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Golfinhos em Fortaleza (CE) moram na Enseada do Mucuripe e estão ‘em perigo’ de extinção

A região abriga cerca de 60 animais e precisa de atenção para manter a vida da espécie marinha

9 de setembro de 2024
Lucas Falconery
6 min. de leitura
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Foto: Cinthya Leite/Aquasis

Na Enseada do Mucuripe, em Fortaleza, uma espécie de animal marinho encanta olhares toda vez que dá um tchibum na água: o boto-cinza (sotalia guianensis), ou simplesmente, golfinho. A espécie está presente em todo o litoral cearense, sendo considerada “em perigo” de extinção no Estado, e exige certa distância para a preservação.

Enxergar os golfinhos pode ser algo mais fácil com a reinauguração da Ponte dos Ingleses, que aconteceu na última semana, onde há uma torre de observação para o mar. Foi lá que, recentemente, uma equipe do Diário do Nordeste conseguiu ver os animais durante uma manhã e onde um grupo de pesquisadores, na década de 1990, criou a ONG Aquasis.

O boto-cinza vive por volta de 30 anos e a população permanece na mesma região onde se alimenta e reproduz. A estimativa dos pesquisadores é de que cerca de 60 animais vivam na Enseada do Mucuripe. Por lá, o melhor momento para flagrar os golfinhos é no início da manhã, entre 5h e 7h ou entre 8h e 10h.

Na publicação “Avistagens de boto-cinza (sotalia guianensis) na Enseada do Mucuripe”, produzida para os Encontros Universitários da Universidade Federal do Ceará (UFC), há uma lista dos pontos onde é mais fácil ver os golfinhos em Fortaleza: Beira MarPraia de Iracema e Píer do Marina Park Hotel.

O estudo é da bióloga Maria Vitória Rocha Alves e do professor universitário Vicente Vieira Faria. Para a elaboração, foi feito um esforço de visualização de 60 horas, registros fotográficos e um levantamento bibliográfico.

A análise foi feita em cinco pontos ao todo, mas deles não foram vistos golfinhos na Praia do Náutico e o Porto do Mucuripe não tem livre circulação. O tempo de efetiva permanência do boto-cinza por sessão de amostragem, por ponto fixo, variou entre cinco e 47 minutos.

No Ceará, existem outras espécies de golfinhos, mas o boto-cinza é mais fácil de ver porque eles vivem em águas rasas. Essa espécie é uma das menores, chegando até dois metros quando adulta. A alimentação é basicamente dos peixes da região.

“Já avistamos bastantes grupos com filhotes entre eles – o que é um bom sinal de que estão se reproduzindo. Eles saem para ensinar os filhotes a pescar”, resume Cinthya Leite, bióloga e técnica de resgate e reabilitação de mamíferos da Aquasis.

Aí, inclusive, está mais uma curiosidade: os golfinhos usam a estrutura dos espigões para encurralar as presas e se alimentar. Por isso, também dá para ver os animais em locais como o Espigão da Rui Barbosa.

A bióloga Maria Vitória, uma das autoras do estudo que envolveu observação, explica que é possível ver os animais até durante as tardes e mesmo no período noturno, mesmo sendo uma raridade. O nascer do dia, contudo, é o período de maior movimentação.

“Quem quer observar boto, no turno da manhã eles são mais sociáveis, no período de forrageamento, que é a alimentação. Isso normalmente é feito em grupo, porque a taxa de sucesso é maior”, frisa.

Como os golfinhos vivem de forma fixa na região, não há um melhor período do ano para ver o fluxo deles. “Os espigões são lugares ótimos da gente observar durante o ano inteiro. Os golfinhos não percorrem grandes distâncias no mar, como fazem as baleias jubartes”, completa.

Os botos também são considerados sentinelas do ambiente, porque são sensíveis à qualidade da água e o comportamento da espécie reflete isso.

“Têm um papel super importante como bioindicador, já que é sensível às mudanças no ambiente. Como está no topo da cadeia alimentar, sua presença é essencial para monitorar e conservar os ecossistemas costeiros”, reforça Cinthya.

Os golfinhos, por sinal, são considerados Patrimônio Natural de Fortaleza desde a aprovação da Lei nº 9.949, de 2012, que também instituiu o Dia 8 de Junho como o Dia do Boto-Cinza. A legislação também indica que o Poder Público Municipal e a coletividade devem promover:

  1. A proteção dos botos-cinza, evitando ou coibindo atividades que possam causar danos aos mesmos e/ou ao seu habitat;
  2. A divulgação, em publicações promocionais de turismo, do status de patrimônio natural, conferido a esses animais;
  3. A articulação com entidades científicas e conservacionistas, visando ao estudo dos botos e à conscientização popular para a sua preservação;
  4. O monitoramento ambiental da região de ocorrência dos botos-cinza, evitando e/ou minimizando sua poluição.

Ameaças aos golfinhos

O boto-cinza é uma espécie na categoria “vulnerável” em relação à extinção no Brasil, conforme a Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçada de Extinção. No Ceará, o status de conservação está “em perigo”, conforme levantamento feito pela Secretaria do Meio Ambiente e Mudança Climática (Sema).

“As populações de Sotalia guianensis que vivem em áreas costeiras muito habitadas, com bastante turismo ou onde tem muita indústria e portos, estão mais em risco, por causa da degradação ou perda do habitat”, acrescenta Cinthya.

Para a especialista, a principal ameaça aos golfinhos é o lançamento irregular de esgoto no mar, que causam “aqueles trechos como impróprios para banho, como também os resíduos sólidos, o microplástico e artefatos de pesca”, completa.

Em 30 anos, a Aquasis atendeu 747 encalhes de boto-cinza. Para a organização, a maior causa de encalhe da espécie no Ceará está relacionada à captura acidental em rede de pesca.

Outro prejuízo para a dinâmica dos bichinhos são os ruídos causados por motores de embarcações. Além disso, interações de banhistas ou pessoas que fazem esportes náuticos também podem ser danosos.

“As pessoas têm de entender que se os animais estão naquela área precisam se atentar para não se aproximar, porque pode acabar afugentando eles que utilizam bastante a área dos espigões para cercar as presas.” – Cinthya Leite, bióloga

A recomendação também é reforçada pela bióloga Maria Vitória. “A gente tem a imagem dos filmes de ter contato com os golfinhos e abraçar, mas não é isso. Se você tiver sorte, ele pode até dar um salto na sua frente, são animais simpáticos e curiosos, mas que precisam de distância”, conclui.

A Aquasis elaborou uma lista com as principais orientações para garantir a proteção da espécie e minimizar os riscos associados às interações humanas:

  • Respeite o habitat natural: mantenha uma distância segura do animal para não causar estresse ou interferir no comportamento natural.
  • Minimize a poluição sonora: use motores de barcos silenciosos e reduza a velocidade perto dos botos para evitar desorientação
  • Não alimente os animais: isso pode alterar seus padrões de caça, causar problemas de saúde e aumentar a dependência dos humanos
  • Evite a poluição: não jogue lixo no mar porque a poluição, especialmente plásticos, é uma grande ameaça aos cetáceos.
  • Apoie e participe de programas de conservação: contribua para organizações que trabalham na conservação dos botos-cinza. O voluntariado e as doações são essenciais.
  • Respeito aos pesquisadores: siga as orientações dos pesquisadores em campo, pois eles são essenciais para a coleta de dados e estratégias de proteção. Informe avistamentos ou comportamentos incomuns a organizações de pesquisa para ajudar na conservação dos botos-cinza. Telefone da Aquasis: (85) 9 9800-0109.

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