O cachorro Deca teve sorte. Foi adotado no quinto dia em que estava no canil do Centro de Controle de Zoonose de Brasília. Metade do prazo estipulado pelo órgão. Se em mais cinco dias ninguém gostasse dele, certamente o cão da raça Schnauzer morreria. Isso porque, até agora, o processo funciona assim: após serem deixados no abrigo coletivo, cães e gatos saudáveis ou doentes têm um tempo estipulado de dez dias para a adoção. Depois, são sacrificados. Mas isso pode mudar. Pelo menos no que depender de um advogado de Brasília, que tem se empenhado em redesenhar a sorte desses animais.
A luta de Cristiano Finazzi Palhares Ferreira começou ao ler uma reportagem do Correio publicada em janeiro deste ano sobre o sacrifício de animais que ultrapassam esse prazo. “A matéria me deixou revoltado”, desabafou. “Sempre gostei muito de animais e não conseguia entender por que os cães deveriam ser sacrificados. Resolvi pesquisar e achei diversas opiniões falando que é ilegal matar animais saudáveis. O sacrifício pode ser enquadrado como crime ambiental, e cabe ao Ministério Publico do Distrito Federal e Territórios mudar essa conduta”, complementa o advogado.
A pesquisa e o trabalho de Finazzi renderam bons resultados. Em seis meses, 3.480 pessoas com opiniões contrárias à morte dos bichinhos assinaram um abaixo-assinado. Todos os nomes devem chegar ao MPDFT nesta sexta-feira, pelas mãos de Finazzi. O documento vai ser anexado ao requerimento de abertura de inquérito civil com a justificativa de que “o extermínio sistemático de animais adotado atualmente pelo Governo do Distrito Federal é irracional, cruel e indigno da condição de seres humanos”, conforme consta no texto.
A iniciativa de proteger os bichos teve tanta receptividade que, das 3,4 mil assinaturas, 3 mil foram obtidas por representantes de uma única organização não governamental, a Salvando Vidas: Protetores Independentes de Brasília (SVPI). “O papel da Zoonose é a prevenção de doenças e não matança de animais sadios. Em outros lugares isso é proibido, mas em Brasília ainda existe”, explica uma das ativistas, que adota mais de 60 animais entre gatos e cães em um lar temporário e prefere não se identificar. Para cuidar dos bichos, ela organiza rifas, almoços vegetarianos beneficentes e bazares, além de contar com doações.
Um lar para Deca
A casinha de madeira em Planaltina espera por Deca (aparentemente, o nome é feminino, mas trata-se de um cão macho). Adotado na tarde dessa quinta-feira pelo casal Marcos Figueiredo Leão, 28 anos, e Daiane Silva dos Santos, 19, o cãozinho só não vai ser levado direto para o novo lar porque está com um machucado no olho esquerdo — motivo pelo qual sua antiga dona o abandonou. “Ele precisa em primeiro lugar de um veterinário; depois, de uma casa”, conta o novo dono do cão de raça Schnauzer. Deca veio de Riacho Fundo II.
Na ficha, não havia informações sobre a idade do animal. Mas os novos donos nem se importaram com isso. “Vamos cuidar dele, tratar do olho. Ele estava com carinha de que precisava de um dono”, comenta Marcos Leão. A casinha reservada para Deca era de um pit bull, que morreu de velhice há cerca de quatro meses. “Desde então pensava em ter outro cão”, conta Marcos. A esposa dele já se acostumou com a ideia de ter um cachorro. “Na casa de minha mãe a gente tinha cão. Vai ser legal”, conta a estudante, que se casou há oito meses.
Ao sair do canil, Deca foi vacinado com antirrábica. O sangue dele foi coletado para fazer um exame de leishmaniose. O resultado sai em 10 dias. Em breve, o casal pode voltar à Zoonose para pegá-lo. Se o resultado do exame for positivo, eles devem devolver o cão para ser sacrificado. De acordo com a zootecnista do centro de controle, Kátia Helena Azevedo, este ano nenhum animal sadio precisou ir para o sacrifício. “A procura está maior que a quantidade de animais”, explica.
Nessa quinta, apenas Deca estava disponível para adoção. Um rottweiler que atende pelo nome de Raica, um labrador chamado Quitana, a gata Chuchu e seus três filhotinhos e outro gato mestiço encontrado na rua estão reservados para adoção. Outros 16 animais que se encontravam no local não podem ser adotados ou porque estão doentes ou porque agrediram donos ou vizinhos.
Na fila para adoção
A rottweiler Raica foi deixada na Zoonose na última sexta-feira. Ela tem 10 meses e morava em Sobradinho. Os donos tinham outros cães e alegaram à Zoonose que Raica estava com ciúmes dos outros animais. Ela está vacinada e já tem pretendentes.
A labrador Quitana tem oito meses e foi abandonada à Zoonose às 11h55 dessa quinta. Os donos teriam dito que iriam se mudar para outra casa e não poderiam mais manter o animal. Ela já está vacinada. Uma pessoa deixou telefone e quer levá-la para casa assim que sair o resultado dos exames.
A gata branca Chuchu veio de Ceilândia na semana passada com três filhotes. Ela é de raça mestiça e espera por adoção. Os filhotes têm três meses e também são candidatos a um novo lar.
Uma gata mestiça, sem nome, foi encontrada na rua e deixada na Zoonose para receber cuidados. Ela é malhada em tons de preto, marrom e branco e já está vacinada.
Fonte: Uai