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Freak fora de foco ou 'Roadkill cuisine'

28 de fevereiro de 2012
2 min. de leitura
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“Nunca conheci quem tivesse levado porrada / Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo / E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil / Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita / Indesculpavelmente sujo” – Fernando Pessoa, em ‘Poema em linha reta’

Então esses dias passou em algum canal de TV a cabo – olha, eu nem tenho televisão em casa, o que recomendo a todos – uma reportagem sobre um ‘freegan’ na Inglaterra. O sujeito, já adentrado nos anos, come os animais atropelados que encontra pelas rodovias de seu país. Texugos já com larvas, carniça de aves e outros acepipes são recolhidos do asfalto, levados para casa e congelados até o preparo. A alegação dele é que ‘blá-blá-blá’.

Dentro de seu potencial deseducador, o programa não explicou nem separou freegan de meagan, e quem nunca tinha ouvido falar em tal termo – estimo que 99% da audiência – já aprendeu errado. Meus cordias cumprimentos à tecnologia.

De outra sorte, a tola idéia de se consumir animais não-humanos morto pelo ‘acaso’ – a chamada roadkill cuisine – vai como um capricho da eterna fixação anal humana de comer carne, comer carne. Sim, para o animal tanto faz – supostamente, já que ninguém aqui, por mais que arrote certezas religiosas, sabe o que está atrás da cortina do capotamento final. Mas até aí ninguém come o cachorro da família, depois que ele parte para o paraíso dos focinhos, postes e rabos-a-serem-cheirados. É mais fácil apenas ir à feira e comprar legumes etc, e cuspir no sistema sem B12 animal na saliva, mas a ordem materna do ‘come tudo, filhinho’ impede que o povo se permita pensar de forma crítica.

Não basta o humano ser carnista como garantia de normalidade, aquela coisa que cumpre o que está escrito no caderninho, sem que ninguém faça piada, e ainda aparecem sub-gênios fazendo uso do corpo morto daquele que cruzou uma rodovia no diabo do instante errado. Haja asfalto, animal silvestre, estômago de ferro e MUITO tempero para matar a fome dessa gente.

Fora que esse tipo de coisa dá idéia para muito freak que, por falta de foco ou por raiva dos vegetarianos-veganos-ou-simpatizantes, se dispõe a dar seu show frente aos amigos incrédulos – obviamente munidos de câmera e contando os minutos para correr ao YouTube.

Ficam os não-humanos nessa condição de alvo, prato principal, figurinha para filatelia, culpado por A ou B, responsável por C ou D, fetiche ambientalista, peça de museu, ralo, argamassa para preenchimento de vazios sentimentais, ‘galinha-dos-ovos-de-ouro’, bibelô, matéria-prima, moeda podre, altar dos desesperados e… fetiche oral.

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