Por Fátima ChuEcco (da Redação)
Gatos são animais domésticos, mesmo assim, algumas empresas de controle de pragas estão oferecendo o serviço de captura desses animais em estabelecimentos privados. Em locais públicos, é o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) e ONGs que lidam com colônias de felinos visando o bem-estar animal, por isso, os gatos são castrados, vacinados, microchipados e devolvidos ao local de origem, salvo quando são filhotes e cuja adoção fica mais fácil. A atividade de CED – Captura, Esterilização e Devolução, comum em vários países como EUA, Espanha e Itália, é uma medida bastante ética que evita a proliferação dos gatos, garante a saúde dos felinos e das pessoas, e evita superlotação de abrigos.
A falta de técnica (o que pode incorrer em crime de maus-tratos se os animais forem feridos na captura) e de transporte adequado (já que seria um grande risco colocar os animais no mesmo veículo que transporta venenos) torna inviável que esse serviço seja praticado por dedetizadoras cujo campo de atuação inclui a captura de insetos, ratos e pombos – lembrando que, com relação aos pombos, a primeira medida é criar barreiras físicas para que os pombos não entrem no local e somente em último caso é autorizada a eutanásia desses animais, seguindo critérios do Ibama.
Mas além da técnica e do transporte, tem o principal: o destino desses animais. Algumas dedetizadoras podem alegar que entregam os bichos a uma ONG, mas será que protetores de animais contratariam uma controladora de pragas para esse delicado tipo de captura?
Eduardo Pedroso, da ONG Bicho Brother, de São Paulo, é protetor de animais desde a adolescência, mas há dois resolveu se dedicar à CED como profissional contratado. Recentemente ele recebeu uma denúncia: “No começo de agosto recebemos a informação de que a Loremí Desentupidora e Dedetizadora capturou cerca de seis gatos em uma grande empresa em São Bernardo do Campo. Ligamos para a Loremí para saber dos gatos, queríamos adotá-los, mas até agora a empresa não nos informou o paradeiro dos animais. Falam em um abrigo e que os gatos estão misturados a outras dezenas de animais. Não nos fornecem o endereço do local. Estamos muito aflitos com essa história e tememos pela integridade física e psicológica dos gatos capturados pela controladora de pragas. Afinal de contas, onde e como estão esses animais?”.
O que dizem Ibama e CCZ
Segundo Eduardo, a Loremí diz que tem autorização do Ibama para esse procedimento mas, no entanto, a resposta oficial do Ibama para a Anda foi que o Orgão não fornece licenças dessa natureza: “Informamos que não cabe ao Ibama a autorização para funcionamento de empresas deste ramo, conforme preconiza a Instrução Normativa 141/06, art.4º, parágrafo 1º. O controle de gatos não é passível de autorização do Ibama”.
O Centro de Controle de Zoonoses (CCZ-SP), por sua vez, informa que: “As dedetizadoras devidamente regulamentadas pela Vigilância Sanitária Estadual (Portaria nº 9 de 16 de novembro de 2000) podem controlar vetores e pragas urbanas. Os gatos não são considerados vetores, tampouco pragas urbanas, portanto não podem ser objeto de controle das empresas deste ramo. As denúncias devem ser encaminhadas para o GVS1 – Capital, Rua Conselheiro Crispiniano, n° 20, 5°andar”. Embora o CCZ tenha que dar prioridade a locais públicos como praças e parques, também pode, eventualmente, efetuar o trabalho de CED em locais privados como escolas e hospitais. Empresas, fábricas, supermercados e outros locais privados podem e devem acionar profissionais e ONGs para o mesmo serviço.
