O governo das Astúrias, região no norte da Espanha, autorizou que lobos sejam mortos em 174 caças que serão realizadas entre 11 de outubro e 31 de dezembro deste ano. A decisão, anunciada pelo Ministro de Assuntos Rurais, Marcelino Marcos, é um retrocesso na proteção da biodiversidade ibérica e uma narrativa que culpa os animais por problemas criados pela pecuária.
Sob a justificativa de “gerir a espécie” após sua retirada da Lista de Espécies Selvagens em Regime de Proteção Especial (Lespre), o plano asturiano autoriza a “extração”, um eufemismo para morte, de até 53 lobos em áreas específicas. O governo alega que a medida, baseada em “critérios técnicos”, visa reduzir a morte de bois destinados à pecuária e é complementada por ajudas para cercas e cães de guarda. No entanto, ao incluir a caça como método de controle, o Executivo asturiano optou pela via mais fácil e letal, sem nem cogitar a coexistência.
A fala do diretor Marcelino Marcos na Assembleia Geral mostra a visão antropocêntrica que baseia a autorização. “Falar do lobo nas Astúrias é falar da pecuária extensiva, da economia de centenas de famílias”, afirmou. Esta narrativa reduz um ser senciente, parte fundamental do ecossistema, a um mero empecilho econômico. Ele ignora que o lobo é um património natural vivo, com direito inerente à existência, não um recurso a ser “gerido” até a extinção local para conveniência humana.
A decisão cria um perigoso precedente. Enquanto outras províncias impõem condições restritivas e taxas altas para a caça de lobos, as Astúrias abrem as portas para a matança indiscriminada e disfarçada, onde os animais podem ser mortos “sem querer” em caçadas que já são, por si só, uma violência contra a vida selvagem.
A pecuária extensiva, por definição, coloca animais domesticados em território de predadores. A solução não é erradicar os animais nativos, mas sim investir maciçamente e implementar com rigor as medidas de prevenção não letais que o próprio governo enumera e depois negligencia, como cercas perimetrais eficazes, pastores elétricos e manejo adaptativo dos bois.
A autorização do abate de lobos nas Astúrias não é sobre equilíbrio ou coexistência, é sobre a rendição ao lobby da caça e a setores pecuários que se recusam a se adaptar a práticas modernas e menos violentas. É a legalização de um extermínio que simplifica um problema complexo com tiros.
Transformar os lobos em alvos de rifle porque os pecuaristas não protegem os animais que exploram é uma falha moral gravíssima. O governo das Astúrias, longe de ser um gestor do ambiente, tornou-se um cúmplice na aniquilação de um património natural insubstituível, enviando a mensagem clara de que, na visão distorcida do poder, a vida selvagem vale menos do que a conveniência econômica.