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PESCA

Golfinhos do Atlântico Norte vivem 7 anos menos do que no resto do mundo

Pesquisadores identificam queda na longevidade das fêmeas de golfinho-comum no Atlântico Norte, e alertam que a pesca intensiva pode estar comprometendo o equilíbrio dos ecossistemas marinhos

16 de outubro de 2025
Arthur Almeida
6 min. de leitura
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Foto: Wikimedia Commons

Um novo estudo feito por pesquisadores Universidade do Colorado em Boulder, nos Estados Unidos, sugere que os golfinhos-comuns (Delphinus delphis) da região do Golfo da Biscaia, no Oceano Atlântico Norte, próximo da costa da França, estão morrendo cerca de sete anos mais cedo do que esperado. Ao comparar dados de 1997 e 2019, concluiu-se que a longevidade média das fêmeas da espécie caiu de 24 para 17 anos.

Segundo os especialistas, essa redução drástica compromete o equilíbrio populacional e ameaça todo o ecossistema marinho local, o qual é conhecido por sua vasta biodiversidade. Eles sugerem também que tal fenômeno pode ser um alerta de que algo ainda mais grave está acontecendo nas águas europeias. Detalhes da pesquisa foram publicados no dia 10 de outubro na revista Conservation Letters.

Estudos anteriores citados no trabalho mais recente indicam que quase 7 mil golfinhos morreram presos em redes de pesca em 2021, de uma população estimada em 180 mil indivíduos no inverno. Apesar dos números alarmantes, até recentemente os levantamentos oficiais sugeriam estabilidade populacional.

Rouby e sua equipe questionaram esses métodos. Tradicionalmente, o monitoramento se baseia em contagens feitas a partir de navios e aviões – uma técnica que os autores afirmam mascarar declínios lentos e graduais. Como os golfinhos são animais de vida longa e baixa taxa reprodutiva, uma perda significativa pode levar anos até aparecer nas estatísticas.

Dentes que contam a história

Para entender o que estava realmente acontecendo, os pesquisadores recorreram a uma fonte inesperada: os golfinhos encalhados nas praias francesas. Ao examinar os dentes desses animais, foi possível determinar suas idades e construir uma linha do tempo da mortalidade

A análise revelou um declínio de 2,4% na taxa de crescimento populacional entre 1997 e 2019. Em condições saudáveis, uma população de golfinhos-comuns cresce cerca de 4% ao ano. Mas agora, o crescimento é de apenas 1,6%, o que indica que, se a tendência persistir, o número total de indivíduos pode começar a cair, em um sinal inequívoco de colapso demográfico.

“Os números provavelmente serão menores na realidade”, explica Rouby. “Se essa tendência continuar, a taxa de crescimento pode cair abaixo de zero, o que significa declínio populacional.”

Medidas de proteção ainda tímidas

Desde 2024, o governo francês passou a proibir a pesca no Golfo da Biscaia durante o mês de janeiro, na tentativa de reduzir as capturas acidentais. A medida parece ter trazido algum alívio, mas os investigadores acreditam que restrições mais flexíveis e adaptadas às condições sazonais seriam mais eficazes.

“A depender das condições do oceano, os golfinhos podem chegar à baía mais cedo ou mais tarde do que em janeiro”, explica Rouby. “Sincronizar as restrições de pesca com a presença dos animais protegeria melhor a espécie.”

“Há uma necessidade urgente de gerenciar melhor a população de golfinhos-comuns”, alerta o biólogo Étienne Rouby, pesquisador de pós-doutorado no Instituto de Pesquisa Ártica e Alpina (INSTAAR) e coautor do projeto, em comunicado à imprensa. “Caso contrário, corre-se grande risco de declínio e, em última instância, de extinção.”

Um mar que mata

Com águas ricas em nutrientes e abundantes cardumes de sardinhas e anchovas, o Golfo da Biscaia é um habitat estratégico para golfinhos no inverno. Mas também é um dos principais pontos de pesca da Europa. Embora esses cetáceos não sejam caçados diretamente, muitos acabam vítimas da “captura acidental”, quando ficam presos em redes destinadas a outros peixes.

Outros cetáceos do Atlântico Norte, como a toninha-comum (Phocoena phocoena) e o golfinho-roaz (Tursiops truncatus), podem estar enfrentando declínios semelhantes. Isso levanta preocupações sobre a saúde de todo o sistema marinho da região.

Por isso, a equipe sugere que políticas internacionais incorporem métodos mais sensíveis de monitoramento. Ela cita como exemplos a Lei de Proteção de Mamíferos Marinhos dos EUA e a Diretiva-Quadro da Estratégia Marinha Europeia.

Elo vital do ecossistema

Mais do que símbolos de inteligência e sociabilidade animal, os golfinhos são predadores-chave. Ao regular populações de peixes menores, eles mantêm o equilíbrio ecológico que sustenta todo o ecossistema marinho.

“Sem esses predadores, as populações de peixes poderiam crescer descontroladamente, consumindo plâncton e vegetação até causar o colapso do sistema”, alerta Rouby. Dessa forma, os cientistas reforçam que proteger os golfinhos é também proteger o oceano e, por extensão, o futuro da própria pesca e das comunidades costeiras que dela dependem.

“Como humanos, devemos tomar decisões conscientes para proteger os seres vivos e não vivos ao nosso redor”, conclui Rouby. “Diante de evidências de perda de viabilidade, precisamos agir antes que seja tarde demais.”

Fonte: Um só Planeta

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