Muitos turistas talvez considerassem divertido estar próximo de K2. O golfinho-nariz-de-garrafa era um animal enérgico de 11 anos, um jovem adulto em anos de golfinho, que nasceu no cassino The Mirage, em Las Vegas, Estados Unidos, e viveu toda a sua vida aprisionado lá.
Os visitantes às vezes pagavam até US$ 450 para ter breves interações na água com ele e outros golfinhos. Seus treinadores disseram que ele frequentemente emitia sons e fazia as pessoas sorrirem.
Mas no início deste mês, K2 começou a mostrar sinais de doença. Ele não queria mais comer. O exame de sangue mostrou que as enzimas hepáticas estavam altas e as imagens internas levaram ao tratamento de doenças respiratórias. Sua equipe de atendimento administrou antifúngicos, antibióticos e tratamentos respiratórios por nebulização.
No entanto, K2 morreu em 24 de setembro, marcando a terceira morte de golfinho no Mirage nos últimos seis meses. Maverick, um golfinho de 19 anos, morreu no início de setembro após tratamento para uma infecção pulmonar. E Bella, 13, morreu em abril após ser tratada de gastroenterite.
“É um número excepcional de mortes em um período tão curto”, diz Naomi Rose, cientista de mamíferos marinhos do Animal Welfare Institute, sem fins lucrativos, em Washington, DC. Todos os três golfinhos estavam no “apogeu da vida”, comenta. A expectativa de vida média geral do golfinho-nariz-de-garrafa é de 20 a 30 anos, com uma vida útil máxima de 65.
A exposição de animais do Mirage, que é operada pela MGM Resorts International, fechou temporariamente para que especialistas independentes possam investigar as mortes. As vendas de ingressos foram pausadas até 9 de outubro.
“Estamos trabalhando com a National Marine Mammal Foundation para realizar uma revisão e avaliação completas de todos os aspectos de nosso programa de cuidados com golfinhos”, disse Dave Blasko, diretor executivo de cuidados com animais do The Mirage, em comunicado à National Geographic. Os especialistas examinarão os cuidados veterinários da instalação; criação e comportamento animal; qualidade da água e filtragem e o meio ambiente em geral, explica ele.
Sete golfinhos-nariz-de-garrafa vivos permanecem na exposição, juntamente com quatro leopardos, dois leões, oito tigres, uma preguiça de dois dedos, uma cacatua guarda-chuva e aproximadamente 350 peixes de aquário.
Um histórico de mortes
O Mirage Secret Garden e o Dolphin Habitat têm um longo histórico de mortes de golfinhos: K2 foi o 16º golfinho a morrer na instalação, em sua história de 31 anos, incluindo as duas mortes este mês, de acordo com cetabase.org, um banco de dados sem fins lucrativos que rastreia mamíferos marinhos em cativeiro. Os golfinhos, uma mistura de animais selvagens e nascidos em cativeiro, morreram de múltiplas causas, como pneumonia, “pancreatite necrosante crônica grave” e insuficiência cardíaca relacionada à idade. (Blasko diz que uma das mortes ocorreu quando um golfinho não estava sob seus cuidados e outro era um recém-nascido que morreu após 14 dias.)
Blasko não compartilhou registros médicos de K2, Maverick e Bella com a National Geographic. Mas Rose, a cientista de mamíferos marinhos, diz que um grande problema com os golfinhos do Mirage é que os animais são expostos ao clima extremamente quente de Las Vegas.
Uma reclamação comum entre os defensores do bem-estar animal é que a exposição totalmente ao ar livre não oferece sombra adequada para os golfinhos do Mirage. Além disso, as condições nas piscinas não podem imitar as da natureza, onde os golfinhos podem mergulhar fundo na água longe do calor, nadar grandes distâncias e viver em grupos sociais complexos, ela explica.
De acordo com Blasko, os animais do Mirage são bem cuidados, com exames veterinários semanais e inspeções sanitárias diárias. As quatro piscinas interconectadas da instalação, que variam de 4 a 7 metros de profundidade, são mantidas durante todo o ano a 25 ºC, ele explica, e os animais também são protegidos do sol por palmeiras ao redor, alguns guarda-sóis e edifícios próximos, que podem gerar pequenas sombras, dependendo da hora do dia.
O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, durante as inspeções de rotina das instalações para manuseio, cuidado e tratamento humanitário dos animais, não relatou nenhum dano causado pelo sol na pele ou nos olhos dos animais, observa ele. A agência também não relatou nenhum outro problema de bem-estar animal – inclusive durante sua inspeção mais recente, que ocorreu apenas dois dias antes da morte de K2.
Um futuro sombrio
As mortes do Mirage ocorrem em um momento em que alguns países da Europa e outros lugares estão proibindo cada vez mais o cativeiro e o entretenimento de cetáceos. Em 2019, o Canadá proibiu o comércio, posse, captura e criação de todos os cetáceos para entretenimento, com os defensores da lei afirmando que é antiético e cruel manter esses animais altamente inteligentes e sociais em tanques. Nos EUA, no entanto, os programas de golfinhos continuam a ser populares – com 446 golfinhos-nariz-de-garrafa vivendo em cativeiro, de acordo com o Inventário Nacional de Mamíferos Marinhos.
O futuro para os animais do Mirage permanece obscuro. No final de 2021, a MGM anunciou que havia fechado um acordo com a Hard Rock International – conhecida por sua rede de Hard Rock Cafes – para transferir a propriedade do The Mirage por US$ 1,075 bilhão. Mas o acordo ainda não foi fechado, e a Hard Rock não declarou o que planeja fazer com os animais do local ou como os protegeria durante os futuros trabalhos de construção planejados. (A porta-voz da Hard Rock, Gina Cadahia, quando contatada pela National Geographic, se recusou a comentar sobre os planos futuros da empresa.)
Defensores locais do bem-estar animal, como Linda Faso, propuseram que os golfinhos restantes do Mirage fossem enviados para um santuário. Richard O’Barry, fundador e diretor do Dolphin Project, com sede na Califórnia, e treinador de golfinhos da série de televisão dos anos 1960, Flipper, também está pressionando por isso.
“Nem todos os golfinhos em cativeiro podem ser libertados, mas todos os golfinhos em cativeiro podem ser realocados para um santuário para viver [suas] vidas com qualidade e dignidade”, acredita O’Barry. “É isso que gostaríamos de ver acontecer com os golfinhos do cassino que vivem no deserto de Las Vegas.”
Fonte: National Geographic