Por Patricia Tai (da Redação)

Às vezes acontecem histórias especiais entre animais selvagens e humanos. Um cervo fêmea nasceu em um cemitério de Kansas City (Missouri, EUA), e então perdeu a sua mãe. Ela cresceu no ambiente de um cemitério, em meio a pessoas que iam até o local enterrar seus entes queridos e velar por eles. Ela se chamava Ella e esta é sua história. As informações são da Care2.

No feriado do Memorial Day de 2011, a bebê de cervo foi descoberta no Cemitério Elmwood. Ela estava encolhida no pátio de uma sepultura esperando o retorno de sua mãe que havia saído em busca de alimento. Ella teve pouco tempo de convivência com sua mãe até o dia em que esta saiu da propriedade do cemitério e foi atropelada por um carro na avenida, deixando-a órfã.

Os gerentes do cemitério consultaram especialistas em vida selvagem sobre o que poderia ser feito com o filhote. Eles tinham duas escolhas: soltá-la na natureza ou mantê-la no cemitério Elmwood. A primeira alternativa foi descartada, pois transportá-la traria o risco dela morrer de susto ou de stress – isso é comum acontecer a cervos.

Então, Ella tornou-se uma residente do cemitério. Esta opção também envolvia riscos e incluía os transtornos do trânsito da região, perigo da invasão de animais selvagens e a interferência de humanos. O cemitério é localizado em uma cidade populosa. Mas logo o instinto e o desejo de Ella pela vida falaram mais alto e ela sobreviveu.

Conforme o tempo passava, Ella ficava mais curiosa a respeito dos humanos que visitavam o cemitério. Ela andava perto deles por um tempo e depois ficava olhando-os a uma certa distância. Aos poucos, essa distância foi se tornando menor. Funcionários do cemitério contam que Ella mantinha vigília durante os sepultamentos, como se compartilhasse o sentimento de luto das famílias. Também ia aos casamentos que ocorriam na capela, e dava as boas-vindas a muitas pessoas que iam ao Cemitério Elmwood apenas para ver o cervo que lá morava. Alguns tiravam fotos dela, e aspirantes a artistas chegaram a retratá-la em pinturas.

Não somente pessoas se encantaram com Ella. No ano passado, o cervo fez amizade com um cão que apareceu no cemitério. Comportavam-se como grandes e inseparáveis amigos. Mas foi um curto período de amizade; na história publicada na ANDA no final do ano passado, contou-se que os dois foram separados mediante a alegação de que o cão não seria capaz de sobreviver ao inverno no cemitério, e o grupo de resgate chamado Wayward Waifs o levou para colocá-lo para adoção. Ele fora adotado por uma família, e a promessa era de que os tutores levariam-no para visitar Ella de tempos em tempos. Mas, tristemente, isso não chegou a acontecer. Ella foi morta no dia 04 de Agosto deste ano.

A tragédia despertou a ira dos moradores locais. Eles dizem não entender como alguém poderia fazer isso a um animal tão dócil. Ella foi morta a tiros e seu corpo foi deixado no local.

Segundo a reportagem, a Polícia de Kansas City informa que não tem pistas de quem matou o animal. Joe DeBold, do Departamento de Preservação do Missouri, disse que não restou nenhuma evidência judicial porque o corpo de Ella foi rapidamente cremado. Portanto, não se realizou a necrópsia e nenhum projétil foi recuperado.

“Se nós tivéssemos a bala, nós poderíamos procurar pela arma que a matou”, afirmou DeBold. “Agora, a única coisa que podemos esperar é que alguém apareça com informações da identidade do atirador”, complementou. Sem nenhuma evidência, o único caminho para capturar quem matou Ella é através de denúncias de cidadãos. DeBold acredita que a pessoa que fez isso provavelmente irá “se gabar de seu feito”.

