Os Estados Unidos são o maior produtor mundial de perus e também o maior exportador de produtos derivados dessa ave. Os estadunidenses consomem uma quantidade cada vez maior desses animais.
Em 1970, os norte-americanos comiam pouco mais de 3,6 quilos por pessoa anualmente; em 2021, a Federação Nacional do Peru relatou que esse número quase dobrou, ultrapassando 6,8 quilos.
Essa demanda, aliada à criação moderna, transformou os perus. Eles são selecionados geneticamente para ganhar peso rapidamente e, no momento em que são mortos, o peru médio hoje pesa quase o dobro do que pesava em 1960.
A diferença em relação ao crescimento dos perus selvagens é ainda mais acentuada. Aos quatro meses de idade, um macho selvagem pesa, no máximo, 3,6 quilos, enquanto um macho criado para a produção de carne pode chegar a 18,6 quilos no mesmo período.
Esse crescimento rápido exerce enorme pressão nos ossos imaturos de suas pernas. O professor John Webster, veterinário e especialista em bem-estar de animais de criação, estudou um problema semelhante em frangos de rápido crescimento e concluiu que esses animais sofrem dores durante o último terço de suas vidas – uma situação comparada a forçar uma pessoa com artrite nas pernas a ficar em pé o dia todo.
Os perus enfrentam ainda mais problemas nas pernas do que os frangos, porque, além de serem criados para crescer rapidamente, quase todos pertencem à raça Broad-Breasted White (Peito Largo Branco). Essa raça tem sido descrita como “fisiologicamente desequilibrada”. Eles andam ou ficam em pé menos do que as raças mais antigas, presumivelmente porque é doloroso sustentar o peso nas pernas.
Um estudo de 2013 em 13 abatedouros revelou que 60% dos perus apresentavam inchaço nas almofadas dos pés e 25% tinham artrite. Essas aves provavelmente sentiram dor ao andar ou ficar em pé. Esses problemas poderiam ser evitados por meio de seleção genética, optando por perus de crescimento mais lento, permitindo que suas pernas amadurecessem o suficiente para suportar o peso de seus corpos.
Existem perus cuja condição é tão grave que elas morrem antes do momento de serem mortos, aos três ou quatro meses de idade. Essas mortes ocorrem em uma espécie que, quando não criada para maximizar a carne do peito, poderia viver até 10 anos.
Além disso, essas mortes não são tão “poucas” se comparadas ao total de 210 milhões de perus criados e mortos nos Estados Unidos. De acordo com o US Poultry Industry Manual, “as peruas geralmente apresentam uma mortalidade total de 5–6%, enquanto a mortalidade total dos machos é de 10–12%”.
Segundo o Departamento de Agricultura dos EUA, 57% dos perus mortos são machos e 43% são fêmeas. Fazendo os cálculos com os números conservadores da faixa mais baixa de mortalidade, em 2022, os produtores começaram com 133 milhões de machos e enviaram 119,7 milhões para o abate. Para as fêmeas, os números foram 95,1 milhões chocadas e 90,3 milhões enviadas ao abate.
Além dos problemas de pernas e pés enfrentados por muitos perus, o estudo dos 13 abatedouros revelou que 30% das aves tinham bolhas ou outras feridas na pele ao redor do osso do peito. Essas lesões, chamadas de “breast buttons” (botões de peito), ocorrem frequentemente em perus que passam a maior parte do tempo deitados sobre o esterno.
Um dos fatores que causam essas feridas pode ser o acúmulo de fezes nas camas de serragem ou lascas de madeira usadas nos galpões comerciais, onde milhares de aves são confinadas. As fezes são alcalinas e, quando há umidade na cama ou na pele do animal, podem causar queimaduras cáusticas nas partes do corpo que estão em contato com elas.
Para esses perus deliberadamente deformados, não há escapatória da dor. Se se deitam para evitar a dor de carregar seus corpos pesados e desequilibrados sobre pernas artríticas e pés inchados, acabam com feridas dolorosas no esterno.
E isso não é tudo. Um vídeo investigativo da organização Mercy for Animals mostra perus na 15ª semana de confinamento, alguns dos quais foram claramente vítimas de agressão por outros perus. Eles tinham ferimentos extensos e sangrentos no pescoço, escalpos rachados ou sangravam pelos olhos. O investigador relatou alguns desses problemas ao gerente, que não tomou nenhuma providência.
As informações foram retiradas do livro Consider the Turkey, do filósofo Peter Singer.