Enquanto o Governo do Estado do Paraná anuncia a objetificação e aquisição de 93 cães para reforçar as operações de segurança pública, com um investimento de R$ 5,5 milhões, surge um debate urgente sobre a ética da exploração de animais em atividades de alto risco. A medida, que inclui a compra de 78 cães já treinados e 15 filhotes para adestramento específico, ignora os perigos e o sofrimento a que esses animais são submetidos, muitas vezes resultando em ferimentos, sequestros e até mortes.
O governador Carlos Massa Ratinho Junior justificou a compra como um “complemento ao trabalho dos policiais”, destacando a eficiência dos cães em operações como combate ao tráfico de drogas, resgate de vítimas de desastres e fiscalizações. No entanto, o que não foi mencionado são os riscos que esses animais enfrentam diariamente. Casos de cães baleados, sequestrados por criminosos ou mortos em operações são frequentes, mas raramente ganham destaque. A vida desses animais é tratada como descartável, enquanto são explorados como ferramentas de trabalho.
A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) defende a medida, alegando que os cães são “peças fundamentais” para aumentar a segurança e atuar em situações de emergência. O secretário Hudson Leôncio Teixeira citou exemplos de como os cães ajudaram em operações de resgate no Rio Grande do Sul e em recordes de apreensão de drogas. No entanto, essa narrativa omite o custo físico e emocional imposto aos animais, que são treinados para situações extremas e expostos a ambientes hostis sem qualquer escolha.
A prática de utilizar cães em operações policiais e de resgate não é nova, mas a forma como são tratados é profundamente questionável. Muitos desses animais passam a maior parte de suas vidas confinados em canis, longe de um ambiente familiar e afetivo. Apesar de o governo estudar a adoção do modelo K9, inspirado nas polícias dos Estados Unidos, onde cães moram com seus condutores, isso não resolve o cerne do problema: a exploração de seres sencientes em atividades perigosas.
Além disso, a seleção de raças específicas, como pastores alemães, labradores e beagles, reforça a ideia de que esses animais são meros instrumentos, escolhidos por suas características físicas e não por seu bem-estar. O treinamento, que inclui exposição a estímulos estressantes como estampidos e trilhas de petiscos, é uma forma de condicionamento que ignora as necessidades emocionais dos cães.
Enquanto o governo celebra a “eficiência” desses animais, é preciso questionar até que ponto essa prática é justificável. A vida de um cão não pode ser reduzida a uma ferramenta de trabalho descartável. Casos de cães feridos ou mortos em operações são um lembrete sombrio dos riscos que enfrentam. Em 2021, por exemplo, um cão da Polícia Militar de São Paulo foi baleado durante uma operação contra o tráfico. Em outro caso, um cão de resgate foi sequestrado por criminosos e nunca mais foi encontrado. Esses episódios revelam a crueldade por trás dessa exploração.
A sociedade precisa refletir sobre o uso de animais em atividades perigosas e exigir alternativas éticas. O avanço tecnológico, como drones e robôs, poderia substituir os cães em muitas dessas operações, reduzindo o sofrimento animal. Enquanto isso, a prática de utilizar cães como ferramentas de segurança continua a ser uma mancha no avanço civilizatório, mostrando que, em pleno século XXI, ainda há muito a ser feito para garantir o respeito e a dignidade dos animais.