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Extinção de antas e queixadas pode comprometer diversidade florestal

9 de setembro de 2019
4 min. de leitura
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Esses dois grandes herbívoros costumavam habitar a maior parte das florestas da América do Sul, mas sua sobrevivência está ameaçada em muitos locais em decorrência da caça ilegal e do desmatamento para exploração agrícola


Por David Arioch


“A extinção desses herbívoros das florestas tropicais da América do Sul pode ter efeitos substanciais na dinâmica do ecossistema” (Fotos: Alan Bloom/Creative Commons/Getty)

Uma equipe de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro concluiu que a extinção conjunta dos dois maiores herbívoros sul-americanos – a anta (Tapirus terrestres) e a queixada (Tayassu pecari) – causaria uma importante redução na biodiversidade florestal do continente.

Resultados de um experimento iniciado há 10 anos indicam que as comunidades de plantas são mais diversificadas nas áreas em que as espécies estão simultaneamente presentes. Já nas florestas onde apenas um dos animais ocorre a diversidade é menor.

Segundo a pesquisa, apoiada pela Fapesp e publicada no Journal of Ecology da British Ecological Society, a queixada e a anta teriam funções ecológicas complementares. O trabalho integra o projeto temático “Consequências ecológicas da defaunação na Mata Atlântica”, coordenado pelo professor Mauro Galetti no âmbito do Programa Biota-Fapesp.

Esses dois grandes herbívoros costumavam habitar a maior parte das florestas da América do Sul, mas sua sobrevivência está ameaçada em muitos locais em decorrência da caça ilegal e do desmatamento para exploração agrícola. Segundo os pesquisadores, o papel ecológico das espécies e sua importância para o funcionamento e a manutenção dos serviços ambientais prestados pelas florestas (incluindo biodiversidade, ciclagem de nutrientes, estocagem de carbono, manutenção de nascentes e retenção de água) ainda é desconhecido.

As queixadas são grandes devoradoras de sementes e de plantas jovens. Moram em grandes grupos familiares, que podem ultrapassar uma centena de indivíduos. Por meio do consumo alimentar e do pisoteamento do solo ajudam a reduzir fortemente o número de plantas no sub-bosque das florestas tropicais.

As antas, por outro lado, são solitárias e se alimentam de folhas e frutos de variadas espécies – sem impactar o número de plantas. Depois de consumir frutos, esse animal os defeca em lugares distantes, movimentando sementes de um local a outro da floresta.

“Enquanto as queixadas agem como pequenos ‘tratores’, revirando o solo da floresta, a anta é um gigante gentil que transporta sementes em sua barriga. Elas têm funções ecológicas muito diferentes”, disse Jose Ignacio (Nacho) Villar, primeiro autor do artigo, à Unesp Agência de Notícias.

As duas espécies andam grandes distâncias dentro das florestas, de tal maneira que a perturbação causada pelas queixadas se sobrepõe ao espalhamento de sementes promovido pela anta.

“Nossa hipótese é que a perturbação causada pelas queixadas aumenta as chances de as sementes dispersadas pela anta se tornarem árvores adultas, favorecendo a diversidade da floresta em escalas espaciais grandes”, disse Villar, que atualmente realiza seu pós-doutorado na Unesp com bolsa da Fapesp e supervisão de Galetti.

Estudos anteriores já especularam que tanto a anta como a queixada seriam espécies “engenheiras de ecossistemas”, mas este é o primeiro trabalho com dados de campo a sugerir que só o efeito combinado das duas espécies teria um impacto positivo substancial na diversidade.

“A extinção desses herbívoros das florestas tropicais da América do Sul pode ter efeitos substanciais na dinâmica do ecossistema, talvez equivalente à erradicação dos elefantes nas florestas da África e da Ásia, ou dos gnus nas savanas”, afirmou Villar. Segundo o pesquisador, as queixadas estão entre as presas favoritas da onça-pintada, predador de topo nas florestas sul-americanas, de tal maneira que sua extinção atinge todos os níveis da cadeia trófica.

“Estamos começando a compreender as consequências ecológicas da extinção massiva de populações de grandes herbívoros das florestas tropicais. É a ponta do iceberg. Precisamos gerar esse conhecimento antes que seja tarde demais e experimentos de longa data, como o nosso, são essenciais para atingir esses objetivos”, disse Villar.

O artigo The cryptic regulation of diversity by functionally complementary large tropical forest herbivores, de Nacho Villar, Tadeu Siqueira, Valesca Zipparro, Fabiano Farah, Gabriela Schmaedecke, Luana Hortenci, Carlos Rodrigo Brocardo, Pedro Jordano e Mauro Galetti, pode ser acessado clicando aqui.

* Com informações da Unesp Agência de Notícias


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