A Wayward Waifs pagou pela cremação de Ella e por sua urna. Seu corpo deverá ficar no Cemitério Elmwood com uma placa memorial. De acordo com a reportagem, “sua capacidade para acalmar o sofrimento dos visitantes humanos ao cemitério será sempre lembrada”.

Foi criada uma página no Facebook chamada “Remembering Ella” (“Lembrando de Ella”), onde há diversas fotos desse doce ser. O Presidente do cemitério, John Weilert, escreveu uma mensagem em memória de Ella em um jornal do cemitério.

Todos são unânimes em afirmar que Ella tocou muitas vidas com sua gentileza e seu espírito generoso.

A Care2 pede que, se alguém tiver qualquer informação sobre o assassino de Ella, por favor entre em contato com a Polícia local no telefone 816-474-TIPS (8477). Eles pedem que se espalhe essa notícia pelo mundo e a todos os que moram ou conhecem alguém que more em Kansas City, que façam saber que o responsável está sendo procurado, e que as pistas sejam informadas à polícia local. As pessoas que cuidavam dela em Elmwood – e muitas outras pessoas que lhe tinham apreço – dizem considerar que será devastador não descobrir quem praticou o crime.

A ONG In Defense of Animals está oferecendo uma recompensa de 1500 dólares por informações que levem à prisão e condenação de quem atirou em Ella.

Mensagens da carta escrita pelo Presidente de Elmwood

A carta escrita por John Weilert, Presidente do cemitério, que foi publicada no periódico, constitui uma homenagem a Ella. Conta a história de sua vida desde quando foi descoberta no cemitério, até ter ficado órfã e ter vivido ali, em meio às cerimônias de sepultamento, demonstrando sua empatia para com a tristeza dos humanos – ela, que também conheceu a tristeza tão cedo, e cuja vida duraria tão pouco.

Mas há dois pontos interessantes na carta. Ela começa dizendo que no cemitério Elmwood ocorrem alguns projetos educacionais para jovens, e que um dos mais interessantes consiste em uma visita na qual crianças fazem um tour pelas sepulturas com o propósito de lerem epitáfios nos túmulos. “Esses tributos escritos para os mortos podem revelar muito”, diz o Presidente. Após o tour, os estudantes reúnem-se na capela, e o moderador conduz uma discussão sobre o que os epitáfios diziam. O exercício eventualmente leva cada aluno a considerar: “O que eu gostaria de ler em meu epitáfio?”.

Após contar toda a história sobre Ella, a carta segue com um agradecimento ao animal que, nas palavras do autor, foi um “presente inesperado”:

“E agora nós devemos escrever o seu epitáfio. Ella ganhou o seu lugar de descanso em Elmwood, que foi o único mundo que ela conheceu. Sua vida maravilhosamente improvável tornou-se um capítulo digno na história de nosso cemitério”.

Então, o Presidente termina a carta com palavras de reconhecimento à generosidade de Ella para com as pessoas durante a sua breve vida e, por último, lança uma pergunta ao atirador: “Como você será lembrado?”.

Essa reflexão, que parece simples, é profunda e cabe não só a quem atirou em Ella como também a cada um de nós.

Vale refletirmos se nós também não matamos animais direta ou indiretamente todos os dias – ou, quantas vezes não erramos por omissão, ao deixar de fazer qualquer coisa para ajudá-los? Quantas vidas poderiam ter sido salvas com a nossa intervenção, se ali tivéssemos parado para oferecer um abrigo, um prato de comida, uma vasilha de água, impedido um atropelamento, ou levado um animal necessitado a um veterinário? Quantas vidas são salvas quando deixamos de ingerir carne e quaisquer produtos que derivem de exploração e crueldade aos animais? A lista é infinita, mas se resume na pergunta: “Estamos usando toda a nossa capacidade para poupar vidas e para proteger aqueles que não podem se defender?”.

As palavras de John Weilert nos fazem lembrar que todos os dias temos oportunidades de escolher pelo bem ou pelo mal, e de determinarmos como seremos lembrados quando partirmos. Como gostaremos de ser lembrados?