Segundo a BBC News Brasil, cientistas identificaram quantidades de MDMA e cocaína prejudiciais para o meio ambiente no rio Whitelake, próximo de Glastonbury (Reino Unido), cidade onde ocorre um dos principais festivais de música do mundo.
Os especialistas especulam que os frequentadores do festival, por utilizarem as drogas em banheiros a céu aberto colocam em alto risco a atividade de preservação de enguias europeias raras que vivem no rio próximo.
Os pesquisadores chegaram a essas conclusões a partir de diferentes medições, uma durante e outra depois do festival em 2019, identificando a jusante e a montante daquela área delimitada. A área abaixo do festival tinha 104 vezes mais de MDMA do que a medida acima.
A concentração de MDMA (princípio ativo do ecstasy, muitas vezes vendida como cristal) era quatro vezes maior após uma semana do festival, o qual teve 200 mil pessoas. Esta verificação possibilitou concluir que a alta concentração da droga perdurou a longo prazo, apesar que a quantidade de cocaína era o triplo da de MDMA, mas não chegou a quantificar a ponto de ser danosa à fauna local, segundo eles.
Procurada pela BBC News, um porta-voz do Festival de Glastonbury afirmou que a Agência Ambiental do Reino Unido não ficou preocupada sobre a questão das drogas após o festival de 2019. “Proteger nossos riachos locais e a vida selvagem é de suma importância para nós no Festival Glastonbury e temos um regime de amostragem de hidrovias completo e bem-sucedido em vigor durante cada festival, conforme acordado com a Agência Ambiental.”
Ele disse, no entanto, que os organizadores estão “cientes de que a maior ameaça aos nossos cursos de água — e à vida selvagem para a qual eles fornecem um habitat — vem dos frequentadores do festival urinando no solo”. De acordo com o porta-voz, o festival não permite o uso de drogas ilegais e desencoraja a micção pública (urinar).
Urinar no solo: comum mas danoso
Um dos cinco autores do estudo publicado na revista científica Environmental Research, o pesquisador Christian Dunn, da Bangor University (País de Gales), falou que a pesquisa “aponta que as drogas estão sendo liberadas em níveis altos o suficiente para interromper o ciclo de vida da enguia europeia”.
Segundo ele, é necessário ampliar o conhecimento da população sobre as consequências para o ambiente do uso das drogas e remédios “Eles são um poluente oculto, preocupantemente pouco estudado, mas potencialmente devastador.”
Dan Aberg, mestrando da Bangor University e coautor do estudo, destaca que a contaminação ambiental por drogas por meio da urina das pessoas acontece em praticamente todos os festivais de música. “Mas, infelizmente, a proximidade do Festival Glastonbury de um rio faz com que qualquer droga liberada pelos participantes do festival tenha pouco tempo para se degradar no solo antes de entrar no frágil ecossistema de água doce.”
Estudos anteriores já mostravam os efeitos danosos da cocaína às enguias, como a hiperatividade, problemas musculares e respiratórios, além de alterações hormonais.
Hoje existem estudos preliminares que buscam o tratamento da água a partir de métodos ecologicamente corretos para assim diminuir a liberação e os dados residuais das drogas ilícitas em festivais.
Epidemiologista de águas residuais
Resquícios de remédios, drogas, outras substâncias e até doenças como a Covid-19 se disseminaram nas últimas duas décadas a partir das redes de esgoto, rios ou mares, onde esses resíduos são descartados.
Um “epidemiologista de águas residuais” detecta, por exemplo, o nível do uso de drogas ilegais a partir de questionários e comparação com as evidências mais diretas encontradas nos sistemas de esgoto.
A identificação não mira em indivíduos, mas em dados sobre localidades, para assim estas informações possam ser usadas para alertarem as autoridades sobre a eficiência ou não de campanhas e serviços de saúde pública em uma determinada região.
Além do consumo de drogas, a análise de partículas em esgotos pode servir para identificar os hábitos de alimentação e uso de remédios.
Um laboratório da Universidade de Queensland, na Austrália, por exemplo, realizou coletas em estações de tratamento de esgoto por todo o país para ver os hábitos alimentares e de consumo de medicamentos em diferentes comunidades.
Os pesquisadores viram que quanto mais rica a comunidade, mais saudável é sua dieta. Nas populações economicamente mais abastadas, o consumo de fibras, cítricos e cafeína era maior. Nos mais baixos, medicamentos prescritos apresentaram uso significativo.
Foi visto também que o uso de antibióticos foi equilibrado em diferentes grupos socioeconômicos, indicando que o sistema de saúde subsidiado pelo governo está efetivo.