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Investigação revela bastidores do comércio de animais em pet shops

27 de novembro de 2010
6 min. de leitura
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Por Adriane R.O. Grey (da Redação – Austrália)

Foto: Reprodução/ Animal Liberation

Há dois lados no debate nacional sobre a venda de animais de estimação em pet shops: o dos abolicionistas e o da indústria que luta para desmentir a acusação de que o melhor amigo do homem tenha se tornado uma mercadoria descartável.

Durante 3 meses, a ativista da Libertação Animal [Animal Liberation], Jacqueline Dalziell, trabalhou disfarçada em uma pet shop pertencente a uma das mais conhecidas franquias nacionais de lojas de animais, em um dos bairros de classe média alta de Sydney, Austrália. Os dados de sua investigação resultaram em uma edição do programa Today Tonight do canal 7 que foi ao ar em novembro.

Jacqueline Dalziell infiltrou-se como funcionária da loja para registrar as verdadeiras condições em que vivem os animais de estimação comercializados por petshops. Com uma coragem gerada somente pela compaixão e pelo desejo de mudança, a ativista testemunhou pessoalmente, com pesar, dia após dia, o sofrimento destes seres, trabalhando na própria indústria que deseja revolucionar.

“Eu observei muitas brechas em quase todas as páginas do Código de Prática do Bem Estar Animal. Todos dia havia animais sofrendo dos mais variados tipos de problemas de saúde, incluindo parvovirose, tosse canina, rinotraqueíte felina, vômitos, diarréia, sangue nas fezes, vermes, piolhos”, afirmou Jacqueline.

Foto: Reprodução/Animal Liberation

“Pet shops são um negócio, existem somente para fazer dinheiro. Não existem para cuidar de animais, nem para ajudar a achar bons lares e adotantes para eles. Elas existem pelo lucro.” Não é por acaso que muitas lojas localizam-se em movimentados shopping centers com os filhotes expostos constantemente em aquários de vidro nas vitrines.

A cada turno trabalhado, a ativista levava consigo uma câmera escondida para registrar o cotidiano das petshops.

Os animais ainda bebês são confinados permantemente em aquários pequenos, de onde muitas vezes não saem por semanas. Durante o dia ficam sob iluminação exagerada e muito barulho, além de serem constantemente cercados de crianças excitadas e descontroladas. Durante a noite, os filhotes são deixados sozinhos no escuro.

Os animais expostos nas pets deveriam exercitar-se pelo menos 20 minutos por dia. Jacqueline afirma nunca ter visto isto acontecer em nenhum dos turnos que trabalhou. Somente quando havia movimento na loja é que os filhotes eram retirados do aquário e colocados em um chiqueirinho para  brincar, com o intuito de impressionar os clientes e induzi-los à compra de um animalzinho.

“Testemunhei animais sofrendo continuamente como resultado do confinamento em gaiolas pequenas, cheias e sujas. Frequentemente vi animais apresentando comportamentos estereotipados ou sintomáticos de estresse psicológico.”

“À maioria dos filhotes não são dados os aspectos mais básicos de cuidado, tais como limpeza, higiene e ambientes seguros. Muitas vezes testemunhei animais doentes e negligenciados terem tratamento veterinário negado, quando este era claramente necessário”, afirma Jacqueline. Além de tudo, a ativista era proibida de jogar comida fora, mesmo se essa estivesse vencida ou contaminada e, se apontasse problemas de saúde nos filhotes, era orientada a ignorá-los. Se os clientes indagassem sobre algum animal prostrado, deveria responder que era apenas cansaço causado por excesso de brincadeiras.

Jacqueline afirmou ainda que 2 ou 3 vezes por semana uma entrega de até 4 filhotes era feita na loja. Nunca, nem como funcionária da petshop, a ativista conseguiu uma resposta clara a respeito de sua origem. Só lhe diziam que os animais vinham de criadores locais confiáveis. Jacqueline, no entanto, suspeita que eles vinham de fazendas de criação.

Muitos animais são entregues em condições de saúde insatisfatórias, informação que não é dada aos compradores.

As pet shops insistem em continuar vendendo filhotes porque os clientes não levam apenas o animal de estimação consigo, mas compram camas, roupinhas, potes, pratos e toda uma série de acessórios que faz a venda estender-se até 1 ou 2 mil dólares.

Há leis que regulamentam a operação de pet shops na Austrália. A presença de crianças não é permitida em petshops e deveria haver um período de adaptação de 3 dias para os animais que chegam nas lojas começarem a ser expostos. Porém, a fiscalização praticamente se restringe a estabelecimentos cadastrados na Associação da Indústria Pet da Austrália [Pet Industry Association of Australia, PIAA].

O diretor da associação, Bob Croucher, admite que há empresários descuidados e mercenários, mas alega que a saída não é banir os animais das lojas. Apenas uma pequena percentagem de estabelecimentos é inscrita na associação, explica, e afirma que a solução seria que as pessoas comprassem animais apenas de petshops creditadas pela PIAA.

“Todos buscamos a mesma coisa, todos queremos o bem estar dos animais. Agora, se eles (os ativistas) não estivessem lutando contra nós e se sentassem e trabalhassem conosco, poderíamos alcançar algo.”

O senhor Croucher não entende que os ativistas querem os animais livres da exploração da indústria pet porque acreditam no simples conceito de que seres vivos não são mercadoria (muito menos mercadoria descartável) e que usá-los como tal é eticamente errado.

A prefeita de Sydney e representante da cidade na Assembléia Legislativa de Nova Gales do Sul, Clover Moore, já tentou 2 vezes aprovar projetos de lei que tornariam mais restritas a legislação que contempla os animais de estimação. “Eu não quero que nossas lojas vendam animais vivos”, ela afirma.

E acrescenta, “no momento temos filhotes fofinhos em petshops sendo adquiridos por impulso para depois encararmos a realidade chocante de seu abandono como resultado. E eu acho que esta é uma situação terrível e será uma grande falta do governo e nossa, como comunidade, se deixarmos isso seguir acontecendo”.

Com a venda de filhotes superando 1 milhão e 200 mil dólares ao ano, a indústria pet tem dinheiro e poder político. Muito provavelmente por isso, pouquíssimo tem sido feito até agora na Austrália contra seus procedimentos, apesar das inúmeras tentativas dos grupos de proteção animal.

“Se você quer um animal, sugiro que salve uma vida indo a um abrigo. Vá a um CCZ e salve um animal que, embora seja saudável, será morto, ao invés de ir a uma petshop e alimentar uma indústria brutal como esta”, apela Jacqueline Dalziell.

Mais de meio milhão de animais serão vendidos no ano de 2010 na Austrália. Metade deste número será morta em CCZs ou clínicas veterinárias, especialmente depois do Natal, período com grande registro de vendas de filhotes.

Animais devem ser vistos e tratados com compromisso, como uma companhia e um membro da família e não como mercadorias, presentes ou brinquedos a serem descartados, quando deixam de interessar aos “tutores”.

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