O falcão peneireiro das torres é uma ave de rapina pequena, mas que conseguiu paralisar as operações de um grande parque eólico no sul da França. A justiça francesa acaba de condenar as operadoras da usina pela morte de milhares de pássaros e aves, inclusive espécies ameaçadas.
É a primeira vez que os gestores de um parque eólico são condenados em um processo penal, depois que ao menos 160 pássaros, morcegos e falcões desta espécie, protegida na França, morreram ao se chocarem contras hélices das turbinas eólicas, na cidade de Aumelas.
A companhia EDF Renouvelables e nove filiais foram sentenciadas a pesadas multas, que chegam a € 2,5 milhões, e a cessar as atividades de 31 eólicas por quatro meses, com efeito imediato em abril. É neste mês que se inicia o período de migração dos bandos da África até a Europa, onde os animais procriam da primavera até o fim do verão.
O processo foi movido por iniciativa da organização France Nature Environnement. Em um relatório sobre o assunto, a Liga de Proteção dos Pássaros (LPO) afirma que uma turbina mata em média sete animais voadores por ano – só na França, 10 mil eólicas estão em operação, o que significa que a mortalidade dos pássaros e aves se tornou um problema ambiental para o setor.
Geoffroy Marx, autor do estudo, explica que os falcões são particularmente vulneráveis: eles se acostumaram a voar em volta das turbinas para buscar alimento. “Em geral, toda a área em volta das eólicas é limpa e os pequenos mamíferos que circulam no solo ficam bastante visíveis. Isso é muito prático para as aves de rapina caçarem”, complementa.
Hélices ‘invisíveis’ para os pássaros
Os falcões não conseguem diferenciar bem as pás das turbinas das nuvens do céu – as estruturas são pintadas de branco justamente para se camuflarem melhor no ambiente e causarem menos impacto visual aos humanos que habitam nos arredores. “Os pássaros detectam mal o contraste. As eólicas se diferenciam muito pouco do céu, na visão do pássaro”, diz. “Alguns pesquisadores defendem que ao menos uma das pás seja pintada de preto, mas ainda não se tem provas de que isso funcionaria. Por enquanto, é uma hipótese de solução.”
As eólicas são equipadas com um sistema de detecção de voadores, mas segundo Marx, os aparelhos não funcionam adequadamente: a resposta da máquina é lenta demais em relação à velocidade dos pássaros no ar. “Em geral, são câmeras que detectam a aproximação dos pássaros e acionam um sinal acústico para afastá-los, ou levam à paralisação das máquinas. Porém, infelizmente, o que vemos hoje é que o sistema não é muito eficaz”, lamenta o pesquisador.
Riscos à biodiversidade e comunidades
A energia eólica é uma das chaves da transição para fontes limpas, mas a sua instalação também têm sido alvo de críticas pelos danos à biodiversidade, conforme o local onde as usinas são instaladas. A militante sueca Greta Thunberg já promoveu protestos contra a construção de uma usina eólica nas montanhas da Noruega.
No Brasil, indígenas, pequenos agricultores e comunidades locais promovem regularmente manifestações contra a multiplicação de centrais no nordeste do país.
O caso francês ilustra as contradições entre a proteção da natureza e a necessária transição energética, fundamental para combater a crise climática, salienta Geoffroy Marx. “Temos que encontrar um compromisso, afinal será necessário liberar espaços para produzir a energia que precisaremos todos amanhã. Vai ser preciso conciliar os dois”, indica.
Fonte: Terra