O diretor da Aprag (Associação dos Controladores de Vetores e Pragas Urbanas), o biólogo Sérgio Bocalini, diz que não tem conhecimento de empresas associadas que estejam realizando captura de gatos, mas acredita que o serviço não é proibido: “A captura de gatos não é atividade regulamentada, portanto, não está autorizada e nem proibida sua realização por parte de dedetizadoras em locais privados, desde que todos os critérios técnicos sejam cumpridos. Os animais não podem ser feridos porque isso é crime de maus-tratos e não podem ser levados no mesmo veículo onde estão os venenos. Além disso, precisam ser entregues numa ONG. Quem contrata esse serviço tem que ser informado sobre o local da entidade. Tem que ser tudo feito da forma mais correta possível”.
No site da Aprag constam os animais considerados pragas urbanas: baratas, pulgas, pombas, ratos, formigas, cupins, carrapatos, moscas, mosquitos e escorpiões.
Mexer com gato de rua é para quem tem amor no coração
“Minha linha de raciocínio é pela urgência da regulamentação dessa atividade/serviço. As pessoas que se dispuserem a isso deverão cumprir uma série de normas. Captura segura, transporte adequado, abrigo digno, acompanhamento veterinário, adoções ou devolução ao local de origem seguras, castração etc. Há ainda a questão dos gatos ferais. Retirar gatos extremamente arredios de fábricas, galpões ou outros locais privados é simples, o problema é saber o que fazer com eles, pois, adotados não serão”, argumenta Eduardo mostrando que se trata de um trabalho bastante complexo e que deve ser realizado por pessoas comprometidas com a causa animal.
“Mexer com gatos de rua é para quem tem muito amor no coração. É para os fortes e honestos. Não é para os gananciosos que desprezam a vida. A regulamentação seria um instrumento para impedir que empresas controladoras de pragas encostassem as mãos em gatos. A Loremi, por exemplo, deve mostrar para os ativistas da causa animal e para toda a sociedade que os gatos capturados estão bem. Se não conseguir comprovar isso então pode responder por crime ambiental”, complementa. O Bicho Brother tem um vídeo que explica o trabalho de CED
Conhecido como Tony Resgate de Animais, Antônio Pires, do Rio de Janeiro, além de resgatar animais de tragédias, também se dedica à captura de felinos de rua: “Eu talvez seja um pioneiro nesse tipo de trabalho no Brasil. Eu chamo de CER – Captura, Esterilização e Retorno. É o melhor e mais humano método para o controle da população de animais de rua. A Feral Cat Coalition tem estudos que mostram que, ao se retirar todos os animais de uma colônia cria-se um efeito vácuo. Esse efeito faz com que outros gatos da região venham a dominar o território que ficou desprotegido e em pouco tempo existirão mais gatos no local”, explica.
Ele também acha que esse serviço deva ser feito apenas por profissionais comprometidos com o bem-estar animal: “Não é uma boa ideia que dedetizadoras façam esse trabalho. Gente que tem acesso fácil a veneno poderia colocar a vida dos gatos em perigo. Já teve dedetizadora que me acionou para esse trabalho porque recebeu solicitação de clientes. Mas eu fui por minha conta, com meu equipamento, técnica e total responsabilidade para com o destino dos animais”, conta. Para saber mais do seu trabalho entre no site.
O perigo do preconceito
Vale ressaltar que embora a técnica, transporte e destino dos animais frisem bem o quanto é importante profissionais da causa animal estarem envolvidos na captura/devolução/adoção de gatos de rua, tem mais uma coisa, bem importante, a ser levada em consideração. Seria bastante arriscado permitir que empresas controladoras de praga realizassem o mesmo serviço ainda que sob critérios rígidos de conduta e procedimentos. Os gatos estariam sendo inseridos no contexto de “animais considerados pragas”, ou seja, transmissores de doenças, sujos, indesejáveis e, obviamente sujeitos a “extermínios”. Isso motivaria preconceito e perseguição. Seria um grande baque para a imagem dos gatos que, como bem colocado pelo CCZ acima “não são considerados vetores, tampouco pragas urbanas”. Gatos são animais domésticos muito companheiros e amados por pessoas do mundo inteiro. E que assim seja!