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INTOLERÂNCIA

Indústria que explora animais para consumo se sente ameaçada por produtos veganos

14 de novembro de 2021
Vanessa Santos | Redação ANDA
4 min. de leitura
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Foto: Ilustração | Pixabay

A discussão sobre a rotulagem de alimentos livres de ingredientes de origem animal cresce diariamente com o aumento de um mercado consumidor mais consciente e preocupado com o sofrimento dos animais e o meio ambiente. O debate ganhou um novo episódio na última semana, quando a Associação Brasileira das Indústrias de Pescados (ABIPESCA) entrou com um processo contra a Agência de Vigilância Sanitária (ANVISA) e o Governo Federal exigindo a alteração dos nomes de produtos de base vegetal que simulem proteínas de origem animal.

O presidente da ABIPESCA, Eduardo Lobo Naslavsky, em uma demonstração de intolerância e ignorância em relação ao poder de escolha e inteligência dos consumidores, afirma que precisa existir regulamentação da nomenclatura dos produtos livres de crueldade animal. “A gente quer que isso seja regulamentado para que volte para a gôndola: ‘planta processada com sabor artificial de’, e aí pode vender o que for. Eu sou consumidor também. Mas a gente não pode deixar que a população seja induzida ao erro”, disse em entrevista ao Globo Rural.

Para Ricardo Laurino, presidente da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), esse processo é sintomático do temor da indústria que explora animais para consumo sente e de uma mudança no mercado alimentício, que está mais atento. “Estamos assistindo o início, ainda que tardio, de um consumidor que não compra apenas por sua tradição, mas que leva em conta outros aspectos que vão muito além do que o produto em si representa. Apesar de ser um fenômeno novo no Brasil, isso já vem acontecendo em várias partes do mundo”, disse em entrevista à ANDA.

A ABIPESCA não é a primeira instituição a questionar a rotulagem de produtos à base de vegetais. O PL 10556/2018, de autoria da atual ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS), está em votação na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS) e apresenta tópicos como o 1° inciso que diz que “a palavra ‘leite’ fica exclusivamente reservada à secreção mamária das fêmeas mamíferas, proveniente de uma ou mais ordenha”. Existe um movimento de protecionismo daqueles que lucram com a exploração animal.

A ação da ABIPESCA não impacta apenas marcas veganas e produtos artesanais, ela afeta também a Marfrig e a JBS, empresas do ramo pecuário que estão investindo em produtos vegetarianos estritos para maximizar os lucros, o que evidencia o reconhecimento que o veganismo está ganhando na sociedade e nos consumidores.

A bióloga, ativista e consultora de Meio Ambiente e Sustentabilidade da ANDA, Dra. Paula Brügger, repudia a intolerância aos alimentos sem ingredientes de origem animal. “Esse tipo de ação é descabida, porque leite de coco e leite de aveia, por exemplo, são termos que existem desde muito antes de o movimento vegano ganhar força e ninguém reclamava. Obviamente eles estão sentindo o aumento das pessoas que consomem produtos veganos. Mas é importante dizer que a maioria desse público não faz essa escolha pelos animais ou por qualquer outra questão ética. Muitas pessoas procuram esses produtos pensando unicamente na sua saúde”, pontua.

Outra questão levantada por Brügger é que não se pode ignorar o discernimento político dos consumidores e questiona o interesse de empresas como a  Marfrig e a JBS nesse mercado. “Eles não querem ficar para trás, estão vendo ali um nicho de mercado. Mas para eles é só um nicho de mercado. É uma questão unicamente de ordem econômica, não existe a menor preocupação com os animais. Eu, particularmente, não gosto de imitação de carne. Prefiro comida que já nasceu vegana”, completa a bióloga.

O biólogo e doutor em Bioética Frank Alarcón vê a ação como um boicote às alternativas livres de crueldade. “Todos os envolvidos na comercialização de mercadoria de origem animal vão começar a fazer esse movimento de tentar distanciar os produtos veganos dos produtos animais. Eles querem que cada produto tenha a sua prateleira, para que na hora da compra o consumidor não seja tentado a experimentar e eventualmente gostar e se tornar fiel a um produto vegano“, alerta.

Felizmente, estamos diante de uma forte e necessária mudança nas estruturas de consumo, na qual as pessoas estão mais atentas a origem dos produtos e que estão cada vez mais conscientes sobre as mudanças climáticas e os direitos animais.

Nota da Redação: é de extrema relevância que produtos que se proponham a desmitificar a riqueza de uma alimentação livre de crueldade animal tenham destaque e espaço no mercado. No entanto, é importante refletir que o veganismo não é apenas uma dieta, mas é acima de tudo uma postura política que preza pela ética e respeito à todas as formas de vida.

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