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TRAGÉDIA

Exploração de animais coloca vidas em risco: ciclista morre após colisão com charrete em racha no litoral paulista

Testemunha relatou que duas charretes corriam lado a lado na faixa de areia da praia quando uma atingiu a mulher

27 de março de 2025
Júlia Zanluchi
4 min. de leitura
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Foto: Arquivo Pessoal

A ciclista Thalita Danielle Hoshino, de 37 anos, morreu após ser atropelada por uma charrete que participava de um “racha” em Itanhaém, litoral de São Paulo, no último domingo (23/03). O caso expõe os perigos da exploração de animais para tração e entretenimento, que coloca tanto os cavalos e burros quanto as pessoas em risco.

Em entrevista ao UOL, Gabriela Neves de Andrade, amiga da vítima e testemunha, explicou como o acidente aconteceu. “As charretes estavam apostando corrida, um racha de charretes mesmo, lado a lado. Os carros seguiam atrás, também em paralelo. Virei para um lado e a Thalita, para o outro, para desviarmos. Daí ela foi atingida”, contou Gabriela.

A colisão frontal deixou a ciclista com traumatismo cranioencefálico grave, necessitando de entubação orotraqueal. Ela foi transferida para o Hospital Irmã Dulce, em Praia Grande, e, conforme relatos de sua amiga, perdeu o olho direito no acidente. Thalita foi internada na UTI, intubada e ontem (26/03), após dois dias em coma, não resistiu.

Gabriela ainda disse à CNN que tentou alertá-la sobre as charretes em alta velocidade, mas não houve tempo de evitar o atropelamento. “Desviei para o mato, mas Thalita seguiu em direção ao mar e foi atingida”, relatou.

Segundo ela, o veículo que acompanhava as charretes só parou após seus gritos por socorro. “Eles não queriam que eu a tirasse do chão porque iam chamar o Samu. Aí gritei dizendo que era da área da saúde e que ela corria risco de vida. Precisávamos levá-la imediatamente para um hospital”, lembrou a fisioterapeuta.

Após a morte, a Polícia Civil passou a investigar o caso como homicídio, por meio de inquérito policial instaurado pela Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Itanhaém.

Boletim de ocorrência

Horas após o atropelamento, o condutor da charrete compareceu à delegacia de Itanhaém acompanhado de um advogado e registrou um boletim de ocorrência antes mesmo da vítima ou de suas testemunhas. Em sua versão, afirmou que Thalita teria cruzado à frente da charrete, causando a colisão frontal, e que se afastou brevemente para conter o cavalo enquanto sua esposa prestava socorro. Inicialmente, a Polícia Civil classificou o caso como lesão corporal – a reclassificação para homicídio só ocorreu após a morte da ciclista.

Enquanto isso, Gabriela tentou registrar um BO presencialmente, mas foi informada pela polícia que não seria possível, pois o condutor já havia aberto um registro. “Fui à delegacia assim que saí do hospital. O policial disse a mim, à minha sogra, à prima da Thalita e ao marido dela que não daria para registrar porque o infrator já havia feito um como danos corporais”, relatou.

No dia seguinte, Gabriela optou por um registro eletrônico, no qual detalhou a cena do acidente: “Olho para o lado e vejo a Thalita caída com hemorragia no crânio, a bicicleta torta e o pneu estourado. A charrete que a atropelou continuou em alta velocidade.”

A demora e a burocracia no processo investigativo foram criticadas pelo irmão de Thalita, Yuri Souza, que acusou as autoridades de negligência. “Na delegacia de Itanhaém, diziam que o caso tinha que ser registrado em Peruíbe; em Peruíbe, mandavam voltar para Itanhaém. Parecia que queriam proteger alguém”, desabafou.

Ele cobra justiça para que os responsáveis sejam punidos e que os “rachas” de charrete, prática perigosa para animais e pessoas, sejam banidos. “A justiça não vai trazer minha irmã de volta, mas que os responsáveis sejam punidos e que esse tipo de prática acabe antes que outra família passe por isso”, declarou Yuri, emocionado.

Exploração animal e riscos à sociedade

O uso de cavalos em charretes, especialmente em competições de velocidade, submete os animais a condições extremas de estresse, fadiga e maus-tratos. Além da crueldade inerente a essa prática, o caso demonstra como a exploração animal pode gerar consequências graves para a segurança pública.

Cavalos forcados a puxar carroças em ambientes urbanos estão sujeitos a sustos, cansaço excessivo e acidentes, colocando em risco tanto os animais quanto pedestres, ciclistas e motoristas. A falta de fiscalização e a normalização dessas atividades contribuem para tragédias como a de Thalita.

“Espero que a justiça seja feita, e que essa máfia de corrida de cavalos acabe de uma vez por todas. As prefeituras precisam fiscalizar pra que isso não ocorra mais e que outras famílias não percam seus entes queridos”, afirmou Gabriela.

A discussão deve ir além da responsabilidade do condutor. É urgente repensar o uso de animais em atividades que os submetem a sofrimento e ameaçam vidas humanas.

Thalita é mais uma vítima fatal de um sistema que trata animais como ferramentas descartáveis.

Ela foi descrita por seu irmão como uma pessoa radiante, amante de animais e da vida, e deixa um vazio irreparável. “Ela era alto astral, alegrava o ambiente por onde passava. Todo mundo chamava ela de tia Thalita. Adorava o cachorro, Luffy, fazia yoga, academia, e sonhava em conhecer o mundo”, disse.

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