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ALTA MORTALIDADE

Já chega a 45 o número de araras-azuis-de-lear eletrocutadas em 2025; espécie está em risco de extinção

11 de novembro de 2025
Suzana Camargo
4 min. de leitura
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Foto: Projeto Jardins da Arara de Lear

O ano de 2025 ainda não acabou e o número de araras-azuis-de-lear (Anodorhynchus leari) mortas eletrocutadas já chega a 45 na região do Raso da Catarina, na Bahia, o maior habitat da espécie, endêmica do Brasil, e classificada como ameaçada de extinção. Se mais mortes forem registradas até o final de dezembro, será grande a chance de que se supere o recorde de 2022, quando foram 46 óbitos – o maior desde que o Projeto Jardins da Arara de Lear, começou a documentar a tragédia em 2008.

Nos últimos dezessete anos, 184 araras-azuis-de-lear morreram após levarem choques na rede de energia, operada pela Companhia de Eletricidade da Bahia (Coelba), que pertence à Neoenergia, parte do grupo espanhol Iberdrola, e responsável pela expansão da rede elétrica no interior da Bahia, por meio do programa do governo federal “Luz para todos.”

Para reduzir a mortalidade das aves, são necessárias modificações nos postes, que incluem a inversão e o reposicionamento de isoladores elétricos, assim como o aumento da distância entre os fios e uso de cabeamento multiplexado (fios traçados e revestidos), que tendem a diminuir as chances de choques.

O Conexão Planeta entrou em contato com a Neoenergia Coelba, que enviou uma nota como resposta aos nossos questionamentos, e afirmou que “Desde 2020 foram alteradas mais de 5 mil estruturas da rede elétrica para um padrão construtivo que permite pouso seguro das aves, com maior distanciamento da fiação e alteração no posicionamento dos isoladores – que são equipamentos instalados na rede elétrica para impedir o fluxo de corrente elétrica, evitando o choque. As modificações seguem em andamento.”

Além disso, a empresa declarou que “a rede elétrica existente no Raso da Catarina foi implantada há décadas. Os casos passaram a ser identificados apenas nos últimos anos, em paralelo ao avanço do desmatamento e à consequente redução das áreas de ocorrência do licuri, principal alimento da arara-azul-de-lear, evidenciando que os impactos à espécie estão associados a fatores ambientais mais amplos, e não fomentados pela distribuidora.

Buscamos esclarecimentos adicionais com a Neoenergia após o envio da resposta, como por exemplo, quantas estruturas elétricas exatamente existem no Raso da Catarina e quantas ainda precisam de alteração. Também perguntamos se o que a empresa está alegando é que as araras mortas por choques elétricos são vítimas de “fatores ambientais mais amplos”.

Até o momento, ainda não obtivemos retorno desses demais questionamentos.

Segundo o mais recente censo da arara-azul-de-lear, realizado em 2024, a população beira 2.500 indivíduos (em 1990, restavam apenas entre 60 e 200 aves). O Raso da Catarina, situado entre os municípios de Paulo Afonso, Rodelas e Jeremoabo, abriga 90% dessas aves em vida livre.

Além das mortes por choques elétricos, a espécie enfrenta ainda a perda de habitat e o tráfico ilegal de animais silvestres.

Qualquer morte é uma perda enorme para espécie ameaçada

Em 1o de outubro, quando registrou a morte da 180a arara-azul-de-lear desde 2008, o Projeto Jardins da Arara de Lear, que tem sede em Canudos, usou suas redes sociais para denunciar, mais uma vez, o que acontece na Caatinga baiana.

“Esse número não mostra toda a tragédia. Sabemos que existem outras mortes que não chegaram a ser registradas. A cada nova perda, fica evidente: essas mortes poderiam ser evitadas. A arara encontrada hoje morreu em um poste de energia já modificado, mas sem os ajustes necessários após a instalação”, diz a organização. “A empresa responsável tem se mostrado preocupada em discurso, mas lenta e ineficiente na prática. Pior: tenta transferir à população o dever da educação ambiental, quando, na verdade, é graças às comunidades locais que a espécie ainda resiste. São essas pessoas que vêem, cuidam e defendem seu patrimônio natural — a Arara de Lear, a Arara da Caatinga.”

Foto: Projeto Jardins da Arara de Lear

Em agosto, um estudo identificou quais seriam as áreas prioritárias para reduzir as mortes das araras por eletrocussão. Essas aves, explicam pesquisadores, fazem longos voos diariamente e podem percorrer até 80 km, em busca de alimento. No final da tarde, elas sempre voltam aos seus dormitórios. Nessas idas e vindas, costumam repousar em árvores, arbustos e.… redes elétricas.

Para os autores do estudo, publicado no jornal internacional Applied Ecology, a troca de 10% dos postes de maior risco evitaria 80% das mortes.

“O principal objetivo do estudo foi apontar áreas prioritárias para mitigação, onde podem ser feitas alterações nos postes e evitar novas mortes e potenciais interrupções no fornecimento de energia. Nossas estimativas apontam um bom custo-benefício tanto para a empresa fornecedora quanto para a conservação da espécie”, afirmou Larissa Biasotto, chefe de ciência da organização BirdLife International e primeira autora do estudo, em entrevista à Agência Fapesp de Notícias.

Ela ressalta que uma das inovações do trabalho foi não usar a área de distribuição da espécie como um todo, mas a área de atividade, onde a probabilidade de eletroplessão é maior. “São nesses locais que elas passam a maior parte do dia, se alimentando, interagindo entre si e se empoleirando em postes e fios de média tensão. Por serem mais altos do que a vegetação nativa, esses pontos oferecem uma visão privilegiada do território”, diz a pesquisadora.

Fonte: Conexão Planeta

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