(da Redação)
Embora a carne de cavalo já estivesse sendo consumida em diversos países do mundo há muito tempo, notícias do início desse ano apontando que havia carne de cavalo presente em diversos alimentos industrializados nas prateleiras de supermercados e comercializadas por empresas conhecidas mundialmente chocaram a opinião pública e trouxeram à tona um debate que não para de se desenrolar.
O grande fator a impulsionar essa polêmica foi o fato das pessoas perceberem que estavam comendo carne de cavalo “sem saber”, ou seja, sem isso ser divulgado nos rótulos dos produtos que consumiam tradicionalmente, como lasanhas e hambúrgueres.
Os Estados Unidos são uma nação de pessoas apaixonadas por cavalos, e pesquisas já deram conta de que a maioria da população afirma nem sequer sonhar em comer a carne desses animais. Apesar disso, a cada ano, estima-se que 130 mil cavalos sejam enviados a matadouros no Canadá e no México, onde são mortos exatamente pela sua carne, que então é enviada para os mercados europeus e asiáticos e, agora pouco a pouco se faz revelar, para consumo também na própria nação americana.
A Care2 publicou uma matéria recentemente trazendo novamente essa discussão a partir da análise dos interesses econômicos ocultos – ou nem tanto – na propagação de ideias favoráveis ao estabelecimento de um novo status, no qual a matança e o consumo de carne de cavalo nos Estados Unidos passariam a ser algo oficial e regular.
A reportagem também faz uma inevitável menção à divisão clara que se formou a partir desta questão, entre aqueles que vêem cavalos como animais de valor moral, e aqueles que os vêem como produtos. Em suma, o especismo, visto sob mais um de seus inúmeros ângulos.
Sue Wallis, uma deputada de Wyoming, está liderando a reativação de matadouros de cavalos nos EUA com o argumento de que não só seria melhor para os negócios como também é mais “humano” para os animais do que longas e duras viagens através das fronteiras.
Outras justificativas citadas pela mesma para apoiar a sua posição incluem a alegação de que matadouros domésticos oferecem um “mercado” para cavalos idosos, mancos e indisciplinados, o que torna-os mais valiosos e evita que haja um excesso de cavalos negligenciados e indesejados que acabam morrendo uma morte lenta e dolorosa.
Os defensores da morte desses cavalos para alimentação humana tentam mostrar que, com a reabertura dos matadouros americanos, eles estarão fazendo um favor aos cavalos. De acordo com a Care2, é óbvio que abaixo das alegações superficiais de “bem-estar” reside o único interesse que é o de alinhar os bolsos dos envolvidos e aumentar os lucros: essas longas viagens para matadouros canadenses e mexicanos “queimam” o lucro dos vendedores, tornando o negócio muito menos atraente.
A verdade por trás do consumo
Segundo a Care2, a matança de cavalos para alimentação humana pode ser considerada “desnecessária, desumana e perigosa” em muitos sentidos.
Independente do fato dos animais serem transportados para matadouros estrangeiros ou mortos nos Estados Unidos, é um fim brutal e terrível, e de forma alguma humano.
A reportagem conta que cavalos são criaturas sensíveis que costumam lutar intensamente pela vida ou imprimir uma reação de fuga. Como resultado desse comportamento, esses animais frequentemente têm de suportar golpes repetidos e alguns até mesmo permanecem conscientes durante o desmembramento, resultando no exato oposto de “uma morte rápida e indolor”.
Conforme segue, no texto também se afirma que não há nenhuma ligação comprovada entre o encerramento dos matadouros de cavalos e um aumento no número de equinos “indesejados” ou abandonados. Há informações de que, quando a matança de cavalos foi proibida na Califórnia em 1998, não houve relato de aumento no número de animais, e quando o único abatedouro de Illinois fechou por dois anos, os casos de abuso de cavalos e de negligência eventualmente até diminuíram.
Em termos de benefícios para a economia local, não haveria realmente nenhum. Esses matadouros representam um pesadelo ambiental e econômico, poluindo a água, infestando o ar com péssimo odor e diminuindo os valores das propriedades. A baixa renda e empregos perigosos oferecidos não fortalecem em nada as comunidades locais, e a contribuição financeira mínima que podem trazer é largamente anulada pelo “imenso fardo de todas as consequências” trazidas com a sua presença.
A próxima questão levantada a respeito é se a carne de cavalo seria segura para consumo humano. Além do fato que está na base de todo conceito a respeito de utilizar animais para alimentação humana, que é o de que realmente o consumo de qualquer animal deve ser combatido pelo simples fato de que eles têm direito à vida, os cavalos não deveriam ser mais uma espécie a entrar para a lista dos animais consumidos, pois são rotineiramente tratados com medicamentos químicos, principalmente a fenilbutazona, conhecida como carcinogênica para os humanos.
Os animais e a “compartimentalização”
Para a maioria das pessoas, a ideia de matar cavalos é semelhante à de matar o próprio cão ou gato, o que nunca será algo largamente aceito. “Como seria a sensação do público se os Estados Unidos começassem a abrir fábricas de filhotes de cães para enviar à China para consumo? Certamente haveria um clamor, então por que deveria ser diferente com os cavalos?”, questiona a reportagem.
Em uma entrevista recente, Sue Wallis disse: “Frangos para ovos, cordeiros para lã, vacas para leite, cavalos para o trabalho, e quando a sua vida útil e produtiva passou, então você pode transformá-los em carne”. Do ponto de vista dela, os cavalos são “gado” em primeiro lugar, e “companheiros” em segundo.
A Care2 aborda o tema da compartimentalização: quando você olha os animais como produtos, onde se desenha a linha que divide os animais que devem ser explorados dos que não devem?”.”Nós compartimentalizamos quando decidimos que animais são aceitáveis para que os matemos para comer, e então criticamos aqueles países estrangeiros que fazem exatamente a mesma coisa com espécies diferentes”.
A reportagem finaliza comentando que é fácil para nós nos sentarmos em nossas “torres de marfim” e julgarmos aqueles que usam e comem os animais que chamamos de amigos, mas quando tudo se resume a isso, existe realmente alguma diferença entre um gato, um cão, um cavalo e uma vaca?