Foto: Marcio de Almeida Bueno
Chega o obrigatório final do ano e todo aquele que contribuiu para este nosso belo quadro social anseia por umas boas férias, uma parada estratégica na locomotiva que se exige para fins de viver. Praia, parentes, os pés para cima, bundar em casa ou similar.
Me preocupa se os também animais, porém não-humanos, entram nesse oásis de férias. Sai o porco do confinamento em meio à merda e pressão, para ver como é a grama lá fora, durante trinta dias? E outros exemplos fantasiosos.
O que quero dizer – antes de uma proposta bem-estarista de defeso para os que estão a engordar, ou a puxar carroça, ou a latir para os eventuais ladrões que possam entrar no pátio – é que naturalmente a grande maioria das pessoas ainda vê os animais como máquinas azeitadas. Basta enfiar combustível correto pelo orifício apropriado, e a coisa anda. Simples assim. Sem cansaço, stress, medo, dor, opressão, saudade, pânico, exaustão, LER/DORT, angústia, raiva, desespero, sensação de impotência, falta de vontade de continuar vivendo ou qualquer coisa aí que você possa mentalmente acrescentar a esta lista.
Sem parar para fumar um cigarrinho, o cavalo de carroça pode trabalhar os quatro turnos – manhã, tarde, noite, madrugada – sob rédeas de até quatro condutores diferentes, enquanto as pessoas dão palpite sobre o assunto, sem saber que o kit equino-carroça-chicote é alugado e sublocado. Coisas do capitalismo selvagem, aquilo que todos os homens de terno defendem, até o momento que vão mal das pernas e aí pedem ajuda ao Estado. Mas este é outro assunto, apesar de pegar os animais pelo cangote e só soltar, mortos e empacotados, depois que o cliente digitar a senha do cartão de débito.
Ou a cobaia de laboratório, esse animal que se diz salvar a vida de milhões de criancinhas doentes, embora isso só seja dito por quem – justamente, vejam só! – está encastelado nas cúspides dos institutos de pesquisa. A ética do Lattes. E, claro, por alguns marionetes da TV que deitam-rolam-e-se-fingem-de-mortos na esperança de ganhar um petisco ou um cafuné na cabeça.
O fato é que uma corrente bem presa, um pote d’água e uma telha velha são o ponto máximo de ‘direitos animais’ que muitos se permitem cogitar dar para seus cachorros – porque para si mesmo, a subserviência frente a um patrão faz parte da liturgia do trabalho. Não será o cão ‘que serve para cuidar do terreno’ que irá experimentar a liberdade – e lamber os beiços – que o humano-médio pensa ser apenas dos passarinhos.
E, para isso, comprou uma gaiola.