Muitos conservacionistas dedicados a proteger o ameaçado gato-andino nunca viram um na natureza. Até o final dos anos 1990, a ciência conhecia a espécie apenas por algumas fotos. E Juan Reppucci, líder do programa *In the Field 24/7* da Alianza Gato Andino (AGA), levou nove anos para avistar um desses felinos esquivos em seu habitat natural.
O gato-andino (Leopardus jacobita) é uma das espécies de pequenos felinos mais ameaçadas da América do Sul, habitando os altos Andes da Argentina, Bolívia, Chile e Peru. Do tamanho de um gato doméstico, ele se parece com um minúleo leopardo-das-neves. Seu pelo denso e cauda longa o adaptam ao ambiente alpino hostil onde vive e à perseguição de sua presa favorita: a vizcacha, um roedor parecido com um coelho, comum em terrenos rochosos.
Reppucci conta que seu avistamento aconteceu em um dia “muito estranho”. Enquanto procurava por um colar de rádio que havia caído de um gato-palheiro (L. colocolo) na província de Jujuy, Argentina, seu cachorro Monty (companheiro constante em expedições) se assustou com uma manada de lhamas e desapareceu.
Reppucci caminhou por horas à procura do colar e de Monty. Quando chegou à beira de um penhasco e parou para recuperar o fôlego, uma fêmea de gato-andino surgiu aos seus pés. “Foi uma experiência incrível”, lembra. “Eu observei o gato por cerca de 40 minutos, caçando vizcachas e passeando, sem me notar.” Enquanto isso, Monty havia voltado para a cidade. Um dia “estranho”, mas recompensador!
Conhecendo o gato-andino
Seu habitat montanhoso o torna uma espécie extremamente difícil de monitorar. As equipes da AGA (compostas principalmente por voluntários) passam semanas por ano instalando câmeras trap e buscando vestígios do felino em altitudes de até 4.500 metros. Lá, enfrentam ventos fortes, radiação solar intensa, baixo oxigênio e temperaturas extremas que podem inutilizar equipamentos.
O gato-andino tem um dos maiores territórios entre os pequenos felinos, caçando em áreas de até 60 km². Geralmente vive acima de 3.000 m, mas uma população na Estepe Patagônica sobrevive a apenas 650 m.
“A maioria dos locais é remota”, observa Reppucci, com clima imprevisível: “Pode fazer 30°C durante o dia e cair para -20°C à noite.”
Sua densidade populacional é baixa e fragmentada. Estimativas de 2024 sugerem pouco mais de 2.000 indivíduos maduros espalhados por vastas paisagens. Diferente de outros felinos, as fêmeas têm apenas um filhote por vez, reduzindo ainda mais sua taxa de recuperação.
O programa *In the Field 24/7* realiza ao menos uma pesquisa anual em cada país da distribuição da espécie. “Além dos monitoramentos regulares, estamos iniciando um novo programa em locais-chave, alternando as áreas a cada ano”, explica Reppucci.
Ameaças em crescimento
Em 2024, pesquisadores liderados por Reppucci atualizaram a avaliação da Lista Vermelha da IUCN. O status do gato-andino permanece em perigo, e as ameaças se intensificaram.
As mudanças climáticas estão alterando os Andes rapidamente, com temperaturas subindo e geleiras derretendo mais rápido que em outras regiões. Para o gato-andino, isso significa que seu habitat e o de suas presas estão migrando para altitudes maiores, reduzindo ainda mais seu já fragmentado território.
Ironicamente, as soluções para o clima também ameaçam a espécie. A demanda por metais raros (como lítio, cobre e ouro) para a transição energética está levando a mineração para seu habitat.
“Embora os salares onde o lítio é extraído não sejam habitat do gato-andino, o impacto dessas atividades é amplo”, diz Reppucci. “Não é uma área prioritária para os felinos, mas é crucial para suas presas.”
Estradas, cães domésticos (que transmitem doenças) e atropelamentos também são riscos. Mauro Lucherini, pesquisador da AGA, relata que uma mina de cobre no Argentina reduziu drasticamente o número de vicunhas em uma área de estudo.
Problemas genéticos e conservação
As fezes coletadas pelo time da AGA revelaram que o gato-andino tem a menor diversidade genética do gênero Leopardus — 10 vezes menor que a da jaguatirica. Isso confirma que suas populações são pequenas e isoladas.
“Queremos identificar áreas onde os gatos estão desconectados para priorizar ações”, explica Constanza Napolitano, geneticista da AGA.
No Chile, a reserva Puritama abriga apenas 5 a 10 indivíduos, possivelmente devido à endogamia. “Se perdermos um único gato, podemos romper a conexão entre duas populações”, alerta Reppucci.
Trabalhando com comunidades
Com recursos limitados, a AGA adotou estratégias de baixo custo, como o CATCrafts, que capacita artesãos locais (95% mulheres) a produzir peças inspiradas no felino. “Elas se tornam embaixadoras da conservação”, diz Lucherini. Em 2024, o projeto gerou US$ 7,4 mil para famílias no Peru, Argentina e Chile.
Outras iniciativas incluem vacinação e castração de cães para reduzir doenças.
Traduzido de Mongabay.