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CLIMA SECO

Estratégias usadas pelos cactos para sobrevier em climas quentes inspiram inovação; entenda

Inovações poderão, no futuro, transformar desde a agricultura até a captação de água em regiões áridas

26 de outubro de 2024
Renata Turbiani
5 min. de leitura
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Foto: Krzysztof Ziarnek | Wikimedia Commons

O cacto saguaro (Carnegiea gigantea), nativo do deserto de Sonora, nos Estados Unidos e no México, chama a atenção por contar com reservatórios internos de água que o ajudam a sobreviver em ambientes quentes e secos. Mas essa espécie tem ainda mais um recurso evolutivo curioso, descoberto recentemente pelo biólogo Don Swann, do Parque Nacional Saguaro, no Arizona. Através de imagens capturadas com uma câmera montada em um mastro telescópico, ele constatou que, entre abril e junho, as flores do cacto se movem lentamente no sentido anti-horário, saindo da face leste para a norte, que oferece mais sombra.

“Isso pode permitir que os saguaros aproveitem temperaturas mais quentes e luz solar no início da primavera, enquanto evitam os efeitos prejudiciais do calor no final da estação”, disse Swann à National Geographic.

Esse comportamento é apenas um dos exemplos de como os cactos desenvolveram estratégias extraordinárias de adaptação. As cerca de 1.500 espécies conhecidas, apesar das ameaças das mudanças climáticas e da atividade humana, continuam a sobreviver em alguns dos climas mais extremos da Terra.

Um ponto de destaque é que essas plantas do deserto desenvolveram uma abordagem única para a fotossíntese. Diferentemente das demais espécies, que perdem água ao abrir seus poros durante o dia para absorver dióxido de carbono – necessário para a conversão de energia –, elas só fazem este processo depois do sol se pôr.

O gás absorvido, então, é convertido em ácido málico, que é armazenado em grandes sacos dentro de suas células para uso no dia seguinte. É um processo chamado metabolismo ácido crassuláceo (ou CAM).

John Cushman, professor de Bioquímica e Biologia Molecular na Universidade de Nevada, em Reno, pretende cultivar essa característica genética em mais plantas, com o objetivo de tornar as plantações mais eficientes, já que perderão menos água em condições de seca.

A reportagem destaca que, antes de cultivar CAM em outras espécies, os cientistas precisam alterar a anatomia de suas folhas para armazenar ácido málico e acomodar células maiores. Um subproduto disso é que plantas com células maiores também podem reter mais água, estimulando a suculência, ou a capacidade de seus tecidos crescerem mais e reterem mais umidade disponível.

Embora essa engenharia genética ainda esteja em fase inicial, os resultados são promissores. Em um estudo anterior, Cushman conseguiu aumentar a suculência dos tecidos de uma pequena erva daninha de flores brancas chamada agrião-orelha-de-rato (Arabidopsis thaliana) – suas folhas cresceram 40% mais grossas.

As características dos cactos também estão sendo empregadas em outros campos além do botânico. Um exemplo vem da Copiapoa, um gênero de cactos que compreende pelo menos 32 espécies, a maioria exclusiva da região costeira do deserto do Atacama, no norte do Chile.

Essas plantas desenvolveram mecanismos únicos para capturar a umidade da névoa do oceano e o orvalho que se condensa em suas espinhas e pele, o que lhes permite sobreviver em condições extremas.

E, inspirada nisso, Tegwen Malik, pesquisadora de biomimética da Universidade de Swansea, do Reino Unido, desenvolveu uma superfície metálica capaz de coletar orvalho com eficiência aumentada. Em 2023, ela publicou um estudo mostrando que sua inovação era 8% mais eficiente na coleta de água do que uma folha plana usada como linha de base.

Para otimizar seu design, ela imagina casas no deserto com esses recursos de coleta de água. Em um mundo cada vez mais impactado pela escassez hídrica, esse tipo de solução pode fazer a diferença.

O futuro dos cactos e o impacto das mudanças climáticas

Apesar de suas incríveis adaptações, os cactos enfrentam um futuro incerto. Um estudo de coautoria de Bárbara Goettsch, copresidente do Grupo de Especialistas em Cactos e Plantas Suculentas da União Internacional para a Conservação da Natureza, indica que entre 60% e 90% das espécies serão impactadas negativamente pelas mudanças climáticas e pela atividade humana. “Os cactos estão entre os grupos taxonômicos mais ameaçados avaliados até o momento”, ela afirmou.

Um caso recente foi registrado na península sul da Baixa Califórnia, no México. Diante do aumento das temperaturas, grandes extensões do famoso cacto “órgão de tubos colunares” (Stenocereus thurberi) estão mostrando um amarelecimento de seus caules – e os efeitos disso a longo prazo ainda são amplamente desconhecidos.

No Arizona, Don Swann continua sua pesquisa sobre o saguaro, colaborando em projetos como o Future of the Saguaro, que visa entender melhor como essas plantas emblemáticas responderão à crise do clima. “A oportunidade de descoberta está apenas esquentando”, ele completou.

Fonte: Um Só Planeta

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