Em 2023, um albatroz-de-nariz-amarelo (Thalassarche chlororhynchos) foi encontrado debilitado e com os pés amarrados por fragmentos de um balão meteorológico em Arraial do Cabo (RJ). Ele foi levado a um centro de reabilitação onde, infelizmente, teve que ser eutanasiado devido aos danos irreversíveis causados pela interação com o equipamento usado para coletar dados climáticos.
A ocorrência está longe de ser um caso isolado e ilustra uma grave ameaça que tem vitimado aves marinhas no Brasil. Uma pesquisa conduzida pelo Projeto Albatroz revela que a interação entre balões meteorológicos e aves oceânicas, especialmente albatrozes, uma das mais fascinantes mas também uma das mais ameaçadas, tem se mostrado fatal.
Em um estudo realizado entre 2022 e 2023, e compartilhado com Um Só Planeta, os pesquisadores documentaram sete incidentes, incluindo a morte de cinco albatrozes encontrados em praias de Santa Catarina, todos emaranhados em fragmentos de balões e radiossondas. Esses balões, usados para monitorar condições atmosféricas, são lançados diariamente em todo o mundo, com cerca de 65% a 70% dos dispositivos caindo no oceano.
Impacto invisível e crescente
Embora os balões meteorológicos desempenhem um papel crucial na coleta de dados climáticos, sua presença no ambiente marinho pode representar um risco para a fauna oceânica. “Os resíduos desses balões podem levar as aves a ficarem presas, enfraquecidas ou até morrerem por infecção, exaustão ou afogamento”, explica Caio Azevedo Marques, coordenador do Projeto de Monitoramento de Praias realizado pelo Instituto Albatroz na Região dos Lagos.
Essas interações, além de se mostrarem fatais para as aves marinhas, ainda representam um risco indireto, com fragmentos de balões sendo ingeridos por animais marinhos, causando obstrução do trato digestivo.
Soluções à vista
Para mitigar esse problema, o estudo sugere algumas ações. Uma delas é a substituição dos materiais utilizados na fabricação dos balões e sondas meteorológicas, como plásticos, por alternativas biodegradáveis. “É crucial que a fabricação desses equipamentos incorpore materiais que se decomponham sem causar danos ao meio ambiente marinho”, afirma Daphne Wrobel Goldberg, veterinária do Projeto Albatroz e autora do estudo. Além disso, a implementação de protocolos mais eficazes para a recuperação dos balões após o lançamento poderia reduzir significativamente o impacto ambiental.
O estudo alerta que é essencial que os países, órgãos meteorológicos e indústrias envolvidas na fabricação e lançamento desses equipamentos considerem alternativas que não coloquem em risco a vida marinha. Como explica Caio Azevedo Marques, “quando falamos de conservação das aves marinhas, precisamos olhar para o impacto cumulativo das diversas atividades humanas no oceano”.
Para Daphne, enquanto a tecnologia avança para melhorar nossas previsões climáticas, é imperativo que também avancemos na preservação dos ecossistemas marinhos e das espécies que dependem deles. “As radiossondas desempenham um papel fundamental na meteorologia moderna, oferecendo dados precisos e em tempo real que são indispensáveis. A transição para componentes que se desintegram naturalmente e de forma inofensiva no ambiente marinho pode mitigar o impacto ecológico adverso, protegendo espécies marinhas e promovendo a sustentabilidade ambiental”, diz.
Ave ameaçada
A União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) classifica muitas espécies de albatroz como ameaçadas, com algumas delas em risco crítico de extinção. A principal causa dessa ameaça é a captura incidental nas frotas pesqueiras, especialmente as que utilizam espinhel – uma prática de pesca que utiliza longas linhas com anzóis, em que os albatrozes, ao tentar pegar os peixes, acabam se enroscando e se afogando. Estima-se que cerca de 30 a 40 mil albatrozes sejam mortos dessa forma a cada ano em todo o mundo.
Além da captura incidental, os albatrozes também são afetados por outros fatores, como as mudanças climáticas — alterações nas correntes oceânicas e na temperatura da água impactam diretamente as fontes de alimento dos albatrozes, principalmente peixes e lulas — e a poluição marinha, em especial o lixo plástico.
Patrocinado pela Petrobras, o Projeto Albatroz, uma das principais iniciativas de conservação dessas aves no Brasil, tem sido fundamental na redução da captura incidental e na promoção de soluções para a preservação desses animais. Desde 1990, a organização vem trabalhando para sensibilizar e implementar medidas de conservação nas pescarias e proteger as áreas de reprodução dos albatrozes, além de estimular o desenvolvimento de tecnologias mais sustentáveis.
Fonte: Um Só Planeta