A Anvisa determinou que possam ser utilizados na fortificação os seguintes compostos: sulfato ferroso desidratado (seco); fumarato ferroso; ferro reduzido – 325 mesh Tyler; ferro eletrolítico – 325 mesh Tyler; EDTA de ferro e sódio (NaFeEDTA) e ferro bisglicina quelato. Outros compostos podem ser usados desde que atendam, no mínimo, ao mesmo nível de biodisponibilidade dos compostos citados acima.
Todos os compostos utilizados na fortificação são de origem química ou sintética, conforme explica a nutricionista da empresa Albion, Dra. Jussara Guerra Rodrigues: “Dentre as fontes listadas na Portaria da Anvisa e no manual da EMBRAPA, nenhuma é de origem animal. A maioria são subprodutos da indústria química (como o sulfato ferroso e o ferro reduzido), outras são sintetizadas pelos laboratórios, como o ferro EDTA e o ferro aminoácido quelato (Albion). Este último apresenta uma estrutura similar à estrutura da hemoglobina (2 anéis heterocíclicos formados por glicina), porém não é utilizada nenhuma fonte animal, sendo inclusive certificado como Kosher Parve e isento de organismos geneticamente modificados”.
O ferro oriundo da hemoglobina (animal) chegou a ser considerado para a fortificação, mas foi desqualificado devido ao risco da presença de contaminantes. Também o custo do composto de origem mineral é inferior. Para chegar a essa conclusão, basta uma reflexão sobre a logística que seria necessária para colher, transportar, armazenar, processar e controlar o sangue obtido de frigoríficos. Os compostos minerais são mais facilmente controlados e processados e por isso nenhuma indústria optou por insistir em compostos oriundos de produtos animais.
A nutriVeg Consultoria em Nutrição Vegetariana contatou algumas das indústrias químicas que fornecem a matéria-prima às indústrias alimentícias e obteve algumas respostas esclarecedoras. Seguem abaixo alguns trechos dessas respostas.
Mcassab: “Informamos que não são utilizados derivados de hemoglobina animal em fortificação de farinhas. Geralmente se usa ferro reduzido ou sulfato de ferro”.
Roche: “Informamos que os sais de ferro que temos em nossas formulações são minerais inorgânicos”
As exigências da legislação e as respostas das indústrias químicas são bastante claras e objetivas e não deixam dúvida sobre a questão: no Brasil, a fortificação de farinhas com ferro e ácido fólico não envolve a utilização de produtos animais.
Intervenções em saúde pública para vegetarianos e veganos
Enquanto os vegetarianos e especialmente os veganos poderiam beneficiar-se mais da fortificação de alimentos com a vitamina B12 em vez do ácido fólico, há justificativas de saúde pública para a fortificação de farinhas com os compostos previstos nessa legislação, apesar de a prática também ser passível de contestação.
A existência de questões como “todos devem ser submetidos à fortificação com ferro e ácido fólico quando muitos não necessitariam dessas substâncias adicionadas” sempre será um dilema interminável em saúde pública, pois nessa área as intervenções nem sempre (ou raramente) beneficiam a todos. Alguns irão comemorar os benefícios da adição do mineral e da vitamina às farinhas, pois estes são de fato carentes em determinados estratos populacionais, enquanto outros irão argumentar que o consumo excessivo de ferro é nocivo aos que já têm ingestão e níveis normais do mineral e assim por diante.
A intervenção correta seria uma pontuada, que oferecesse o nutriente às populações especificamente carentes dele, e apenas a estas. Mas isso é uma utopia no nosso modelo social atual. Os veganos, que se beneficiariam da fortificação de alimentos com a vitamina B12 poderão um dia comemorar a implementação de uma estratégia ampla nesse sentido, enquanto outros grupos criticarão a iniciativa. Aliás, a deficiência de vitamina B12 também tem uma importante correlação positiva com a incidência de má formação do tubo neural, motivo que justificou a fortificação com o ácido fólico, mas olvidou o papel conjunto da vitamina B12.
Vegetarianos e veganos podem ficar tranquilos com relação ao assunto da fortificação, uma vez que é claro que o processo de fortificação de farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil não envolve o uso de produtos de origem animal.