Uma importante espécie de peixe da bacia do rio Jaguaribe, no Ceará, pode ter sido extinta devido às alterações causadas por ações humanas. A espécie é o Salminus hilarii Valenciennes, 1850, família Bryconidae, ordem Characiformes, conhecida popularmente como tubarana, jatubarana ou tabarana.
A Salminus hilarii foi descrita da bacia do rio São Francisco, mas ocorre também, naturalmente, nas bacias do alto Paraná e do Jaguaribe.
É um peixe de porte médio, com tamanho máximo de 50 centímetros, podendo pesar por volta de 2,5 quilos, representando um dos maiores peixes nativos do Ceará – o que o tornava popular e bastante apreciado como recurso pesqueiro comercial.
O declínio da espécie e sua possível extinção
O rio Jaguaribe, considerado maior rio temporário do mundo, está localizado sob o domínio da Caatinga do estado do Ceará, na região entre as grandes bacias dos rios São Francisco e Parnaíba (ecorregião hidrográfica Nordeste Médio-Oriental).
No Jaguaribe, a jatubarana já foi uma das espécies mais abundantes na pesca do estado em meados da década de 1940. Entre 1943 e 1947, por exemplo, foram capturados cerca de 3.700 indivíduos. No entanto, atualmente, não há mais registro desse peixe no estado.
Estudos conduzidos por mim, que coordeno o Instituto Peixes da Caatinga e sou pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba (PPGCB/UFPB), têm alertado as autoridades do Ceará que a jatubarana do estado, se não já foi extinta, corre grande risco de extinção. São necessárias pesquisas direcionadas para procurar e conservar essa importante espécie no Estado.
Desde 2019, percorremos o Jaguaribe para avaliar os possíveis impactos da transposição do São Francisco, fazendo coleta de peixes e outros grupos, e nunca coletamos jatubarana. Ao procurar dados sobre essa espécie, em conversas informais com pescadores e ribeirinhos, as informações que obtivemos foi que faz cerca de 20 anos que não pescam mais a espécie. Também nos chamou a atenção que apenas os pescadores mais velhos conhecem a jatubarana da bacia do Jaguaribe e afirmaram que era uma espécie relativamente abundante nas áreas de corredeiras do rio, no passado, e que hoje não pescam mais. Os pescadores mais jovens falaram não conhecer esse peixe.
No alto São Francisco, nos estados de Minas Gerais e Bahia, Salminus hilarii ainda é relativamente comum de ser encontrada. Por esse e outros motivos, não é listada como ameaçada de extinção nas listas de espécies nacional e internacional, onde seu status de conservação se encontra como “menos preocupante” (LC).
Barragens no rio Jaguaribe podem ser causa da extinção
Salminus hilarii é uma espécie carnívora (se alimenta de outros peixes), reofílica, ou seja, necessita migrar para reprodução, que se dá nas porções mais altas das bacias. Ela é indicadora de integridade ambiental, pois exige uma alta qualidade do ambiente para sobreviver – geralmente é encontrada em água limpa e de corredeira ou cachoeira, ricas em oxigênio, vivendo em cardumes. Nas outras bacias em que é encontrada, é muito apreciada na pesca esportiva onde é conhecida como “dourado-branco” (devido às suas escamas prateadas) e, muitas vezes, é confundida com o verdadeiro “dourado”, o Salminus brasiliensis (Cuvier, 1816).
Como é uma espécie migradora, certamente, a população da jatubarana do rio Jaguaribe foi afetada pelas barragens construídas ao longo da bacia, que impedem que a espécie suba os rios para desovar. Além disso, a preferência por trechos fluviais de alta qualidade ambiental torna a espécie especialmente suscetível a extinção local por ações antrópicas.
Restando apenas dados do passado, com evidências de que a espécie era abundante, e atualmente a população caiu acentuadamente, sem novos registros, na avaliação das espécies de peixes continentais ameaçados de extinção do estado do Ceará (em elaboração), Salminus hilarii deve entrar como “Criticamente Ameaçada de Extinção (CR)”, o grau mais alto de ameaça.
Fonte: Fauna News