.
De acordo com os profissionais, o maior erro cometido por quem encontra um animal silvestre é querer tocá-lo. Só pode fazer o manejo quem tem preparo para isso. Vale ressaltar que o Cras não é aberto à visitação, o foco é a reabilitação. Além dos “pacientes” já citados, estão internados no centro: uma anta, seis onças pardas, duas jaguatiricas e um tamanduá-bandeira, entre outros.
Fonte e Imagens: Campo Grande News