O fim de um relacionamento pode provocar adversidades ao casal e aos familiares envolvidos, inclusive aos animais do lar, visto que eles interpretam, em alguma medida, as emoções humanas e podem apresentar comportamentos alterados em momentos de crise. Por isso, decisões relacionadas à sua guarda têm grande peso e devem ser tomadas com responsabilidade. Quanto aos gastos financeiros, cabe aos tutores dialogarem de forma a garantir a manutenção dos cuidados com os animais e evitar problemas futuros.
Tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, o processo que discute o compartilhamento de despesas com o animal após o fim do casamento, semelhante ao que se conhece como pensão alimentícia. Neste caso, o casal adquiriu dois animais durante a constância da união estável e, ao término, uma das partes ingressou com uma ação que exige a divisão dos custos com alimentação e cuidados indispensáveis.
Atualmente, o julgamento está suspenso, mas na instância originária, a autora já conseguiu indenização de R$ 20 mil dos custos passados e o pagamento de R$ 500 mensais para o cuidado com os animais. Embora a decisão que será proferida só tenha validade para as partes, ela poderá ser usada como precedente para situações similares, acredita a especialista em direito civil da Advocacia Riedel Raíssa Moreira.
Corre em caráter conclusivo o Projeto de Lei 4375/21, que altera o Código Civil e o Código de Processo Civil para prever que animais poderão ser de guarda unilateral ou compartilhada. O texto em análise na Câmara dos Deputados trata, ainda, da obrigação das partes de contribuir para a manutenção dos animais. “Em caso de consenso entre os tutores, o acordo poderá ser feito de forma extrajudicial (em cartório), tornando-o muito mais célere”, destaca Moreira.
Como adaptar o animal à nova realidade?
Para além das decisões formais, prezar pelo bem-estar dos animais perpassa atitudes que adequem sua rotina às novidades do lar. Considerar a guarda compartilhada, por exemplo, precisa ir além dos interesses humanos. Outro ponto válido é deixar as conversas mais ríspidas e emotivas para ambientes afastados de seus animais, como recomenda o médico veterinário Edilberto Martinez, especialista em comportamento animal.
Ademais, se porventura o animal passar a conviver em dois lares diferentes, convém atentar-se às seguintes orientações: os ambientes devem estar providos de enriquecimento ambiental e social, devem conter locais de descanso adequados, de preferência levar a mesma caminha em vez de duas diferentes, e alimentos similares. É interessante usar a mesma marca de tapete higiênico, no caso de cães, ou de areia e caixa sanitária no caso dos gatos.
Já os brinquedos são importantes para permitirem que eles manifestem qualquer tipo de ansiedade e expressem o comportamento esperado para a espécie em questão. A prática de exercícios físicos diários como passeios deve manter-se e, de preferência, nos mesmos horários. O primordial é passar tempo de qualidade com os amigos de quatro patas e tornar o convívio em cada casa amistoso.
“Nem sempre os animais, principalmente os gatos, se adaptarão a trocas de residências, seja por um hiper apego a uma pessoa específica, seja pelas mudanças na rotina”, explica Martinez. Por isso, é necessário observar seus comportamentos. Alguns sinais que acendem alertas são: perda do interesse por brinquedos ou brincadeiras; apetite alterado, caracterizando um quadro de ansiedade severa, e atitudes repetitivas como mordedura ou lambedura na mesma região do corpo.
Certos animais podem ficar inseguros e apresentar esquivamento, medo e agressividade. Também podem ocorrer vocalizações excessivas sem motivo aparente e destruição de ambiente como mordedura e arranhadura de mobílias da casa. Por fim, vale lembrar que, quando o ex-casal possui mais de um animal e ambos se relacionam bem, não é aconselhável separá-los durante a guarda compartilhada, dado que a presença de um traz segurança e estabilidade para o outro, mesmo quando são de espécies diferentes.
“Na convivência entre tutor e animal só haverá harmonia se os dois estiverem bem, sendo necessário, em algumas situações, que uma das pessoas abra mão do convívio do seu animal, por mais difícil que isso seja”, finaliza o veterinário.
Despesas e responsabilidades divididas
Quando a atriz Tainá Cary e sua ex-esposa adotaram o gato Flow e a cachorra Fumaça, ainda casadas, a conversa surgiu abertamente: em caso de separação, o gato ficaria com Marina e a cadela, com ela. Não contavam, porém, que os animais ficariam tão amigos, fato que impossibilitou o cumprimento dos planos quando o relacionamento acabou.
Ambos ficaram com Tainá por uma questão de estabilidade e conforto, mas as visitas da outra tutora são semanais e as despesas, com ração, areia, consultas, remédios e vacinas, divididas. O mesmo vale para as responsabilidades, como limpar a caixa de areia do Flow, levar a Fumaça pra passear, cortar as unhas dos dois, entre outras tarefas. Um dos maiores medos era que os animais não a reconhecessem mais como tutora, o que não aconteceu; há amor e respeito da mesma forma.
“Essa semana, por exemplo, o Flow ficou internado e, veja só, dividimos também a preocupação. Um dia eu fiquei com ele no hospital, no outro, ela. Marina comprou a ração específica que ele precisava na recuperação, eu, os remédios. Quando foi liberado sob as condições de continuarmos o tratamento em casa, ela dormiu aqui todas as noites para acordarmos juntas de duas em duas horas para medicá-lo e extrairmos a urina da bexiga com a seringa”, conta.
Quanto à adaptação, a atriz lembra que Flow lidou muito bem, enquanto Fumaça levou mais tempo para processar as mudanças. Muito agitada e dependente, a SRD manifestou comportamentos que não tinha antes, como tentar comer portas e partes das paredes. Foi necessário paciência e atenção. Hoje, já habituados à nova rotina, os animais estão bem e mantêm-se carinhosos e companheiros com Tainá e Marina.
Fonte: Correio Braziliense